Pelo direito de ler livros infanto-juvenis
Sempre fui rata de biblioteca, devorando livros como outros devoram balas ou chocolates (ok, também sempre adorei devorar balas e chocolates, mas isso é só um detalhe). Amo boas histórias, independentemente de elas serem consideradas clássicas ou não, de serem reconhecidas pela crítica ou não. Sou daquelas pessoas que, nas livrarias, gostam de explorar as prateleiras, lendo orelhas e contracapas, para só depois de muito tempo decidir o que vai levar - e normalmente saio com os braços cheios, incluindo-se ali por vezes autores consagrados, por vezes alguns dos quais eu nunca antes ouvira falar.
Isso tudo, no entanto, é só um preâmbulo - ou nariz de cera, como dizemos em linguagem jornalística - para dizer que, no tocante à leitura, não tenho preconceitos. Não me envergonho nem um pouquinho de dizer que, na adolescência, li Paulo Coelho e Sidney Sheldon. Mas também li Machado de Assis e Umberto Eco, entre centenas de outros. Ainda no ensino fundamental, alternava a leitura de séries juvenis, geralmente de mistério, com clássicos da literatura brasileira, e não via nenhum problema com esse arranjo.
Da mesma forma, não vejo nenhum inconveniente, hoje, em alternar leituras ditas mais sérias com aquelas que me dão prazer. E nessas passei a incluir, há algum tempo, também literatura infanto-juvenil. Provavelmente muitos vão achar graça, afinal, já passo dos trinta anos (não se pergunta a idade exata a uma mulher); no entanto, não vejo por que deveria, por isso, abrir mão de uma boa história.
Há dois anos, passei a integrar um grupo local chamado Confraria Reinações Caxias, que se reúne mensalmente para discutir um título infanto-juvenil. Por outros compromissos, tenho ido a poucos encontros, mas o grupo serviu para eu ter a certeza de que não sou a única que aprecia um texto bem escrito, independentemente do público para o qual ele foi escrito.
Aliás, como leitora e também como escritora, e já ouvi o mesmo de outros escritores e leitores, acredito ser um tanto inexata essa classificação de leitura por faixas etárias. Uma boa história é uma boa história, e pode ser apreciada também por outros que não são seu público-alvo original. Não acredita? Pois atire a primeira pedra quem nunca caiu às gargalhadas no cinema, assistindo a filmes como Madagascar e Shrek. Ah, isso é diferente? Por quê?
Pois eu estou aqui para defender o fim do preconceito na leitura, o que inclui a defesa do direito de ler também bons livros infanto-juvenis.
E para quem não sabe por onde começar, deixo a dica de um dos livros que estou lendo no momento, e que é daqueles que você não consegue largar, de tão absorventes: Ladrão de Olhos - As Aventuras de Peter Nimble, de Jonathan Auxier. A trama gira em torno de um órfão cego, de dez anos, que sobrevive como ladrão, até que rouba uma caixa que contém três pares de olhos mágicos. A partir daí, muitas aventuras, com direito a criaturas falantes, corvos aterrorizantes, mistérios e charadas.
É uma dica apenas, um exemplo de como pode ser gostoso navegar por literaturas ditas infanto-juvenis. Experimente. Às vezes, vale a pena voltar ao mundo mágico das crianças.