MANOEL DE BARROS: “O grande poeta de pequenas coisas”
Faço desta, uma homenagem, para dizer algumas palavras de encantamento ao poeta Manoel de Barros que aniversaria em dezembro. Peço licença para homenagear o grande mestre. Peço licença, sim, porque sou amante da poesia e, entre os meus escritores, Manoel de Barros é um dos preferidos e, em tudo o que se escrever sobre ele, estaremos nos repetindo, mas a repetição será permitida por sua grandeza pessoal e pela grandiosidade da sua obra. É um prazer poder reler, rever e reviver o poeta dos “desacontecimentos”, o “poeta do pantanal”, o “lírico da ecologia”, o “virtuoso do realismo mágico”, “o grande poeta de pequenas coisas”. O que me permite repassar alguns fatos significativos da sua vida, como diz Pedro Du Bois, “... Escrevo histórias / recontadas em outros dias / de mesmas palavras.” e Orides Fontela, “a luz está em nós: iluminamos.” – podemos dizer que a luz está em Manoel de Barros: iluminando-nos.
A seguir, cito alguns textos sobre o poeta e sua obra.
Fabrício Carpinejar, em “Manoel de Barros: poesia para reciclar”, dezembro de 2006, conta que o poeta está casado há 58 anos com Stella, seu grande amor. Ela é a primeira e única leitora de seus originais. É bem crítica. Se ela não gosta, diz: “Sobe e vai trabalhar mais”. Ele só dá por terminado o trabalho quando ela define que está bom, pois, conhece o seu estilo. Manoel de Barros editava as suas obras em tiragens artesanais e de escassa circulação. Teve o reconhecimento na década de 80, por críticos e personalidades, como o dicionarista Antônio Houaiss, o escritor Millôr Fernandes e o editor Ênio Silveira.
Manoel é poeta do simples e da delicadeza, que adota a autenticidade dos defeitos. Tem estima pelas coisas e homens jogados fora pela sociedade. Seu universo é o do cisco, dos gravetos, dos inutensílios e dos nadifúndios. O escritor atua no espaço faz de conta. Interessa-se pelos hábitos das lagartixas, lesmas e animais rastejantes. O poeta faz brinquedos verbais com osso de arara, canzil de carretas, potes furados, sabugos. A singularidade de sua poética reside em combinar a aguda percepção urbana com um repertório primitivo e rural. Para Barros, o que é descartado é jogado dentro do poema. E afirma que o verdadeiro conhecimento está na leitura do mundo. “Poesia é voar fora da asa” (O Livro das Ignoranças).
O editor Ênio Silveira, sobre o “Livro das Ignoranças“, mostra como o poeta nos toca pela magia de seus versos, o que nos leva a compará-lo na tentativa de defini-lo como: “grande poeta de pequenas coisas”, “o lírico da ecologia”, “poeta do pantanal”, “o virtuoso do realismo mágico...”. Deixamo-nos envolver pela sua poesia, em que nos encantamos, pela sua constante redescoberta das palavras.
Adélia Menegazzo, sobre a obra “Concerto a Céu Aberto”, aponta que a leitura de seus poemas vem preencher os vazios e descobrir que o poeta entrega ao leitor um concerto de sons... audíveis apenas no silêncio entre uns e outros. Porque, antes de tudo, MÚSICA! Cada verso seduz pelo desvio, pelas dissonâncias e revela a revolução das palavras, “Do canto das aves está posto o concerto em pauta”.
Paulinho Assunção, sobre “Poemas Rupestres”, apresenta este menino que “pegou um olhar de pássaro” e que “contraiu visão fontana”, este menino, sábio dos “desacontecimentos”, este é um menino-manoel. É um menino “com olhar – furado – das nascentes”, que gosta de atrelar palavras de rebanhos diferentes, com o intuito de “causar distúrbios no idioma...”. É preciso dizer: todos nós nos desabrimos em outras pessoas diante da poesia de Manoel.
Adalberto Müller Júnior, a respeito de “Matéria e Poesia”, traz que a originalidade do poeta consiste em elaborar liricamente, com as coisas menores, verdadeiras relíquias de linguagem. Manoel de Barros é capaz de transformar a matéria mais desimportante em poesia. E, Pedro Du Bois no livro “As Pessoas Nominadas”, presta homenagem ao poeta: Palavras // Um, santo de barro /outro, Manoel de Barros / de comum,/andor/ ardor/ com que santificam / palavras / ditas / escritas /jogadas ao vento / que as reproduz.”
Não posso deixar de expressar minha gratidão pela existência de Manoel de Barros, pois ele é palpitação em nossas vidas. O seu conhecimento vem através dos sentidos. Ele descreve os sons, dando-nos condições de, ao lê-los, poder ao mesmo tempo ouvi-los e senti-los. O poeta humaniza as coisas, o tempo e o vento. E mais, gosta das músicas de Chico Buarque e de Paulinho da Viola!
Ao completar 90 anos, recebeu o prêmio Nestlé de literatura, pelo livro “Poemas Rupestres”. Também conquistou outros dois prêmios: Jabuti e da Associação Paulista dos Críticos de Artes. Mas, o seu maior prêmio é ter a sua obra distribuída em todo o país.
Manoel de Barros se considera um “songo”, como fez constar em seu poema inédito de mesmo nome: “Aquele homem falava com as árvores e com as águas /ao jeito que namorasse //... Dizia que era abençoado pelas rãs e pelos / pássaros / A gente acreditava por alto / Assistira certa vez um caracol vegetar-se /na pedra ////... Era muito encontrável isso naquele tempo./ Até pedra criava rabo!/ A natureza era inocente.”.
Discordo quando o poeta, em seu autorretrato falado, em 1994, disse: “estou na categoria de sofrer do moral, porque só faço coisas inúteis...”. Prefiro quando ele diz que a “Poesia tem que ter palavras, uma feira de ideias.”.