JANELA: o instante da escolha

“Porque você há de ter notado que os olhos aprendem imagens,

mas ensinam palavras”. (Paulo Mendes Campos)

A janela é a abertura que conta a nossa história e amplia os prazeres. Nela há a premissa do horizonte, da paisagem que se quer ver e a prender em imagens. Segundo Carlos Pessoa Rosa, “Da janela,... o clarão fatia o assoalho,... A luz corta o céu, repousa na terra e na retina.” Reconhecemo-nos na casa onde cada janela fala do encanto dos momentos da nossa história; a imaginação é alimentada pela inspiração da imagem vivida e a janela mostra o instante da escolha que se confunde com o horizonte, em prenúncio, como em Pedro Du Bois, “O segredo: abrir as janelas...// o segredo: permanecer diante da janela / sem que o gesto se concretize e o dia acabe.”

A janela se mostra forte e delineada ao tão bem retratar o momento de deleite diante do instante da escolha, que a reconhecemos na medida em que percebemos a mágica refletida através dela.

A janela tem domínio sobre a arte de se comunicar com o mundo; observamos e vemos o que acontece lá fora; ouvimos a voz interior dizendo do dom da janela em destrinchar imagens e seus significados, como observou Ernani Rosas, “Da minha janela aberta, / vejo passar muita cousa! / Toda amargura liberta, / para a tristeza da lousa...”

Todos temos uma janela, o que torna o ser humano inspirado e capaz de se realizar na vida. Cada um busca a sua paisagem e descobre a sua vontade, paixão e passa a viver com qualidade e talento. Com a janela aberta, conquistamos o nosso espaço. Por vezes, ela abre apenas uma fresta, então se não prestarmos atenção não conseguiremos ver a paisagem e nem sentir a liberdade a nós destinada. Nesse sentido, quem não sonha, acaba olhando para o lugar comum, como descreve Maria M. L. Althoft, “Tentei olhar da minha janela... / e de nada valeu, cansei. / Sentei, debrucei / Meu corpo cansado / E na soleira da janela, / A chuva esperei...”

Abrir a janela é tentar se sentir livre e consciente no que desejamos ver; ou seja, ir ao encontro da paisagem deslumbrante, que chega até nós, para deixar entrar o vento na renovação das ideias, o que significa que no fundo da alma o sentimento tem o poder de conquistar as pessoas no embate entre a razão e a emoção e, ainda, de compartilhar a nossa visão. Nas palavras de Antônio Olinto, “Eu te via, mãe, / Quando estavas sentada / olhando pela janela / Eu brincava...”. Digo que ao rever a vida pela janela e no redescobrir do gesto reside a lembrança que nos protege.

Janela é o instante da escolha, de ser quem pretendemos ser, de apontar caminhos que gostaríamos de seguir. A partir desse ponto de vista, a paisagem se torna bonita ou feia, conforme a encaramos; onde existe vontade, existe o caminho para o instante de escolha: nos livros, de Pedro Du Bois, A Concretude da Casa: “... A frieza da porta aberta / ao relento. / O relato do corpo que espia pela janela. // Reafirma a casa e seu concreto...” e, em Postigos, de Carmen S. Presotto, temos uma incrível viagem pelo tempo através de janelas que nos permitem espreitar a poesia.