A Realidade Como Vício
“...Sonhos reafirmados no acordar...” (Pedro Du Bois)
Assim, à primeira vista, não há dúvidas: viciada na realidade é a pessoa que fala a verdade, mesmo que em situação delicada, no sentido da expressão, onde poderia dourar a pílula, usa a expressão franca. Fala sem intenção de prejudicar e magoar ainda mais a pessoa. Nas palavras de Machado de Assis, “No fim de uma coisa que acaba, há outra que começa... Ao cabo, só há verdades velhas, caídas de novo.”
Não há dúvida sobre o profissionalismo: viciado na realidade é o poeta que escreve o que sente e vê. Vende a ideia, sem cumprir roteiro pré-determinado, sacudindo a nossa rotina ao apresentar cultura e história aos nossos olhos. Segundo Pedro Du Bois, “Na metamorfose / metafórica realização // transformação / além das palavras / sentidos / além das ideias / vida além da literatura.”
Não há como não sentir atração por tantos livros e autores, viciado na realidade é o leitor que numa viagem não consegue deixar de visitar sebos e livrarias, mesmo que seja para dizer, só estou dando uma olhada. Nem que esteja fora do roteiro é hábito prazeroso. Machado de Assis já dizia que “Ler as obras dos poetas e dos escritores é hoje um dos poucos prazeres que nos restam ao espírito...”
Viciado na realidade é a mãe que ama, protege e orienta seu filho e depois colhe os frutos que plantou. A vida é desse jeito: o sentimento faz acreditar que finais felizes acontecem com quem tem consciência da importância de cuidar do filho; como em João Guimarães Rosa, “...como mãe gosta de um filho: orvalho de resflor, valia que não se mede nem se pede – se recebe.”
De fato, não há dúvida de nada para quem é viciado na realidade, quando vê a claridade no escuro; ao contrário de quem tem medo do escuro estando claro. Podemos fazer cada qual a sua parte, para que a vida se torne menos assustadora. Como mostra IGdeOL, “Enxergo na luz / que agora reluz / A grande verdade / Que ver sempre quis:/ – O mundo feliz, /... O sentido da vida!...”
Tenho orgulho de ser viciada na realidade, porque significa sorrir para a vida, enquanto vivida. Esta é a minha certeza; ser viciada na realidade é ouvir histórias (re)contadas e se dizer participante, quando ocorrem variações no histórico pessoal, associado às ideias. como em Gabriel Garcia Marquez, “A vida não é a que a gente viveu, e sim a que a gente recorda, e como recorda para contá-la.”
Sorte? Penso nessa palavra por que, às vezes, a distância entre a sorte e o azar, a vida e a morte estão na realidade como vício: amar para ser amado, como lembra Norman Doidge, de que “O que uma pessoa imagina se torna um gatilho para as emoções e as ações...”