Ángel Crespo: apontamentos para um estudo - I
Ángel Crespo nasceu no ano de 1926, em Ciudad Real, no dia 18 de julho de 1926. O menino cresceu e veio a ser poeta, ensaísta e tradutor. Em 1943 foi para Madri e ingressou na faculdade de Direito, tendo se licenciado em 1949. Neste mesmo ano publica sua primeira antologia de poesia. No ano de 1950 publicou Una lengua emerge; em 1951 fundou em Ciudad Real a revista Deucalión em colaboração com artistas e escritores do porte de Gregorio Prieto, Eduardo Chicharro, Camilo José Cela, Carlos Edmundo de Ory, Gabriel Celaya, Francisco Nieva, José Manuel Caballero Bonald, entre outros. No ano de 1956 casou-se com María Luisa Madrilley.
Em 1957 nasceu seu filho Ángel e foi então que publicou sua primeira tradução do poeta português Fernando Pessoa: Poemas de Alberto Caeiro. No ano de 1960 funda, junto a Gabino-Alejandro Carriedo, a revista Poesía de España (1960-1963), que acolheu os poetas da geração de 50 e outros, a exemplo de Vicente Aleixandre, Rafael Alberti ou Dámaso Alonso.
Em 1961 a 1970 dirigia a Sala Goya del Círculo de Bellas Artes de Madrid. Além disto, colabora com as revistas Ágora, Lazarillo e Adonais. Conheceu Pilar Gómez Bedate (professora de literatura e também tradutora), com quem se casou alguns anos depois. Em 1962 fundou, com a colaboração do diplomata e poeta brasileiro, João Cabral de Melo Neto, a Revista de Cultura Brasileira na qual divulgou para a Espanha a língua portuguesa moderna.
O ano de 1963 teve especial importância na vida do poeta Ángel Crespo, pois foi quando realizou uma viagem à Itália e, em Florença, começou uma amizade com o professor e hispanista Oreste Macrì, autor da antologia Poesía spagnola del 900, e que o incluiu neste repositório. Ángel abandonou a carreira advocatícia em 1964 e passou a se dedicar inteiramente às atividades de poeta, tradutor e crítico de arte.
Dois anos depois, em 1966, publicou o livro Docena florentina, marco de uma nova etapa em sua obra poética. Traduziu e publicou Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa. No ano de 1967 se mudou para Porto Rico, inconformado com a situação política e a cultura espanholas. Em Porto Rico ensinou Literatura Comparada no Recinto de Mayagüez da Universidad de Puerto, o que fez até o ano de 1988. Na Universidade de Porto Rico obteve o grau de Mestre em Artes.
Sempre em movimentação intelectual incessante, em 1973 obtém o grau de doutorado pela Universidade de Upsala (Suécia) com a tese Aspectos estructurales de El moro expósito del Duque de Rivas. Publicou a tradução da primeira parte da Divina Comedia (Inferno), de Dante; em 1976 completa a tradução de outra parte da mesma obra: Purgatório; e a terceira, O Paraíso, em 1977. Crespo foi considerado o maior exegeta de Dante em língua espanhola, tendo por isto recebido vários prêmios na Itália.
Em 1974 seguiu para uma temporada em Cantão de Grizões, na Suíça, com o objetivo de estudar a língua e a literatura reto-romanas (um dos idiomas oficiais da Suíça). Foi nessa época que publicou a obra Juan Ramón Jiménez y la pintura.
Em 1978 foi a vez da publicação das obras poéticas Claro: oscuro e Colección de climas; e o livro de aforismos poéticos intitulado Con el tiempo, contra el tiempo. Em 1982 publicou El aire es de los dioses; em 1983; as traduções do Cantar de Roldán e do Cancionero de Petrarca e a recopilação de sua obra poética escrita entre 1971 e 1981, El bosque transparente.
No ano de 1984 recebeu o Prêmio Nacional pela Melhor Tradução pela versão para o castelhano do Cancionero de Petrarca. Publicou Parnaso confidencial, obra na qual evoca e homenageia aqueles poetas com os quais mantinha uma estreita relação como leitor e também, em alguns casos, como amigo. Ainda publicou a tradução do Libro del desasosiego, de Fernando Pessoa e o ensaio Estudios sobre Pessoa.
É de Crespo a exemplificação a seguir, de um dos poemas de Fernando Pessoa. Pode-se conferir, por menor que seja o conhecimento do idioma espanhol, a conservação da melodia dos versos pessoanos, o cuidado com a correspondência sonora das rimas, o que só logrou o tradutor na primeira estrofe. Nas outras duas estrofes não foi possível manter a fidelidade e entra também em cena a adaptação, como se vê na troca do verbo escrever (primeiro verso da segunda estrofe) pelo verbo leer. A recriação se aprofunda no primeiro verso da terceira estrofe no momento em que Crespo sentiu a impossibilidade de levar para o seu idioma a expressão “calhas da roda”. Da mesma forma como não conseguiria um correspondente mais apropriado para “comboio de corda” (terceiro verso da terceira estrofe).
AUTOPSICOGRAFÍA
El poeta es un fingidor.
Finge tan completamente
que hasta finge que es dolor
el dolor que en verdad siente.
Y, en el dolor que han leído
a leer sus lectores vienen,
no los dos que él ha tenido,
sino sólo el que no tienen.
Y así en la vía se mete,
distrayendo a la razón,
y gira, el tren de juguete
que se llama corazón.
Cancionero (1909-1935), de Fernando Pessoa. Traducción de Ángel Crespo.
AUTOPSICOGRAFIA
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor.
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas da roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.
Cancioneiro (1909-1935), de Fernando Pessoa.
Em 1987 tornou-se professor visitante na Universidade de Washington, em Seattle, Estados Unidos. No ano seguinte voltou à Espanha e ficou definitivamente em Barcelona.Em 1992, professor visitante da Universidade Autônoma de Barcelona. Publicou a tradução de El oficio de vivir, de Cesare Pavese. E em 1993, nomeado professor emérito pela Universidade Pompeu Fabra, em cuja Faculdade de Tradução lecionou até que veio a morte. Foi homenageado com o Prêmio Nacional de Tradução pelo conjunto de sua obra no ofício de traduzir.
Ángel Crespo faleceu em Barcelona no dia 12 de dezembro de 1995. Foi sepultado no povoado turolense (de Teruel, cidade espanhola) de Calaceite, onde possuía uma casa na qual se refugiava durante longas temporadas para escrever e estar em contato com a natureza.
Ángel foi detentor de inúmeros prêmios, especialmente pelo seu ofício de tradutor: Premio de los Lectores y Libreros Italianos (Italia, 1979); Medalla de Oro Conmemorativa del Nacimiento de Dante del Ayuntamiento de Florencia (Italia, 1980); Medalla de Plata de la Universidad de Venecia (Italia, 1982); Premio de Poesía Ciudad de Barcelona (1983); Premio Nacional a la Mejor Traducción (España, 1984); Condecoración de la Orden del Infante Don Enrique, en grado de Comendador (Portugal, 1985); Premio Ciutat de Barcelona de Literatura en Lengua Castellana (1985); Premio Carlo Betocchi (Italia, 1990); Premio Nacional a la Obra de un Traductor (España, 1993); Premio Internacional de Poesía Eugenio Montale (Italia, 1994); Condecoración de la Orden do Cruzeiro do Sul (Brasil, 1995).
REFERÊNCIAS
http://cvc.cervantes.es/literatura/escritores/crespo/cronologia.htm
http://poeticas.es/?p=522