CAMINHOS E PRAZERES

Enquanto proposta, a Arte é terminativa por destinação? Basta-se por concepção? Ou seria, em si e por si, uma mera proposta aberta e sem destinatário definido? Para o personagem autoral, assiste razão quanto à possível terminalidade do discurso, porém somente para este o texto se exaure quando da lavratura. Para o outro polo, o do leitor, a vivificação de sua textualidade ocorre à revelia do tutor original. No tocante aos dois polos da relação literária parece-me que o poema é um convite sobre a matéria da vida – uma singela reflexão sobre o itinerário percorrido, relato experimental, portanto, no qual se fazem presentes a inventiva e suas parcelas: a dissimulada farsa com as fantasias consequentes. Em tudo e por tudo coroadas de sonhos e vontades de que (por efeitos psíquicos pouco perceptíveis) a tal felicidade seja verdade plena. É sempre um discurso por natureza codificado e que somente obterá existência quando chegar aos olhos do receptor para ser consumido e avaliado esteticamente. Enfim, não interessa tanto o discurso genuíno ou autêntico, e sim como ele é recebido nos domínios do Outro. Por esta razão, intuo e afirmo que a arte poética é uma fala, uma verbalização especialíssima – aquela que se assenta na confraternidade entre os seres humanos. Restam redivivos os questionamentos: estaria o homem atual (e a humanidade contemporânea) na contramão do que o poeta pretende com o teor de fraternidade que poema deve conter e dignificar-se? Ou a Poesia é o reino da farsa e a materialização dos desejos de ser enquanto criatura que necessita de atenção e gozo?

– Do livro A VERTENTE INSENSATA, 2017.

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