Ebooks: só mais uma modinha passageira?
A gigante amazon.com finalmente invadiu o Brasil e já chegou assustando. Aparentemente, os livreiros estão aterrorizados e tentando se organizar para forçarem regulamentações contra os ebooks, ainda mais agressivas do que aquelas em vigor na França.
Publico e vendo ebooks desde 2007 e, já naquela época, debatia calorosamente com outros autores sobre o futuro desta tecnologia. Ainda hoje, penso que muita gente está tentando tapar o sol com a peneira e, vez ou outra, leio a frase: "o livro impresso nunca vai morrer. Ler na tela de um computador não é a mesma coisa de ler um livro impresso, sentir o cheiro do papel, virar as páginas".
Será que os livros digitais são apenas uma modinha, que não chegaram para ficar?
Antes de tudo, não leio por causa do cheiro do livro, inclusive, se for um livro muito antigo, tenho até alergia, apesar de adorar uma biblioteca e um sebo.
Leio por causa das ideias contidas em um livro, não pela materialidade do livro. Realmente, não me importa muito se o livro vem num formato de bolso, com capa dura, ou na tela de um computador.
O relevante numa obra é justamente aquilo que é intangível, que não está circunscrito nas páginas, ou em qualquer outro suporte físico.
Quem lê somente por causa do livro impresso, não tem amor pela leitura, mas um fetiche pelo objeto livro.
O segundo aspecto que devemos considerar é sempre o do conflito de gerações. Só tem problemas com o livro digital aqueles que cresceram lendo livros impressos. Para uma geração que crescerá lendo livros digitais, a questão "ebooks substituirão o livro impresso?" nem se propõe.
Do mesmo modo que nenhum adolescente hoje se questionaria se as câmeras digitais substituirão, um dia, câmeras de filme. Aliás, muitos deles nunca viram câmeras analógicas na vida, assim como jovens do futuro talvez nem tenham contato com livros impressos.
O dilema é nosso, que estamos vivendo esta transformação tecnológica, e morrerá conosco.
Para entendermos o advento do livro digital, e principalmente a sua chegada ao Brasil, temos de olhar para trás, considerando outras tecnologias recentes.
As primeiras transmissões de televisão começaram no final da década de 20 nos EUA e Inglaterra. Em 1939, estimava-se que já haviam 2 mil aparelhos de TV em lares americanos, enquanto em 1947 já haviam 44 mil aparelhos.
A primeira transmissão no Brasil só ocorreria em 1950, com 200 aparelhos espalhados pela cidade de São Paulo. Hoje, praticamente todos os lares brasileiros possuem pelo menos um televisor.
Apesar de sua rápida propagação, ainda assim surgiram vários críticos deste novo meio de comunicação. Um dos pioneiros da rádio afirmou, em 1926: "Enquanto que, teórica e tecnicamente, a televisão seja possível, comercial e financeiramente eu a considero uma impossibilidade... devemos desperdiçar pouco tempo sonhando com tal desenvolvimento."
Numa das edições de The New York Times de 1939, uma das críticas era que "o problema da televisão é que as pessoas devem se sentar e manter seus olhos grudados numa tela; uma família americana normal não tem tempo para isto."
Entre incontáveis outros ataques, muitos inspirados pela Escola de Frankfurt, defendiam que a cultura de massas, entre elas a TV, era um dos braços de dominação do capitalismo para emburrecimento das pessoas.
Esta história se repetiu com o computador portátil, com o surgimento dos CDs e também com a internet. A própria invenção da imprensa por Gutenberg, no século XV, foi alvo de ataques, considerada por parte do clero como obra do demônio.
O livro digital está sofrendo, de alguma maneira, os mesmos ataques contra o livro impresso há quase 600 anos, uma demonização sistemática e retrógrada. Pois a era digital não veio para por um fim ao livro, à Literatura, ao escritor, ou ao conhecimento, mas projetá-los a um nível diferente de publicidade, distribuição e volume.
Nunca foi tão fácil publicar e distribuir um livro, e talvez nunca tenha sido tão fácil fazer com que um livro chegue aos leitores.
O problema dos ebooks, por ainda se tratarem de uma nova tecnologia, é que ainda não há uma uniformidade, estamos falando línguas diferentes.
Acreditava-se, até alguns anos atrás, que o .PDF seria o formato universal. Todavia, a falta de proteção de um arquivo deste tipo instigou a criação de novos formatos, capazes de resguardar o copyright. Assim, o ePUB ganhou terreno com várias editoras e livrarias virtuais. Além deste, há o formato .MOBI, proprietário da amazon.com, em seus projetos monopolistas de manter-se como a principal livraria online, bem como, aos poucos, de maior editora virtual.
Neste momento, não é possível prever o futuro dos ebooks, qual formato prevalecerá e como toda a tecnologia se desenvolverá nos próximos anos. Há uma grande probabilidade de vermos o nascimento de uma nova linguagem literária, que una elementos de mídias distintas, permitindo uma maior interatividade, até cooperação autoral, do leitor.
Em 2012, pela primeira vez o número de ebooks vendidos ultrapassou a de livros impressos nos EUA, e esta margem aumentará daqui em diante.
O fato é que a literatura da era digital está transformando a economia do livro e não poderá ser detida.
Isto implicará na extinção do livro impresso?
Possivelmente ainda não por algumas décadas, mas a escala de publicação de material impresso se reduzirá progressivamente até tornar-se insignificante no mercado editorial, convertendo-se enfim em itens de colecionadores de saudosistas.
(texto publicado originalmente em http://blogdoescritor.oficinaeditora.com/2012/12/ebooks-so-mais-uma-modinha-passageira.html)