GEORGE ORWELL v.s ALDOUS HUXLEY
Quando se fala da ficção cientifica distópica, usamos um tom distante, como se uma distopia, ao contrario das utopias, fosse algo irrealizável. Ao longo da historia humana, pode-se perceber muito mais implementações de distopias que do seu antônimo. Buscando um significado dicionarizado da palavra, em patologia é a situação anômala de um órgão, em geral congênita. Ou seja, um órgão imperfeito que nasce comumente com o individuo.
As distopias usam e abusam desses mesmos conceitos, só que no grau da macroesfera, como diria o filósofo Karl-Otto Apel. A sociedade é como um or-ganismo vivo, os seus cidadãos são as células. Esse órgão se mantém com a perfeita organização e renovação do tecido celular.
Podemos dizer que a distopia trata-se de uma narrativa em que um estado controla a sociedade para garantir a estadia do poder em suas mãos, uma “utopia negativa”. Mais seria uma visão muito singela do que essa narrativa pode proporcionar ao leitor.
O filósofo Georg Wilhelm Friedrich Hegel, a dialética hegeliana afirma que o Estado é a superação de todas as contradições entre os indivíduos e por fim sua realização última. Para entender melhor veja:
• A família é a afirmação do grupo que circunda um indivíduo.
• A sociedade civil é a superação das divergências familiares.
• O estado é a síntese final, onde tanto a família como a sociedade se realizam, pois foram superadas as suas divergências.
Em suma o indivíduo não escolhe o Estado, mas é integrante dele. E mais além Hegel define a verdade como construção continua e dinâmica tendo como combustível a contradição. Como a história não é acumulativa, mas sim resultado da contradição, o Estado pode redefini-lo. Um ponto importante em toda narrativa do gênero é como a verdade e o passado é construído de forma a dar a noção de que o Estado atual é melhor que o status quo e necessário sua manutenção permanente.
Duas das melhores ficções distópicas escritas e que talvez abriu a brecha para o surgimento de várias outras como Fahrenheit 451 de Ray Bradburry, a trilogia Divergente de Veronica Roth. São elas 1984 de George Orwell e Admirável mundo novo de Aldous Huxley.
1984
Winston Smith é o protagonista desse livro extremamente filosófico como só Orwell podia escrever. Vivendo em Londres na Oceania, Winston realiza traba-lhos burocráticos. A efeito de curiosidade, ele não esta muito contente com o partido, embora faça parte da sua estrutura como membro do partido externo. Não demonstrando essa insatisfação crescente, reprimia ferozmente, pois o Estado além de totalitário é extremamente repressor, usando circuitos de vigi-lância e comunicação em todas as residências. Todos os que demonstram al-gum tipo de “subversão dos valores”, são automaticamente eliminados. Como todo governo ditatorial não podia faltar o líder de Estado que reúne todo os va-lores éticos e morais da sociedade. Um verdadeiro culto a imagem, assim como Adolf Hitler na Alemanha nazista, Benito Mussolini na Itália fascista, Stalin na união soviética; O grande Irmão é o senhor de toda a Oceania, controlando com mãos de ferro. Seu cartaz com a frase O GRANDE IRMÃO ZELA POR VOCÊ, está em todos os lugares. A estrutura de toda a sociedade está baseada em três lemas:
GUERRA É PAZ. LIBERDADE É ESCRAVIDÃO. IGNORÂNCIA É FORÇA.
Uma distopia em que o sistema de governo é o socialismo científico Proposto por Karl Marx, totalmente deformado e mostrando em último grau as conse-quências da ditadura do proletariado, essa se fortalece de tal forma no poder, que se torna o próprio poder. Assim como todo governo socialista na história humana se torna uma ditadura, vide os exemplos da U.R.S.S, a China, Cuba e Coréia do Norte. Todos eles fracassaram por manter a ditadura e não passar para o próximo nível que era o comunismo, onde não haveria mais o Estado, as contradições de cidade e campo, bem como trabalho intelectual e braçal.
Admirável mundo novo
Com certeza o livro mais famoso de Huxley. Em contraponto ao socialismo, o sistema de governo aqui é o seu antagonista, o capitalismo. Assim como Je-sus, o Cristo que com seus ideais e conhecimento causou uma revolução na história humana tão grande, inclusive sendo o ponto de separação do passado e futuro, A.C e D.C.
Nessa ficção, outro homem ocupa esse lugar. Nada mais nada menos que Henry Ford, o criador do modelo T. O fordismo nesse caso não foi aplicado apenas aos produtos de consumo em massa, mas ao próprio ser humano. Se-res humanos são “produzidos” e não mais “gerados”. O próprio emblema do Estado mundial anuncia:
COMUNIDADE, IDENTIDADE, ESTABILIDADE.
È necessário por vezes duas leituras na mesma página devido aos vários termos científicos empregados na obra. Além da intersecção dos diálogos, não temos um protagonista fixo no livro, fazendo os fatos terem mais relevância que a personalidade de alguns dos personagens que abrilhantam a obra como Bernard Marx, Lenina Crowne e Jhon “o selvagem”.
O cenário onde se passa a maior parte da história é Londres, no ano de 632 N.F, Ford é considerado um novo Cristo e todos veem nele a superação do passado humano. Coisas normais como a solidão, a velhice, sentimentos negativos são suprimidas ao máximo. Diferente do estado policialesco de 1984, em admirável mundo novo o Estado é mais condicionante, fazendo isso mesmo antes do nascimento.
Conclusões finais
Não veja a ficção cientifica distópica como algo impossível de acontecer, pois mesmo um governo distopico necessita fazer as mudanças devagar. O desejo deles é fazer você entender que o que eles fazem “é para o bem social”.
Vide o exemplo do Big Brother (Grande Irmão) extraído do livro de Orwell, tornou-se um reality show na televisão. Por todo o mundo tem uma versão do programa. Ninguém sabe a origem do programa, que na verdade foi criado pa-ra vigiara as pessoas. A ideia de ser vigiado vinte quatro horas por dia não me é nada agradável, é com surpresa e asco que vejo as pessoas encararem isso com normalidade e até um fundo de adoração.
Já em Admirável mundo novo vemos como o condicionamento assim como a alienação reifica o ser humano destruindo primeiramente as relações familia-res, a noção de individuo único, e por fim o controle químico, tudo em prol do consumo e da produção em massa. Não pense que isso não é perceptível no dia a dia.
Em 1984 o controle é psicossocial (entenda como alienação) enquanto em Admirável mundo novo é biossocial (Condicionamento de castas) impedem de toda forma os indivíduos que constituem a sociedade de transformá-la. Um por não saber como, o outro por não ter a conduta. No fim a sociedade sem mu-danças esta fadada a estagnação e a uma ruptura, nenhum sistema é perfeito a ponto de durar pra sempre.
A sociedade é transformada pelo agir do espírito humano, e o espírito hu-mano só se fortalece com as mudanças provocadas na sociedade. Sem elas o homem enfraquece. È necessário uma mudança continua na sociedade para que os homens possam continuar a existir.