O erotismo em Flor: A libido como força propulsora da criação literária

Resumo: Este artigo visa traçar algumas considerações sobre os poemas de Florbela Espanca, autora Portuguesa enfocando-se aqui a energia aprisionada ( libido) que propulsiona a sua criação literária.Através da visão semiótica psicanalítica analisamos o universo do erotismo presente em seus versos que nos permite experimentar (perceber ) no jogo de palavras o despertar de sensações De um eu feminino irreverente aos padrões impostos na época.

Segundo Massud Moisés ( 2005,p.253) a poética de Florbela é uma poesia –confissão,uma espécie de “dom juanismo feminino “.Ela expõe em seus versos o desejo erótico de possuir o ser amado desenvolvendo versos /estrofes com a cadência de um ato sexual,sublimando toda sua criatura erótica em forma de poema proporcionando ao seu “eu” o clímax imaginado ,porém nunca vivenciado.Em sua definição como poeta ela afirma:

“ (...) É ter mil desejos o explendor

E não saber quem se deseja

É ter cá dentro um astro que flameja

É ter fome,é ter sede do inifinito

(...)

É condensar o mundo num só grito.

Observa-se que existe uma inquietude existencial ,uma busca insaciável pelo prazer .A sua fome e sede se convertem no desejo de saciedade plena .

Percebe-se, a busca por liberdade e as múltiplas vozes que ecoam no silêncio, pertubam como no afago do ser amante.Vejamos os versos que segue.

“Anseio !asas abertas!o que trago

Em mim? Eu oiço bocas silenciosas

Murmuram-me as palavras silenciosas

Que pertubam meu ser como um afago!”

Em Frémito do meu corpo ,ela utiliza assim como nos demais poemas ,metáforas e sinestesias para criar seu universo erótico.

“Frémito do meu corpo a procurar-te

Febre das minhas mãos na tua pele

Que cheira a âmbar, a baunilha e mel.

Doido anseio dos meus braços a abraçar-te.

Segundo a Wilkipédia a libido é a energia biológica responsável pela relação e procriação .Assim, se traçarmos uma analogia dentro do campo da literatura, constatamos que essa libido sublimada seria a relação entre o “eu “ e” o outro”dentro do poema e a procriação o fruto dessa relação ( a própria obra literária,na qual o erotismo ecoa pelo psicológico da poeta.Esse erotismo aflora diante da impossibilidade

Da satisfação real ,concreta dos desejos mais íntimos.

Para Dal Farra ( 1995:47)

“..é da contenção obtida pelo aprisionamento do corpo que esta força latente e pulsante tem ocasião de jorrar demasiadamente”.

Assim sendo, o eu lírico apresenta-se, como voz voluptuosa, sufocada talvez pela distância física, do seu objeto de desejo de maneira que as imagens e idéias fluem do inconsciente numa atividade da imaginação

Espontânea e criativa da mente ( psyqué).

Horas Rubras

“Horas profundas ,lentas e caladas

Feitas de beijos,sensuais e ardentes

De noites de volúpias ,noites quentes”

(...)

Sou chama (...)

E sou talvez na noite voluptuosa,

Ó meu poeta,o beijo que procuras !

As palavras profundas,lentas e caladas denotam a dança sensual ,essa concentração emocional faz-se notória quando é citado os beijos ardentes de noites de volúpias um ensaio lírico de quem quer vivenciar as delícias de uma noite de prazer. Assim, se fosse preciso concentrar numa palavra a descoberta freudiana ,essa palavra seria incontestavelmente inconcsciente . ( Bock ,2002) Creio que para concentrarmos em uma palavra a descoberta Florbeliana ,essa palavra seria o PRAZER.Na breviedade dos sonetos há toda uma ânsia erótica , que transcende a incapacidade física de ser vivido.

Horas profundas ,lentas e caladas porém que não anulam a existência de um ser sedento por prazer. É nesse momento, que entra em ação o elemento da fantasia fluindo do inconsciente todo desejo ora reprimido pelo consciente.Por isso a fantasia fruto da imaginação é a melhor maneira de desconectar do mundo externo do real frustrante. .

“Para Freud essa fantasia está ligada ao prazer afastando-se do mundo externo.A obra seria uma manifestação do inconsciente do autor.o desejo e toda a motivação comportamental é algo gerado das operações universais do aparelho psíquico codificado por uma linguagem obscura e transcendente.”

(Revista Adverbum 3 (1) Jan a jul de 2008:PP.18-27)

"SE TU VIESSE A TARDINHA"

Se tu viesse ver-me hoje à tardinha,

A essa hora dos mágicos cansaços ,

Quando a noite de manso se avizinha

E me perdesse toda nos teus braços”.

