SAUDADE PORTUGUESA
Todavia se fala que não há sentir, no mundo inteiro, comparável à saudade portuguesa; que nenhuma outra língua do mundo consegue expressá-la de forma semelhante, por ser tão próprio este nome, inviabilizando conceito análogo em outra linguagem. O objetivo deste será pautar essa assertiva, na construção do identitário lusitano, elencando algumas características primevas e profundas de tão forte sentimento social, que entrou para a literatura e dela é objeto de análise até os dias atuais.
D. Francisco Manuel de Melo, maior nome do barroco português, atribui duas causas para florescer a saudade entre os portugueses; o amor e a ausência. Em virtude das constantes navegações em busca de novos territórios conquistáveis, os mesmos ausentavam-se longamente e como entre todas as nações, essa é tida por mais amorosa, tão mais forte é sentida a ausência, donde se tem o princípio da saudade. Por esses motivos certos, ela será o centro natural do psicológico social português.
Entretanto, é preciso analisar ainda, a túnica paradoxal que reveste tal sacro sentimento, conforme o autor acima mencionado, de que ele seria algo ruim de que se gosta e, por outro lado, algo bom, mas que faz padecer. Tem-se então, no específico de cada motivo, o contraditório de ser ao mesmo tempo um bem que é mal e uma dor que infla de prazer quem a sente. No caso de Portugal, a saudade é levada ao extremo, tornando-se uma marca distintiva do espírito lusitano. Garret, poeta neoclássico, define saudade como o termo mais doce e expressivo de nossa língua que reporta a um tão grande sentimento, que não vê em outra linguagem nenhum outro vocábulo que o possa designar.
Diante do exposto, pode-se chegar a uma análise interessante; não são as pessoas que tem saudade, mas sim, a saudade é que as tem. Cada vez sentida, retira a pessoa do presente e a transporta de volta ao passado, uma vez que seu objeto, seja qual for, terá que estar ausente. E como ela faz isso!
Se a saudade é constituinte da identidade lusa, se nenhum outro vocábulo existe para lhe fazer parelha, ela é sentida apenas pelos portugueses?
Por conclusão deste lindo tema, responde-se: não. Todos os povos têm dentro de si e exteriorizam também esse sentimento que maltrata, mas ao mesmo tempo os torna amantes. O extremo a que foi e é levado esse sentimento pelos portugueses, é explicado por Teixeira de Pascoaes, editor primeiro da Revista A Águia, de literatura, ciência, arte, filosofia e crítica. Ele explica a “alma portuguesa”, afirmando que a saudade seria o próprio sangue imaterial dessa gente de Portugal, o seu estigma divino, o seu perfil eterno… Para quem quiser saber mais sobre tão sugestivo conteúdo, sugere-se um périplo pelas grandes obras de poetas e pensadores, como Mário de Sá Carneiro e Fernando Pessoa, onde se encontra bem calcada a argumentação e reflexão sobre esses dizeres saudosos. Claro ficará que a saudade portuguesa retrata um povo diferenciado de outras nacionalidades por sua maior sensibilidade ao sofrimento, que teve como gênese as navegações marítimas, conforme já tratado aqui, mas ao mesmo tempo, com maiores possibilidades de se conhecer e de transformar o seu mundo.