TRANSGRESSÃO

Na maioria dos dias me pergunto se as palavras são um imperativo, porque a grandeza da obra está na realização literária do livro. Em nome da liberdade, pessoas descrevem de forma precisa as suas intenções, experiências e ideias, preocupando-se com a dimensão sentimental e contestadora.

Apaixonada pela literatura tenho a sensibilidade aguçada, o que pode surpreender meus sentimentos e gerar sofrimento, ao ler uma obra onde os personagens matam por necessidade. Muitas vezes me recuso a participar de tal delírio destrutivo. Emociono-me e tenho o sentimento de transgressão.

Questiono em que sentido o escritor acredita nisso? Será que ele assim escreve apenas para a construção do texto? Então, qual seria o sentido da vida? Fico nervosa e tento entender esse tipo de perfil na literatura. Penso que devo transgredir... Tentar trivializar seu efeito e pensar que o escritor, como significante, tem na liberdade de expressão o direito da escolha. E eu de reconhecer que o elemento diferenciador nesse tipo de obra é efeito para a emoção: algo transgressor. Vera Casa Nova pergunta, “... Qual a transgressão és capaz de cometer hoje / com tua perversão de cada dia?...”

Mesmo transgredida, tenho dúvidas quando me reporto à motivação. Acredito que o escritor modifica o meu exercício de leitura, quando percebo que ele deixa claro que a crueldade é para aqueles que não conseguem controlar a propensão ao ódio. Também acredito que a razão deixa ver criticamente as ações desenvolvidas como arte.

O escritor é o artista que toma a palavra para defender e desenvolver a sua obra. Conta a história de ponto de vista específico: uma ação estratégica, dando ao leitor o direito da transgressão. Encontro nos romances: O Som e a Fúria de William Faulkner (1897-1929), expressas inquietações sobre a condição humana; segundo José G. Couto, o escritor nos fala do “som desesperado e denso de todo o sofrimento mudo que há sob o sol” e mantém a angústia de sentido; Por Quem os Sinos Dobram, obra de Hemingway (1899-1961), “Enquanto existir um de nós, os dois existirão/... Se um estiver os dois estarão/... eu sou tu também, a partir de agora...você sou eu” que, para Miguel Sanches Neto, “trata-se de um romance atualíssimo, por entender que todo assassinato ou qualquer agressão contra o homem, é sempre um ato criminoso, e não há ideologias nem interesses que possam justificá-lo.”; Em A Morte Como Efeito Colateral, Ana Maria Shua (1951) “constrói uma inquietante narrativa sobre a finitude humana.” Vale ressaltar que tais transgressões são pontuais: antes de me deixarem obcecada, trato de abstraí-las dos valores que possam me impregnar e me submeter, como marcas dos autores em seus estilos literários.