Resenha sobre o Livro Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley
Resenha sobre o Livro Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley
Visão Panorâmica do Momento Histórico
O século XX, de acordo com alguns historiadores, é considerado o mais terrível século de toda a história registrada pelo homem. A razão maior que lhe cabe este título são as inúmeras guerras que cobriram de destroços e sofrimento a passagem do homem por esta parte do tempo Cristão. Num primeiro momento, tal afirmação parece estranha quando colocamos os eventos do século passado em comparação com épocas como a Idade Média, ou a conhecida Antiguidade Clássica, que também foram marcadas por violentas guerras. Entretanto, a medida maior que torna o século XX uma mancha tão insolúvel e uma ferida tão profunda da história humana está no desenvolvimento da tecnológica bélica.
O horror toma conta dos corações daqueles que pasmam diante tantas atrocidades. E a cada época, novas justificativas surgem para condicionar a mentalidade da população, que apesar de ser a maioria, não consegue reagir. O século XX chegou ao ápice da incerteza da vida após a morte, e ao mesmo tempo, a ciência mentiu a devoção que os Iluministas esperavam, e já não mais acolheu os homens como mãe, quando utilizados os potenciais do universo contra o próprio universo. O homem descobriu o caminho cada vez mais eficiente de manter nações inteiras sob controle, utilizando o medo. E foi com medo que muitos atravessaram suas vidas, e não viveram, simplesmente puderam vê-la passando diante dos seus olhos, impassíveis, sem reação.
Neste cenário, a arte perde a cor, porém não perde o brilho. Cinza, vermelho, preto, estas parecem ser as cores predominantes num cenário onde as cidades expandem incontrolavelmente, juntamente com a multiplicação dos habitantes terrestres. Quando se lança um olhar panorâmico, vê-se nitidamente a Primeira Grande Guerra, a Segunda Grande Guerra, as intermináveis guerras civis Africanas contra o neo-colonialismo, os conflitos entre Japão e China, a questão da Índia contra o império britânico, a Guerra Fria entre as potências EUA e URSS, que embora as baixas sejam ínfimas à guerra tradicional, houve o dilaceramento da liberdade do homem, trocada pela estupidificação do homem.
Homens, artistas, surgem como profetas do inevitável, assumem uma posição de denúncia, e até mesmo anúncio de um futuro terrível, um caminho sem volta, como se cantassem o túmulo que nós mesmos cavamos pela excessiva ganância. Homens já desacreditados do homem.
Visão Panorâmica da Obra
Aldous Huxley nos apresenta o seu Admirável Mundo Novo, um arquétipo da Londres que, nos anos 30, ele tentou prever, baseado nas direções científicas e sociais que observados em sua época.
O espaço é em Londres, no ano de “our Ford 632”, algo por volta do ano de 2540 no calendário Gregoriano. A maioria da população é unificada sob os princípios do Estado Mundial (World State); o Estado Mundial é uma sociedade global, que provê recursos em abundância, cujo ideal é alcançar felicidade plena para todos.
A sociedade é dividida em castas, denominadas Alfas, Betas, Gamas, Deltas e Épsolons (em algumas versões, Ípsolons), e cada categoria social possui as suas atribuições e defeitos próprios. Por exemplo, nos Alfas existem ainda a divisão em Alfa Dois Mais, ou Alfa Menos. Todas estas castas tem as suas funções sociais já condicionadas no início da vida, no Centro de Incubação e Condicionamento de Londres, uma espécie de laboratório, que hoje, poderia ser comparado aos laboratórios de inseminação artificial. Entretanto, há uma ressalva.
O que se faz no espaço onde toda a vida humana de Londres tem início é, interromper o seu curso natural, antes mesmo que a pessoa crie vontade própria. Através de impulsos externos, captados pela inteligência cognitiva dos bebês, são impostos os seus gostos, os seus medos, os seus desejos, e até mesmo as suas capacidades. A partir daí já se tem determinados desde o berço qual a função social de cada pessoa nascida, sem lhes dar a chance de escolher um caminho próprio. Apesar das diversas castas, a narração se foca apenas no convívio social entre os Alfas, que são consideradas as pessoas mais privilegiadas da sociedade, tal como a classe elitista da Londres de Huxley.
