A BÍBLIA DIZ: DEUS É AMOR

Se ligeiramente tomarmos a Bíblia como Literatura, considerando o pré-texto, o contexto e o texto, podemos observar:

- a Torah (Biblia Hebraica ou Antigo Testamento) é uma história épica do povo de Israel e sua relação com Deus;

- um bom exegeta (estudioso aplicado da Biblia) argumenta a priori que "nem tudo o que aconteceu está na Biblia e nem tudo que está na Bíblia aconteceu";

- com os escritos cristãos (ou Novo Testamento) acoplados naquilo que chamamos Biblia no mundo ocidental se propõe uma continuidade daquela história épica e relação com Deus porém numa perspectiva a partir da presença do chamado Filho de Deus (o Cristo = Messias).

Desse ponto de vista, em que o ápice da história de relacionamento com Deus se dá com a presença do Filho de Deus caminhando na terra como um ser humano (a Encarnação) é que existem essas escrituras contempladas no NT utilizando-se de uma pré-figuração presente no AT (como o Servo de Deus, anúncios proféticos etc) para demonstrar a presença do Messias (Cristo) em Jesus de Nazaré.

Sabe-se que Yeshouah ben Joseph (Jesus filho de José) ou, se quiser, Yeshouah ben Miriam (Jesus filho de Maria) não deixou nenhum escrito direto dele e em função disso suas palavras e manifestações são transportadas por aproximações nas Escrituras, sendo chamadas de 'teologias' (modo de identificação de Deus) e mais conhecidas a dos 'sinóticos' (evangelhos de Marcos, Mateus e Lucas), a 'dos escritos joaninos' (evangelho, as cartas e a Revelação (apocalipse) de João) e a 'teologia paulina' (das Cartas de Paulo).

É exatamente nesse chaveamento que se pode abrir-se para identificar os momentos de cada comunidade preliminar do cristianismo (a comunidade de Marcos que gera os escritos no Evangelho de Marcos, considerada precedente, ou seja primeiro escrito acerca de Jesus; a comunidade de Mateus que gera os escritos no Evangelho de Mateus; a comunidade Lucas que gera os escritos no Evangelho de Lucas e nos Atos dos Apóstolos; a comunidade de João que gera o Evangelho de João, as Cartas de João e a Revelação de João; e as comunidades apóstolicas de Pedro e Paulo que geram as Cartas de Paulo primordialmente e as de Pedro, Hebreus etc).

Quando ocorre a institucionalização da Igreja ela vai se apoiar prioritariamente na teologia paulina por motivos históricos (está diante de uma sociedade orgiástica decadente, por exemplo, onde os muitos filhos bastardos gerados são despejados em esgotos e fornos de lixo - vide história de Roma, dentre outras barbáries aceitas por essa sociedade) e é nesse contexto, em que as comunidades apostólicas são ridicularizadas, perseguidas e martirizadas pelo 'modus vivendi' pagão que surgem as cartas apostólicas que, no mais das vezes, são cartas para animar os que se propõem a 'darem a cara pra bater' diante de uma sociedade bestializada que acende tochas humanas com os que são contrários àquele modo.

Jesus de Nazaré afirma, conforme o que se escreve, que não vem abolir a Lei e os Profetas (aquilo que há na Torah) mas dar cumprimento (fazer com que se cumpra) numa interpretação absolutamente renovada em que o Deus terrível e vingador é demonstrado pela perspectiva misericordiosa, em que se destaca o Amor, tão grandioso e acima do humano que cede seu Filho, sentindo as agruras do humano numa terra palestinense dominada pelo 'Império mundial de plantão' para ajustar os erros humanos.

E para dar cumprimento à Torah é preciso renovar-se diante de si, cada um, numa outra visão de mundo possível, pois que cada escrito (considerado em pré-texto, contexto e texto) tem um momento de necessidade da Graça de Deus, mais profundo do que a leitura superficial que se faz normalmente (muito em função da ausência do critério necessário), onde se usa o que se quer e descarta-se o que se quer sem reflexão.

Abraçar ou rejeitar os Escritos é um direito sagrado e melhor ainda quando se abraça ou rejeita com um embasamento criterioso, seja pessoal ou comunitário.

Concluindo: de fato, a partir de Jesus de Nazaré, Deus pode ser experienciado como Amor, Misericordioso e também Justo; e muito bem descrito nessa perspectiva nos escritos joaninos, principalmente na primeira carta de João.

Acredito que uma boa explanação dessa perspectiva tenha sido feita por Watchman Nee:

"Deus é amor. Isso está registrado em 1 João 4:16. Aqui não diz que Deus ama. Tampouco diz que Deus poderia amar ou que Deus pode amar ou que Deus amou ou amará. Pelo contrário, diz que Deus é amor. Que significa dizer que Deus é amor? Significa que o próprio Deus, Sua natureza e Seu ser, é amor. Se pudéssemos dizer que Deus tem uma substância, então a substância de Deus é amor."