As Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino
O livro é um exercício de imaginação sobre os diversos elementos que compõem as cidades, mas vai além disto. É uma reflexão sobre as relações que estabelecemos com este espaço complexo e diversificado chamado cidade, a qual confundimos as relações que com ela estabelecemos com as impressões que derivam disto e a própria cidade concreta inacessível por outro meio que não seja simbólico.
Evidentemente a obra de Ítalo Calvino vai além desta abordagem, pois explora a relação entre a linguagem e os objetos. As coisas não são puramente linguagem e nem puramente objeto. Isto acontece por que o que sabemos existir vem pela palavra, que já é uma relação que estabelecemos com o mundo. Não sabemos algo sem dizê-lo, porém, não basta dize-lo para que exista, a ideia de relação se constitui desta interação entre o simbólico e o mundo.
A cidade não existe conforme o que imaginamos dela, mas sem imaginar suas ruas, perigos e possibilidades seria possível viver em uma cidade? A cidade nos adentra pelo que aprendemos dela e pelo que buscamos dela, algo que nosso e algo que dela.
As diversas cidades descritas pelo viajante e explorador Marco Polo ao Imperador Kublai Khan se assemelham a diversas cidades dentro de uma mesma cidade, conforme as impressões que temos e relações que estabelecemos com elas. Em qualquer cidade do mundo podemos encontrar um pouco destas relatadas pelo viajante ao angustiado imperador.
A angústia do imperador em não conhecer todas as cidades do seu vasto império, não seria menor se ele se debruçasse sobre uma única cidade, que seria quase tão vasta em impressões, relações e ocorridos como um império.
A cidade como um certo inferno em que estamos juntos precisa ser reencontrada ou reconstruída muitas vezes ou nos abandonarmos aos traços determinados, abismais e desconexos de suas estruturas e tempos que atropelam nossa subjetividade (o pertencimento, a identificação, o sentido, a percepção, a estética, a sobrevivência, o convívio, etc.)
A leitura de Cidades Invisíveis é um bom desafio para aqueles que teimam em desconsiderar o componente significativo e simbólico nas relações que estabelecemos com as cidades. E mesmo de tentar conceber nossas cidades sem estes componentes sem desumanizá-la - transformando-a em um inferno onde pagamos um preço alto por ter nascido.