O presente artigo tem por objetivo refletir em termos gerais sobre como o poema A rosa do povo poderia ser relacionado às formas teóricas de pensar o sentido da representação e da práxis, além de construir o trabalho a partir das "surpresas" semânticas do poema (melancolias e mercadorias que espreitam; muros surdos etc.) a fim de explicar como estas se apresentam segundo um e outro modo de ver o sentido na linguagem e defini-lo como metáfora ou não e, partindo de um resultado positivo, segundo que perspectiva teórica sobre a metáfora seria mais bem compreendidas e analisar regras do "fazer sentido" nos dois paradigmas teóricos principais. Além disso, pretende-se fazer uma breve análise dos aspectos poéticos a partir das posições relativista e universalista. Em torno dessa análise, pode-se discorrer sobre como as expressões de uma língua alcançam determinado significado e sobre a possibilidade de se pensar sobre a natureza deste significado a fim de tentar explicar qual o alcance dessa denotação. Isso tudo se refere à questão da imanência que assinala sobre a autonomia da língua. Opondo-se a transcendência da palavra como objeto de análise, essa imanência vai avaliar o signo linguístico de um termo, não com o intuito de se descobrir o sentido, no entanto para desvendar o que é o “manifestado da manifestação” que é “analisado em correlação paradigmática, enquanto sistema, excluindo, destarte, [...] toda a sintagmática, enquanto objeto”. Possuindo o mesmo nome, o poema faz parte de um livro escrito entre 1943 e 1945, época em que ocorria a Segunda Guerra Mundial. Por isso, percebe-se uma enorme tensão entre o governo – devido à criação de utopias de esquerda – e a visão amorosa e desencantada do autor o qual estabelece uma metáfora para a palavra rosa a qual se relaciona a um pensamento “do entendimento universal, dos valores da democracia e da liberdade, valores típicos da modernidade no século 20”, ou seja, a palavra rosa representa a expressão do povo daquela época o qual esperava o surgimento de uma realidade melhor – algo tão almejado pelo poeta -; enquanto que o termo do povo poderia estar relacionado a sociedade a qual está vivendo em que se está criando ideias socialistas e esquerdistas e, por isso, há no poema uma preocupação com os problemas vigentes. Exemplo desse assunto está no verso “O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera”, no qual Drummond discute sobre a sua angústia e seu sentimento de desprezo e incômodo ao mundo em que vivia, perpetrando a dicotomia esperança x pessimismo. Durante quase todo o poema, Drummond utiliza metáforas para explicar esse seu sentimento com o mundo por meio de críticas irônicas, transformando o tema da desigualdade social como matéria de sua poesia. Para exemplificar, nos versos “Estão menos livres mas levam jornais/E soletram o mundo, sabendo que o perdem”, o poeta demonstra a preocupação com um homem que não apresente nenhuma perspectiva de vida e não tenta reparar o resultado de um pensamento ligado apenas para o indivíduo em si. Destarte, é perceptível a análise do discurso teórico sobre a metáfora no poema A rosa e o povo, uma vez que se vê um olhar tradicional sobre a linguagem figurada a qual mostra a palavra sob um víeis do desvio linguístico, sendo algo opcional/ornamental e que salta aos olhos da linguagem. A parti daí, discute-se até que ponto a língua é estabelecida pela “natureza humana”, pois o valor linguístico mostra a propriedade representativa de uma ideia que constitui, assim, um elemento de definição de uma palavra o qual passa entre a imagem auditiva e o conceito, pois a linguagem causa certas surpresas, certos impactos. Para isso, utiliza-se da metáfora – linguagem desviante – que causa uma mudança da organização das palavras e dos seus significados. O verso “Em vão me tento explicar, os muros são surdos” exemplifica o caráter dessa “surpresa” linguística o qual mostra o silêncio para a situação sociopolítica, como também há no verso “Sob a pele das palavras há cifras e códigos” que define este novo mundo cheio de aspectos socialistas. Esse assunto está em torno da discussão sobre a universalidade do sentido e que nos permite saber até onde uma palavra alcança determinado significado, pois esta parte, segundo Saussure, do ponto da experiência com a natureza, ou seja, com o meio social e, assim, discute-se sobre