HISTÓRIAS DOS DEGREDADOS: MUITO BOM LIVRO
De Concessa Marin:
ESTOU PASSANDO a vocês o texto/comentário que escrevi sobre um ótimo livro que li agora em julho. Recomendo. Leva-nos àquelas primeiras viagens ao Brasil, à vinda dos nossos “tios”, os famosos degredados. Antes do meu, passo o texto fragmento do livro, que está na contra-capa de A DESCOBERTA DO NOVO MUNDO de Mary Del Priore - carioca, descendente de escoceses, judeus, gaúchos, entre outros.
Eram meninos esquálidos, maltrapilhos e de grandes olhos acesos. Uns quinze, os grumetes.Tinham o andar leve dos gatos. Aproximaram-se dos “meninos dos Santos”. Confraternizaram. Pareciam sofridos. Um tinha perdido dois dedos das mãos por causa das cordas. Outro, um olho esquerdo por conta de um golpe de sabre. A maioria trazia as gengivas pretas e um hálito fétido. Sofriam de escorbuto, doença que, por falta de vitaminas encontradas nas frutas, fazia inchar as gengivas e sangrar os dentes.
Cara escritora Mary Del Priore :
Na exibição do filme sobre o “2 de Julho”, o qual soube por acaso nas festividades da própria data nacional aqui na Bahia, recebi de presente num sorteio o A DESCOBERTA DO NOVO MUNDO. Por este motivo tomo a liberdade de lhe escrever. Tudo na surpresa porém o mais surpreendente é o seu livro, um encantamento de todos os lados.
Raramente temos uma obra tão musical. Realmente a música que soa dos termos, da escrita, descritiva e artesanal e do ritmo resultante, sem pausas, é uma grande catarata sonora que se precipita sem obstáculos – exatamente isso. Por outra, deu-me também a ideia da música barroca, ela mesma , pois vai do começo ao fim sem paradas nem mudanças como faz o “baixo contínuo” naquelas peças. Não exagero nem invento nada. Adorei!
Ao final não sabemos o que é mais destaque: se a robusta aula de História ou se o prazer da leitura de um texto de ouro, filigranado.
Mas não seria somente isso a dizer. De fato a gente costuma lembrar assim na troça “é, isso aqui não tem jeito, descendemos é daqueles degredados, etc... “ mas quando se lê o livro de Priore e se defronta com aquelas narrativas e sente náusea várias vezes – pois ela não hesita em descer ao fundo mais fundo para trazer as notícias das crianças, das doenças, da lama, então aí ficamos mais sérios. É uma dor que dá na gente, o tempo todo é essa dorzinha apesar de tudo. Eu não poderia tê-lo escrito. Já a nossa escritora encontra-se nisso mais isenta vez que descende de outros barcos – o saiote e as danças célticas onde as Bruxas são mais clean... melhor para nós que ganhamos seu livro (nos dois sentidos) e ainda tem por último, a ascensão. A ascensão transformadora que fez dos dois meninos, donatários e de Branca respeitada benzedeira . Dali para cá, morrer e nascer, morrer e nascer continua sendo a chance ascensional nessa nossa história sem fim...