PEDRAS DO DIA

“No meio do caminho tinha uma pedra/

tinha uma pedra no meio do caminho”.

(Carlos Drummond de Andrade)

Pedras do dia são as que procuro para viver; como razão vivencial em que o jogo silencioso do pensamento, a poesia do tempo e a voz da música dão sentido e deflagram diferenças entre o brilho e a aspereza das pedras do caminho. Para Márcio Almeida, “A gente tem que se amar/ duas vezes mais:/ porque somos diferentes / e porque somos iguais”.

Ao procurar as pedras no caminho exercito a liberdade que aflora na sensibilidade para ver o outro lado da história; o voo do pássaro sem repetições e os caminhos de pedregulhos. Pedro Du Bois retrata, “Tantas vezes chutei meu destino/ como são chutadas as pequenas pedras/que encontramos no passeio... // Só fui o que tive por companhia. As outras vidas foram apenas/ as pedras que chutei”.

Pedras do dia se instauram na manhã que enfeita a paisagem deslocada pelo viver, ao perceber os momentos como feridas abertas, onde não há luz e sigo o caminho para senti-las. Então, a dor me invade fundindo o tempo, cerrando a janela e se alojando em mim. Nas palavras de Walmyr Ayala, “Nunca a mesma ilha. / A volta, sim, / mas não a mesma pedra, / nem o mesmo passeio ...”

No caminho das pedras há a marca dos dias em que conceitos se fundem em palavras e gestos; por vezes, estou fechada em mim e, nestes momentos, penso nas pedras apenas como adorno; noutros, percebo o brilho do coração para vencer o silêncio.

Encontro pedras com luz própria, que traçam meu espaço quando tudo parece vida sem valor, o que me mantém na caminhada a passos largos no mundo onde as pedras estão no lugar certo, alastrando a paisagem diária e jogando palavras ao vento, como em Carmen Presotto, “Mesmo que haja pedras em minhas fronteiras / Mesmo que haja humanos soldando meu sangue / Basta... Quero viver! ”.