a natureza do signo linguístico a partir da qual se “supõe ideias completamente feitas, preexistentes às palavras [...]; ela não nos diz se a palavra é de natureza vocal ou psíquica”. Além disso, a posição relativista incide na implicatura de um imobilismo a qual constrói a posição de condicionamento pela língua – em um feitio simplista -, pois esta possui uma essência por não adquiri, de acordo com o pensamento relativista, um conjunto de conceitos os quais, segundo G. Deleuze, “impedem que o pensamento seja confundido com ‘uma simples opinião’”. Fala-se sobre como os gestos extralinguísticos interagem durante o processo comunicativo entras as pessoas ou na forma escrita. Neste caso, Drummond utiliza as palavras de acordo com a natureza psíquica e social e, por meio dela, vai constituindo um grande arcabouço metafórico. No terceiro verso, ele fala: “Melancolias, mercadorias espreitam-me”. Através de uma crítica a tendência capitalista, pôs-se a dizer que o mundo se encontrava de um modo sufocante em que todos e tudo eram tratados como se fossem mercadorias ou qualquer coisa relativa ao consumo. Logo, Drummond utiliza uma linguagem alinhada ao paradigma da práxis e este funda uma linguagem como berço da diferença entre o literal e o figurativo, através do qual não há um sistema objetivo de representação, ou seja, não existe uma expressão de conhecimento verdadeiro, pois não ocorre uma uniformidade entre o sentido das palavras. Nas relações de sentido entre as palavras, a tradição da linguagem debate sobre a consistência da imanência para se saber até que ponto o significado de uma expressão pertenceria a ela, já que, a partir de uma informação contextual, estabelece-se o que pertence a uma palavra e o que está no seu mundo externo, características das dimensões dos significados das expressões contidas nos conhecimentos linguístico – o qual é imanente aos fatos da língua, é compartilhado por todos dentro de uma homogeneidade e hierarquia sintática e lexical, tornando-se sucinto, manipulável e compulsório – e enciclopédico – que é extralinguístico (ligado aos fatos do mundo), sendo distribuído de forma desigual, heterogênea e desordenada, e, por isso, torna-se vasto, de difícil manipulação e opcional pelos usuários da língua. E, no mundo da figuratividade, a metáfora seria um recurso de estilo livre e decodificado que incide sob uma linguagem por existir uma contraparte sobre tudo o que quer dizer, ou seja, é algo extralinguístico cuja interpretação se torna periférica por depender da cultura sob a qual se define o significado de determinada expressão, visto que em uma frase pode haver palavras cujos significados sejam conhecidos, mas a frase pode significar algo diferente. Logo, o sentido de uma frase é a combinação de suas palavras ou partes e, por isso, encontram-se dificuldades para separar o centro da margem. Em A rosa e o povo, há duas noções sobre a feitura da expressão que é ligada às tradições do paradigma da representação: uma que diz respeito ao que é físico-científico – frases declarativas e literais, dando conta das palavras e do seu uso central -, e outra que fala sobre o que é retórico-poético, ou seja, o “resto” – as frases não-declarativas, não-literais, que são a margem da linguagem, dos significados não-literais da palavra, e, neste caso, a metáfora seria o desvio de determinada ordem. O poeta consegue fazer uma analogia entre essas duas definições para articular sobre todo o contexto histórico e político durante a década de 40, no entanto relaciona-o com o seu sentimento frustrante e de angústia, como em “O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera”. Nessa passagem, Drummond almeja a construção de uma sociedade mais justa e que não seja ligada às coisas mesquinhas resultantes de um mundo capitalista. Ao final do poema, Drummond afirma: “É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio”. Nesse trecho, o poeta faz uma metáfora falando que o próprio povo passou dos limites da desigualdade, aumentado a distância entre os ricos e os pobres. Assim, realiza-se um abismo entre o nome “rosa” e a coisa “povo” e, devido à informação contextual do poema, uma crítica à distinção de um tempo coletivo que se extinguira por causa da falta de responsabilidade moral resultante de um pensamento político e, por meio deste, somente poucos conseguiam benefícios econômicos.