Conceito racial na literatura
Os textos A América Latina: males de origem, de Manoel Bonfim, e Os Sertões, de Euclides da Cunha discorrem sobre os mesmo males que atingem diferentes lugares: a ideia de que a mistura de raças era atrasada, a cujo conceito os dois se opunham.
Manoel Bonfim, cujas ideias não se limitavam apenas ao Brasil, tentava analisar a influência das raças em cada sociedade e saber o valor real e excêntrico de cada uma delas. Indo de encontro à ideia da teoria de raças inferiores, Bonfim analisava a teoria científica a qual afirmava que os mais fracos, pertencentes a essas raças inferiores, teriam de ser explorados pelos mais fortes. Entretanto, afirma que não existe marca social que indique quem deva ser explorado, ou seja, não existe nenhum elemento que indique marca de raça, pois cada uma evoluiria através de uma capacidade progressista.
Pondera-se sobre um proselitismo atinente a religiosidade a qual perpetra a igualdade a qual os povos, segundo o autor, deveriam perseguir para uma vida futura delineada por uma “moral verdadeiramente humana”, aspecto defendido pelo cristianismo e que garantia o progresso social.
Manoel Bonfim apregoava um fundamento teórico do raciocínio sobre as condições da América Latina a partir de que deveria mudar a visão das ciências biológicas para as ciências sociais. O escritor era contra a utilização da teoria darwinista (o evolucionismo) para explicar a relação entre as raças inferiores e superiores, pois o que ocorria na colonização dos povos latino-americanos era um processo de inoculação (vegetal) no qual o colonizador teria a função de parasita cuja fonte de sobrevivência era a colônia, fato que resultou nos males da América Latina. Bonfim argumenta, primeiramente, a contradição da superioridade afirmando que os mais fracos são sempre inferiores, dando exemplos dos espanhóis e os portugueses que acabaram com os mouros e os árabes, pois aqueles eram superiores; em segundo lugar, afirma que os índios e os africanos não têm a “capacidade” de atingir um nível igual ou superior no que diz respeito à moral e a organização social, pois ainda se apresentam “bárbaros” ou “selvagens”.
Ainda discute sobre uma influência especial de mestiçagem ao tentar distinguir a raça inferior da raça superior. Primeiramente, fala que há um cruzamento entre raças que, em biologia, teriam efeitos regressivos de cruzamento, cuja ação não apresenta qualquer tipo de dano no resulto da mestiçagem. Sobre isso, Bonfim discute sobre a existência de poucos povos que passam pelo processo de mestiçagem e conseguem se civilizar, uma vez que passam por uma instabilidade social cuja causa é de ordem política, conhecida através das condições históricas da colonização. Nesse sentido, Darwin se restringia ao ponto de vista naturalista, mas reconhecia que as causas eram morais-sociais. Com isso, Bonfim lembra as misérias e martírios dos mestiços que, consequentemente, guardavam rancor e ódio contra os maus-tratos.
Em sua obra Os sertões, Euclides da Cunha discorreu sobre o mesmo assunto de Bonfim, entretanto limitou-se apenas ao interior do Brasil, exatamente no interior de Pernambuco onde ocorria a Revolta de Canudos, cujo principal personagem era Antônio Conselheiro. Euclides dividiu a obra em três partes. Na primeira ele delineava como era a terra e se esta tinha, seguindo os aspectos da meteorologia (entender o clima) alguma influência sob a mestiçagem e a civilização dos mais fracos. Na segunda parte da obra, Euclides disserta sobre trechos antológicos que havia no sertão. Os jagunços, que eram os sertanejos pobres, ficaram conhecidos através de Antônio Conselheiro que era, de certa forma, contra a atuação da República que não agia de forma para que a comunidade pudesse viver de um modo diferente. Na terceira e última parte, Euclides vai discorrer sobre a luta e como esta ultima passagem sobre Canudos está apoiada nas ciências e nas expedições militares, que foram quatro para conter as forças do Arraial de Canudos. Umberto Peregrino assevera que o conteúdo da História Militar, em Os Sertões, “se projeta muito além, completando-se, como deve ser quando se faz a verdadeira História Militar, no delineamento geográfico, na classificação dos valores humanos que se vão chocar, na fixação dos motivos históricos, econômicos, políticos e das inter-relações psicológicas”.
De acordo com estas palavras, percebe-se que Euclides constrói sua obra por meio das ciências, tentando ampliar o conceito geográfico, político, econômico e social, através de uma linguagem cheia de antíteses, para definir como agia o exército. Sabe-se que os primeiros governos da República eram militares, entretanto “não havia um exército na significação real do termo em que se inclui”, como treinamento, um serviço de fornecimento, serviço de transporte adequado, fato que justifica o exército ter vencido os jagunços apenas na quarta expedição.