Juó Bananere - O Verdadeiro Anti-Herói da Literatura Brasileira

JUO BANANERE

Um verdadeiro anti-herói da Literatura Brasileira

A artografia muderna é

Uma maniera de scrivê,

chi a gentil scrive uguali come dice.Per isempio: - si a gente dice Capitó, scrive kapitó; si si dice Alengaro, si scrive Lenkaro; si si dice dice, non si dice dice, ma si dice ditche.(Juó Bananére)

Mistura de sonoridades. Confusões de sintaxes e referências lingüística do italiano e português. Estilo único. Inovador. Assim escrevia – e talvez falasse - Juó Bananére, um dos mais importantes pseudônimos literário brasileiro e que antecedeu o movimento modernista utilizando a paródia não apenas como recurso estilístico, mas também como uma forma original de criação e contestação.

Juó é o pseudônimo do engenheiro paulista Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, nascido em 11 de abril de 1892 na cidade de Pindamonhangaba, interior de São Paulo,e falecido aos 22 de agosto de 1933 na capital, vítima de pneumonia. Antes de se casar, e para ajudar a custear os gastos que tinha enquanto cursava Engenharia na Escola Politécnica da USP, passou a atuar como jornalista escrevendo artigos para alguns jornais de São Paulo e crônicas irreverentes para o periódico O Pirralho, de Oswald de Andrade, utilizando-se do pseudônimo Juó Bananére. Alexandre criou versos paródicos de poetas famosos como Olavo Bilac, Gonçalves Dias, entre outros, além de fazer críticas através de sua escrita peculiar aos políticos e poderosos da época.

Intó, io piguei di marginá

a storia dos mio acunhecidos.

S´immaginei chi o Hermese da Funzega

giá fui carrapato, gia fui caxorro,

burro, cavallo, surdaddo e oggi é

presidento da a Republiga...(in Cartas d´Abax´o Pigues)

Alexandre acabou por criar um cidadão tipicamente ítalo-paulistano, morador do bairro do Bixiga (ou Abax´o Piegues, como dizia o próprio Juó), que através da mistura da língua portuguesa com o falar italiano lançou o “português macarrônico”, que pode ser compreendido a partir da assimilação da escuta de forma livre e descomprometida da fala dos primeiros imigrantes italianos que se basearam nos bairros do Brás, Barra Funda, Bexiga e Bom Retiro.

Conforme aponta Cristiana Fonseca, autora do livro Juó Bananeré – o abuso em Blague, Alexandre criou e formou Juó através das ruas de uma São Paulo pré-modernista, onde o ritmo do crescimento e a mistura de costumes, falares e sentidos levaram sua obra a causar um grande sucesso naquela época:

O indiscobrimento da A meriga

fui uno fattó molto impurtanto

inda a storia da giografia, pur

causa che o mondo fico maise grande. (in Cartas d´Abax´o Pigues)

Juó fazia uma leitura marginal da própria vida marginal daquela época. Seu foco apontava para a representatividade dos imigrantes italianos, que dentro da ótica retrógrada da oligarquia dos barões do café, não passavam de substitutos dos escravos alforriados no século passado. Por isso, o chiste, o burlesco, o cômico das obras de Juó possuíam veias de antagonismo com a sociedade conservadora da época, abrindo mão de uma aproximação simpática pela razão de ser e pensar dos imigrantes e seus herdeiros com aqueles que dominava a cena social da época.

Migna terra tê parmeras,

che canta inzima o sabiá/

As aves che sto aqui,

também tuttos sabi gorgeá/

A abobora celestia tambê

che tê lá na migna terra/

Tê moltos millió di strella

che non tê na Inglaterra. (in La Divina Increnca)

Mas o legado de Juó Bananeré não alcançou tanta amplitude quanto alguns de seus contemporâneos modernistas – e que chegaram a beber de sua fonte – tornando-se um distinto membro de um célebre time de escritores. Conhecido, mas jamais reconhecido.

Fato certo é que Juó, apesar de sua escrita despretenciosa e de apelo cômico, não conseguiu sobreviver ao longo dos anos ao lado de seus colegas modernistas. Contudo, já antes da consagrada semana de 22, ele era considerado um pioneiro, muito a frente do seu tempo. Nesse sentido, há registros de reverência a sua obra prestadas por grandes nomes da nossa literatura como, entre outros, Monteiro Lobato, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Alcântara Machado, que em sua obra, Cavaquinho e Saxofone, dedicou-lhe um capítulo eivado de demonstrações de afeto e reconhecimento da sua tarimba literária.

