SIMBOLOGIA DA MORAL

Só o individuo conversando com ele mesmo ou no máximo com seu reflexo, consegue conhecer-se sem a interferência nefasta de sua mente incauta, sem que os caminhos sejam sugeridos pelo meio, procurando dentro de si, sem se importar com o que disse o sacerdote como máxima, mas ouvindo a voz que indicou ser inerente ao seu interior, o antídoto à suas moléstias. Partindo do princípio que as informações estão lá incrustadas nos entremeios de sua própria raiz mental, no momento em que a mente aquietada for consultada pode tornar-se antagônica a tudo que ela mesma sugou de impureza e tentou transformar em realidade para a formação de um caráter quebradiço. Isso tem nome, chamamos meditação.

A referência que se tem da vida é toda ela baseada em sinais, gestos, objetos e palavras, qualquer ocorrência que fuja a esses códigos não é compreendido ou pelo menos é bloqueado pela mente. Isso acontece porque se pensa existir neste momento, portanto insere-se automaticamente a presença em meio a todo esse simbolismo, é lógico pensar assim porque tudo é produto proveniente da mesma origem. Não conseguiria transportar objetos de um lugar a outro sem o auxilio das mãos, simplesmente porque as mãos estão diretamente na mesma sintonia dos objetos, significa dizer que para conciliar a existência com o mundo onde se encontra, o individuo deve adaptar-se a ele, mesmo que a percepção sensorial aponte para outra direção. Á lógica não pode ser contrariada, ela sempre estará correta de acordo com a relatividade da situação a que o efeito a ela foi conferido. Não tenho nem um pudor em afirmar isso, já que do ângulo onde me encontro, não concordo com a posição que foi omitida por sua elipse negando clareza ao contexto, não abrindo nuances para ponderações, fechando-se em sua retórica extremista, sem espaço para contestação, porém devo asseverar que nada é mais relativo que a própria lógica, não necessitaria do auxilio de Einstein para enfatizar algo que sem muito esforço podemos verificar em rotinas. Um pênalti que, por exemplo, acaba de ser marcado, o juiz precisamente assinalou, mas o bandeira, que estava encoberto omitiu-se, o locutor bairrista contestou e a torcida adversária narcotizada pelo fanatismo enfureceu-se. Tudo foi fruto do símbolo lógico atribuído aquela fração de segundo, cada um dos personagens teve seu argumento incontestável, pois todos foram testemunhas oculares no mesmo fato.

Não existiria maturidade na evolução se o pensamento se tornasse uniforme, esse é o verdadeiro sentido da procura para a formação de uma frente comportamental coesa na concepção de uma idéia. É sabido, entretanto, que a idéia neste sentido é oriunda de uma mente externa, sem o aprofundamento necessário para a dissolução do paradigma existencialista dos corpos palpáveis, quero dizer que os símbolos são necessários para que se reconheça o mundo em volta, suas necessidades, suas vicissitudes, seus pontos de convergência e por fim o lugar onde se poderia encaixar o oportunismo que nos caracteriza, tanto no meio familiar como profissional ou até no sentido mais pejorativo em nenhum dos dois, já que a terceira hipótese aponta sempre para uma porta bem mais larga.

Em última análise, quando um déspota percebe a devastadora força dos símbolos, vale-se da fragilidade dos menos vigilantes para arrebanhá-los as multidões, aliciando fanáticos, criando exércitos e construindo impérios. Exemplos não nos faltam, suásticas, pirâmides, ídolos, livros, crucifixos, templos suntuosos etc. nesse sentido, algo deve ser concreto para que seja absorvido e transforme toda ingenuidade em culto de adoração, despojamento e submissão.

Dizer não a toda essa horda que enlameia o mundo em que vivemos é complexo até para os mais esclarecidos, principalmente porque grandes esclarecimentos originam oportunidades incalculáveis a uma mente prodigiosa, a linha entre moral e iniqüidade é delicada e os valores mudam à medida que as exigências carnais tornam-se insofismáveis.

Esquece o indivíduo que apenas um passo adiante do que vislumbra pode dissuadir a mente e desarmá-la, não necessitando exatamente substituir as crenças ou abrir mão de seus ideais de materialidade. A busca introspectiva trará mudanças no conceito de valores. A permuta de símbolos por sentimentos puros fará toda diferença. O livro sagrado que até então era conduzido em baixo do braço ao qual era atribuído toda sua força de persuasão, pode agora ser aberto e interpretado de verdade, desarmado de simbolismos externos e preconceitos, o crucifixo, objeto de adoração e proteção não deixará de fazer o seu papel, terá a prestimosa companhia do sentimento verdadeiro e passará a fazer sentido como adorno, deixando de receber e intermediar pensamentos para ações de reciprocidade entre os dois lados da mesma fonte.

A inteligência suprema tem mil faces, todas coerentes de simples acessibilidade. É o único oráculo de sabedoria instalado nas profundezas do ser, vivendo dentro de cada um em forma de princípios. Toda a literatura do mundo não pode assemelhar-se ao que está guardado no “coração” do homem. Além do caminho da verdade só existe o lado externo o qual na melhor das hipóteses o conduzirá a interpretação da leitura subliminar da existência, aquela que nas entrelinhas aponta os direcionamentos para o regresso à consciência.

O único complicador neste aspecto vem dos próprios conceitos de imutabilidade da palavra, que foram proferidas a milênios de acordo com a relativa condição evolutiva dos direcionados. Ilude-se quem as interpreta superficialmente por sua sonoridade ou mesmo profundamente, quando blindados por esses conceitos, buscando apenas apoio para reafirmação de uma idéia pré-existente.

Não há ritual ou fórmula mágica que traga sem desapego a retomada da consciência, existe sim um caminho a ser trilhado no sentido do “coração”, é uma luta diária para manter a mente vigilante evitando que desvie seu olhar do objetivo principal. Embora nem sempre seja possivel sustentar o foco, as tentativas serão consideradas atenuantes facilitando assim novas incursões ao âmago do ser essencial.

Anderson Du Valle
Enviado por Anderson Du Valle em 06/05/2011
Reeditado em 07/05/2011
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