Há resenhas afirmando que Admirável Mundo Novo era uma crítica às teorias behavioristas de Skinner, as quais Huxley eleva ao extremo e no desenrolar da narração nos mostra a quão falhas elas seriam. Classificado como um romance anti-utópico, ou, distópico, Huxley descreve uma sociedade completamente indiferente à esta condição de determinismo pelo meio, preocupada apenas com o trivial, o prazer próprio.
Inevitáveis comparações entre esta obra e 1984 de Orwell remetem às suas oposições que pretendem demonstrar um mesmo caminho; uma vez que os cidadãos de 1984 são dominados pelo medo, os de Admirável Mundo Novo se deixam dominar pelos prazeres triviais que Londres produz com tamanha abundância. Desta forma, num estado de plena felicidade individual (resultado do pensamento vitoriano), não haveria motivos para se preocupar com questões como o caos social reinante nas outras sociedades. Além do mais, Huxley usa o gancho da crítica à Skinner para captar a trilha pela qual a sociedade Londrina caminhava. Assustadoramente a obra nos incita a fazer constantes paralelos com a sociedade atual.
As personagens são fúteis, indiferentes aos problemas alheios, e repulsas às culturas diferentes. A religião, o casamento, a concepção por meio naturais (relação sexual) e a família são completamente repudiadas por esta sociedade. São devotos do Fordismo, e seu calendário é divido em Antes de Ford e Depois de Ford.
O sexo é visto de uma forma totalmente banalizada, visando apenas o prazer, independente de sentimentos, pois para esta sociedade, o amor não existe mais. O que Huxley nos mostra é a nuvem da plena indiferença que paira sobre uma sociedade que questiona aquele que questiona. Enquanto Orwell teme a destruição da informação, Huxley teme que o excesso de informação atinja um nível de banalização total, tornando-se irrelevante.
Um Breve Resumo da Obra
O personagem Bernard Marx sente-se insatisfeito com o mundo onde vive, em parte porque é fisicamente diferente dos integrantes da sua casta. Num reduto onde vivem pessoas dentro dos moldes do passado uma espécie de "reserva histórica" - semelhante às atuais reservas indígenas - onde preservam-se os costumes "selvagens" do passado (que corresponde à época em que o livro foi escrito), Bernard encontra uma mulher oriunda da civilização, Linda, e o filho dela, John. Bernard vê uma possibilidade de conquista de respeito social pela apresentação de John como um exemplar dos selvagens à sociedade civilizada.
Para a sociedade civilizada, ter um filho era um ato obsceno e impensável, ter uma crença religiosa era um ato de ignorância e de desrespeito à sociedade. Linda, quando chegada à civilização foi rejeitada pela sociedade.
O livro desenvolve-se a partir do contraponto entre esta hipotética civilização ultra-estruturada (com o fim de obter a felicidade de todos os seus membros, qualquer que seja a sua posição social) e as impressões humanas e sensíveis do "selvagem" John que, visto como algo aberrante, cria um fascínio estranho entre os habitantes do "Admirável Mundo Novo".
Aldous Huxley escreveu, mais tarde, outro livro, chamado Retorno ao Admirável Mundo Novo, sobre o assunto: um ensaio onde demonstrava que muitas das "profecias" do seu romance estavam a ser realizadas graças ao "progresso" científico, no que diz respeito à manipulação da vontade de seres humanos.
Bibliografia
HUXLEY, Aldous, Admirável Mundo Novo. 1ª Edição. Tradução de Lino Vallandro. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2009.
CEVASCO, M. L.; VALTER, L. S. Rumos da Literatura Inglesa, 1985. São Paulo: Editora Ática. Série Princípios, Volume 11.
HOBSBAWN, E. J. Da revolução industrial inglesa ao imperialismo. 5ª ed. Tradução de Donaldson Magalhães Garschagen. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 2009.