“O português macarrônico dos italianos de São Paulo teve em Juó Bananére seu grande estilista. Há de ficar clássico. As deformações de sintaxe e da prosódia, aqui italianização da língua nacional, ali nacionalização da italiana, saborosa salada ítalo-paulista das costureirinhas, dos verdureiros, dos tripeiros, também de alguns milionários e de vários bacharéis, todos eles com raras exceções torcedores do palestra, os interessados podem estudar nos textos de Juó Bananére.“

A concepção que se faz da obra de Juó é que sua estética serviu mais para divertir, ufanar, patuscar um estilo de vida, ficando as críticas sociais e contestações literárias rebaixadas a valores de insignificância, pois os senhores cultos e estudados, que detinham o poder sobre a opinião pública em geral, não se davam ao trabalho de rechaçar ou até mesmo em citar as críticas vindas de Juó.

O pobre ria. O rico ria. O paulista ria. O italiano ria. E tais escritos, ao invés de causar um grande enfurecimento no meio político, causar espanto público e criar uma atmosfera de reflexão e indignação, acabavam virando piada de botequim e servir para embrulhar peixe no dia seguinte.

Sua habilidade em derrubar a rigidez do vocabulário, misturar o léxico, enganar a semântica e confundir a sintaxe, rendeu-lhe um estilo auto destrutivo em si mesmo, pois ao tempo em que se mostrava moderno, atalhava-se ao preconceito didático-cultural ao fazer criticas através de uma linguagem burlesca e grosseira.

O “português macarrônico” acabou sendo estigmatizado pela sua banalidade. Ao se assenhorar e aplicar com veemência a paródia, Alexandre, através de Juó, acabou, na verdade, não criando nada. Apegou-se a um estilo literário, mas não soube aplicá-lo de outra forma a não ser para parafrasear, criticar ou contestar o que já havia sido escrito. E como asseverou Carlos Drummond de Andrade muito tempo depois da passagem de Juó pelo nosso mundo, a plástica é vã se não comove.

Porém, trabalhando a paródia ao seu modo, Juó abriu os olhos da estirpe modernista que vinha se formando na literatura nacional. Pode-se se assegurar, sem receios, que as idéias e os ideais de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, e dos demais autores modernistas foram revistos a partir da literatura de Juó. Isto porque eles perceberam que o sucesso da literatura de Juó tinha um limite: o da seriedade.

Em suma, eles notaram que não adiantava falar como se pensa, mas sim que se deveria pensar para não se falar como se pensa e conseguir ser entendido. Ou melhor, aceito pela sociedade.

Em uma análise rasteira sobre qual estilo literário geraria maior impacto em uma sociedade já fremente por uma nova estética, é claro e notório que a de Juó ganharia de largo dos estilos de Mário e Oswald, só como exemplo. Porém, como definir a disseminação da cultura e do entendimento se ele, Juó, através de suas obras, não se fazia entender totalmente por todos?

Essa questão explica o vício criativo, mas não germinativo, de Juó, ao tempo em que explica porque os escritores modernistas trabalharam com precisão e juízo a questão linguística e estética em suas obras, modernizando, criando o "novo", sem destruir as bases do entendimento nem tergiversar a cultura nacional. Tanto isso é claro e notório que são raríssimos os livros didáticos de literatura que fazem alusões ou procuraram trabalhar a obra de Juó.

Compreende-se de tudo isso, do processo criativo de Alexandre à concepção dos escritos de Juó, que faltou a este último um veio de nacionalidade, de amor a pátria, de identificação com o Brasil. Ao atrelar a linguagem deturpada a uma figura caricata criada a partir do imigrante europeu, Alexandre ganhou as armas e a coragem de combater de forma controversa os ditames culturais e políticos daquela época; contudo, a máscara que usava para tanto acabou lhe negando um reconhecimento redundante da crítica, da sociedade e da posteridade.

Organo Independento do Abax´o Pigues i do Bó Retiro.

Prorpietá da sucietá anonima Juó Bananére & Cumpania