(Espanca,2005.p.69-70).

Observa-se, uma constante busca do “EU” em possuir o outro almejando a plena união.

O desejo é visivelmente materializado em seus versos.

“É como cravo ao sol a minha boca...

Quando os olhos se me cerram o desejo

E os meus braços se estendem para ti”.

( Espanca,2005 p.70 ).

Para a Semiótica psicanalítica, é necessário construir hipóteses e diagnóstico,s que nos permitam compreender ” o ser no mundo”,sendo necessário avaliar o processo psíquico no qual a obra foi criada.

A aceitação desse a consideração da sexualidade, são entre outros interesses da psicanálise que avalia o homem enquanto sujeito do inconsciente,compreendida como uma região icongnicível. Dessa maneira, constata-se a obra como representação escrita da subjetividade do autor, ou seja ,nos poemas de Florbela os flahs libidinais são na verdade, a construção das fantasias que compõem sua subjetividade.Escrever é envolver diversas dimensões desses elementos, e em especial, a construção histórica e subjetiva do autor.

Florbela Espanca é uma das mais notáveis personalidades líricas isoladas ,pela intensidade de um emotivo erotismo.De todos os seus sonetos Fanatismo se converte como referência Florbeliana

Pois a autora tinha um fanatismo pelo seu objeto de prazer como num misterioso livro qual ela queria folhear,ler até as entrelinhas do ser amado que não transmitia cansaço.

A leitura daquele corpo embora fosse tantas vezes lido ,sentido,sempre apresentaria inesgotável possibilidades de prazer dessa leitura,que embora, pudesse parecer única era infinita,embora afirmassem a transitoriedade do ser ,ele estaria eternizado no desejo de seus versos Assim sendo, ela transforma o mortal em imortal , o finito em infinito

O imaginário obscuro em um prazer real.

Ler os poemas eróticos de Florbela é mergulhar num universo de inúmeras sensações ,que nos permite experimentar a nossa própria natureza em alguns momentos sufocados pelo mundo real.Ao nos deliciarmos em seus versos nos permitimos viajarmos a nossa real natureza ,de desejar e ser desejado.

De sentir e saber que somos sentidos...enfim, de estendermos ao outro aquilo que gostaríamos que a nós nos fosse proporcionado: Prazer! entretanto , não apenas um prazer físico ,porém, um prazer que transceda as nossas limitações espaciais e temporais .Ver no outro a extensão do meu amor próprio .Condensar meus anseios aos anseios do outro ,e se isso parece impossível nos resta apenas, descobrimos o gozo existencial nas entrelinhas de cada poema Florbeliano.

Fanatismo Florbela Espanca

Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida

Meus olhos andam cegos de te ver!

Não és sequer razão de meu viver,

Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...

Passo no mundo, meu Amor, a ler

No misterioso livro do teu ser

A mesma história tantas vezes lida!

Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."

Quando me dizem isto, toda a graça

Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, vivo de rastros:

"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,

Que tu és como Deus: princípio e fim!..."

O poema acima foi imortalizado também sob forma de música pelo cantor brasileiro Fagner.A melodia e a letra, encerram toda a paixão desvairada de Florbela Espanca e das Florbelas do mundo.Quanta intensidade pulsa nos seus versos.

Quanto Don-juanismo feminino.

Quanta possibilidade na impossibilidade do momento.São contradições que se fundem denotando um ansioso ser ,sempre disposto por viver as novas descobertas no misterioso livro do nosso ser.

Ler os poemas de Florbela Espanca é atravessar o limite das possibilidades, é encontrar nas entrelinhas o grito sufocado no silêncio,é perceber que o sentimento rompe as barreiras da temporalidade.

O ser vive e está sempre em mutações ,mas, se mantém estático na sua dimamicidade.Ele é o que deveria ter sido e não foi.Ele fala o que o coração sente e a boca cala.

São mil vozes a ecoar,frêmitas mãos,desesperados braços que se estendem na busca de amar.Seu fanatismo resume-se, em persistir na procura daquilo que não se perdeu :O amor.

Para muitos a autora é apenas mais uma mulher mal-amada que vê em seus versos a válvula de escape para suas frustrações, mas, para outros (inclusive para mim) ela representa o que de mais belo flue na alma feminina.O desejo de ser e exercer a sua capacidade de amar.De querer transpor barreiras convencionais.De ser mulher na pura essência da palavra escrita no misterioso livro do ser feminino,sempre inédito no seu dia-a-dia.

Clara Fênix
Enviado por Clara Fênix em 30/04/2012
Reeditado em 14/03/2016
Código do texto: T3641989
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.