CRIAÇÃO LITERÁRIA - COMO ESCREVER UM BOM CONTO
Não é minha intenção fazer um tratado da arte de escrever textos de ficção, tampouco colocar o interessado no rol dos grandes escritores. O que pretendo é, com humildade, tornar conhecidos os meios pelos quais, aquele que a isso se dispuser, poderá transpor para o papel magníficos textos em prosa, o conto, especialmente. A confiança que me dá garantias de deixar planificado um ótimo modelo de ideias e aconselhamentos vem do longo tempo em que me dedico à feitura de histórias curtas - contos - com bastante sucesso no que tange aos comentários dos que os têm lido; isto prova que a prática traz a perfeição e, a persistência, a vitória.
Forçoso é reconhecer que, a despeito de dominar os meandros e as diretrizes no que concerne a técnica de escrever um bom texto de conto, o bojo é inerente ao próprio escritor; é dele a capacidade de criar, prender quem o lê, por sua veia natural de ficcionista. Por mais apuradas, exercitadas e empregadas que sejam as técnicas, se quem escreve não se esforçar no sentido de contar uma história interessante, capturando a atenção para um bom desfecho, de pouca valia terão sido as orientações. É preciso ter isto em mente ao escrever uma história. Um conto é uma unidade de drama e de acontecimento. Do princípio ao fim ele leva a um desfecho único e precisa deixar no leitor a impressão da dúvida, do enigma e da continuidade, embora termine com o ponto final aquilo que o narrador pretendia dizer.
Perguntaram a Guy de Maupassant, o maior contista francês de todos os tempos: “Como se escreve um bom conto?” Ao que ele respondeu: “Basta criar um bom começo e um bom final”. “E o meio?” Quis saber o interessado; e ele respondeu: “Aí entra o escritor”. Por esse diálogo, pode-se compreender a importância da preocupação que precisa permear o trabalho de um escritor de conto enquanto desenvolve a sua trama. Não é o fim, tampouco o começo que vão garantir a leitura atenta e cativa de sua história, mas a forma com que ele liga o primeiro ao segundo. Ele pode partir com uma ideia genial e um prodigioso desfecho e, no entanto fazer malograr a sua história. Quantas não são às vezes em que lemos e relemos uma história, embora já saibamos o princípio, o fim e tudo o que vai acontecer nela? Isto prova que o segredo do bolo não se encontra em sua fórmula ou nos ingredientes, mas em como eles são distribuídos e aplicados.
Não cabe, em tão pouco espaço, dissertar sobre os diferentes tipos de contos existentes. Todavia, seja qual for a variante escolhida, as técnicas para escrevê-los bem e atraentes continuarão imutáveis.
A PRIMEIRA PESSOA NARRA A HISTÓRIA
O narrador é o personagem principal da história. Viveu-a em todos os seus detalhes. Há, entre ele e o leitor, certa intimidade. Ele pode se abrir sem meias palavras, pois conhece como ninguém o psicológico de todos os envolvidos na trama como se fosse o dele. Para os que gostam de esmiuçar o interior das personagens, relatar e compartilhar emoções fortes, este tipo de narrativa é o ideal, pois não oferece limites. Por ter sido aquele que vivenciou a trama, a narrativa não deixa a menor sombra de dúvidas e tudo adquire maior veracidade; não há, para o leitor, o que duvidar ou contestar. Há que se ter, no entanto, o cuidado de não cansar o leitor com frases de conteúdo psicológico em demasia. Precisa o escritor/personagem ater-se ao conselho de Maupassant no sentido de tornar interessante cada lance da narração, pois se arrisca, do contrário, a fazer malograr o conto.
ALGUÉM, DE FORA, NARRA A HISTÓRIA
Neste caso, uma terceira pessoa, que não viveu a história, mas a conhece perfeitamente, procura passar para o leitor o que sabe. A confiança total nos detalhes da trama, porque tais e tais cenas ocorreram e como ocorreram exatamente, torna-se nesse caso impossível, porque o narrador não pode ser onisciente, embora procure passar isto, usando habilmente as palavras. Por ser um fato de ficção ele amplia o leque, apoiado nas possibilidades da própria literatura. Sua visão é ampliada, podendo manipular princípio, meio e fim, adaptando cenários, vasculhando espaços, enfim, trabalha com todas as ferramentas disponíveis a uma boa dissertação. Nesse pormenor, está ele mais habilitado do que o narrador que viveu o papel central da história, embora seja menor a interatividade com o leitor.
UM DOS PERSONAGENS, QUE NÃO É O PRINCIPAL, NARRA A HISTÓRIA
Neste caso, alguém que conhece a história, mas não a viveu como um todo, procura contá-la ao leitor. Seu escopo é passar o que ele sabe além do que vivenciou sem, no entanto, esmiuçar detalhes, como um elemento neutro. O drama psicológico não será tão enfatizado, mas terá, na narração, do mesmo jeito que o personagem principal, ou até mais, a chave transmissora da verdade nua e crua. Sua empatia com o leitor é, portanto, forte e eficaz.
ALGUÉM, QUE NÃO VIVEU O DRAMA, MAS CONHECE O PERSONAGEM PRINCIPAL, NARRA A HISTÓRIA
Este seria uma média dos outros três. Conhece a história e conhece o personagem principal. Pode, portanto, narrá-la com algum crédito e fazer dela um drama adaptado de seu conhecimento dos fatos e de sua capacidade e recursos literários.
USAR OU NÃO USAR DIÁLOGOS
Diria que são eles necessários sem serem imprescindíveis. Um conto sem diálogos tenderá a uma crônica, quando não ao malogro total, por lhe faltar vida. O que é a vida senão a interlocução, opiniões, discórdias, questionamentos? O que são os dramas senão o choque entre pessoas? E, nesses casos, precisa haver o diálogo. Os contistas iniciantes tendem a deixar de lado os diálogos em seus contos; é preciso investir nesse particular que pode fazer a diferença entre um bom e um mau conto. Há os grandes contadores de historias, que conseguem fazer ótimos contos sem um diálogo sequer, como Eça de Queirós, por exemplo. Como há aqueles, como Ernst Hemingway que compõe uma história totalmente dialogada.
COMO INICIAR E TERMINAR UM CONTO
Por ser o conto uma unidade dramática, difere do romance. Neste, o autor divaga, expressa opiniões e contorna para, somente então, esclarecer, no final, o desfecho da trama. No conto, pelo contrário, o autor conduz quem o lê por uma estreita avenida e este vai, ansioso, em busca do seu final, onde uma luz lhe dá a descoberta, o desfecho, muitas vezes enigmático, às vezes não, não importa. No romance é preciso saber terminar, no conto é preciso saber começar. No princípio de um conto já deve estar inserido o seu final.
ESCREVER COM CRIATIVIDADE
Não escreva apenas; pinte, crie, mostre ao leitor por onde ele está caminhando. Mais vale uma linha de criatividade do que uma página inteira de pura literatice. É preciso fazer quantas revisões necessárias for até que veja o texto brilhando; isto traz elogios e reconhecimento. Escrever é desenhar no papel as cores da vida e dos acontecimentos. Se o leitor se sentir passeando dentro da história, lendo-a como a assistir um filme, ávido pelo seu final, estará cumprido o papel do ficcionista