CONVITE à REFLEXÃO
Gosto de ler poesia e, a de Márcio Almeida, “As Presenças Impuras”, é convite à reflexão. O poeta pergunta no poema, “Por que fica uma palavra / perdida, sem função, a mais, / a apodrecer a lavra / do poema com um mas?...” Ele escreve sobre os “excessos” de palavras nos poemas; com sabedoria, poetiza um assunto difícil e complicado: a representação da arte através da palavra. O argumento de Márcio, ao ser exposto através da poesia, facilita a compreensão do leitor. Também, Jorge Tufic disse que “quanto menos adorno, mais poesia”.
Observo que sua escrita reflete a preocupação em relação aos “enfeites” nos poemas. É como se, ao me olhar no espelho, não me visse como sou; face a face com o espelho, a imagem pode ficar aumentada e deformada. Tal como no engano ótico, acontece na construção da poesia, na expressão de apenas a visão pessoal, que não faz arte e, ao contrário, salienta os “enfeites” como excessos; velhos hábitos de escrita desmerecer a poesia. A criatividade do escritor, muitas vezes, esbarra nas convenções da escrita ou de meios não utilizados para fazer literatura. Márcio Almeida convida à reflexão quando expressa, “... Que pensar permite o ruim / na surpresa da emoção? / Por que, se rígido, o sim / condena à exceção? // É desse consentir o erro / que a poesia faz sua função: / ser o sujeito da falta, / semente do nada, paixão?...”
A poesia bem escrita se torna bem-sucedida obra de arte, porque gerada a partir dos ideais do autor. O poeta não só escreve o que vê, mas o que lhe é permitido ver. O poder estrutural possibilita a percepção, que o leva às inovações. Palavras se tornam modelos de renovação, como em Márcio Almeida, “... Mas o que fundar num tempo / alvo de pleno desígnio, / o universo a vão do vento, / a filosofia do signo?...” Contudo, a motivação provém do tema que se apresenta na realidade literária e cultural do autor. A diferença está nas transformações que a palavra sofre, quando mudanças são provocadas para serem convincentes, do ponto de vista da arte. Como demonstra Almeida, “... A contradição, a profecia / belomaldita da vida, / paródia, secular via / já do que antes era dúvida?...”
Ao desenhar palavras é preciso se conter diante dos “excessos” para que a perspectiva em poetizar com imagens seja a representação da criatividade do autor e demonstração da literatura em relação à visão que ele tem da vida; não como desfile do que é ou quer, mas um convite para que o leitor reflita, como retrata Márcio Almeida, “... Se não existisse, a poesia / faria alguma diferença, / ao fundar signos de pia / com seus ócios e ciência? ... //... A poesia serviu ou servil / à semelhança do criado / serviço de linguagem – fio / fundo a destino do dado?”