SEARA LIZA, A TEMPESTADE

SEARA LIZA, A TEMPESTADE

Seara LIza Tempestade, mulher elegante e sorridente, apareceu certo dia na Horta Comunitária. Percebi logo que se tratava de uma sulista por causa do inconfundível sotaque bem carregado. Fez questão de ser muito simpática, interessada nas plantas, especialmente nos condimentos e nas ervinha para chás, já que é também uma profissional da área de saúde.
Morava sozinha em um prédio de apartamentos perto da Horta. Certa vez, veio me dizer que ia viajar por dois meses para visitar familiares no sul.
- Estou com um problema e quero saber se tu pode me ajudar? - perguntou.
- Se estiver ao meu alcance...
- É que não tenho onde deixar minhas plantas. Tu poderia cuidar delas para mim?
- Bem, se não forem muito grandes. Você sabe, temos pouco espaço, respondi.
- São apenas alguns vasinhos. Faz pena deixá-los morrer. Vou doar as orquídeas para uma amiga, esclareceu ela.
E trouxe quatro ou cinco vasos médios bastante maltratados pro excesso de sol e falta de adubo.
Fiquei sensibilizada ao ver uma linda flor roxa que estava moribunda e tratei de cuidar dela primeiro. Por sinal, acabou se tornando uma das flores mais belas da horta, chamando a atenção dos visitantes, de imediato.
Tempestade sempre aparecia do nada; às vezes pela manhã, outras no final da tarde ou, ainda, aos domingos para visitar a horta, oferecer algum vasinho que não mais lhe servia, levar uma ou outra mudinha, trocar algumas idéias sobre as plantas. Não sei por que razão, mas sempre a olhei com certa cautela. Talvez tenha sido pelo fato de que nunca falava de si mesma, mantendo a conversa na superficialidade. Às vezes, me dava a sensação de estar sendo fiscalizada.
Pessoas que se dizem amigas, mas não contam suas vitórias e seus fracassos, não são de todo confiáveis – pensei.
Certa manhã, fui cientificada de que ela estava me aguardando na rampa de acesso `a casa. Procurei atendê-la o mais rápido que pude. Bem vestida em estilo executivo, cumprimentou-me apressada e, apontando para a sua camioneta 4X4 Delux, foi logo informando:
“Eu trouxe uns vasos grandes de barro que sobraram porque resolvi acabar com todas as plantas da minha varanda. Vê se te interessam”.
- São bonitos e bons. Quero sim. Mas você sempre gostou tanto das plantas... o que houve?
“Não tenho mais tempo nem paciência” – informou.
Chamei Lady e nós três fomos retirando-os da carroceria do carro da visitante, enquanto ela dizia azeda:
“Olha, quero te dar um conselho: se teu novo vizinho não quer as plantas lá na frente da casa dele, tu não deve fazer nada. E não divulga mais o que o pessoal anda dizendo dele. Isto dá até processo por calúnia. Quem avisa, amiga é”.
- Acontece que as ervas medicinais raras em terreno público não podem ser sacrificadas para fazer calçada. É proibido. Estou apenas divulgando o sentimento das pessoas sem identificá-las. Tenho obrigação como administradora ...
- Não posso ficar mais... estou atrasada. Volto outro dia.
Fiquei chocada por vários dias.
Não voltou.

Dona Tempestade virou a casaca
Soldado obediente, (ou é o contrário)?
Que mal a ti fez a perfumada alfavaca
Para que a cobrisses com um sudário?

Nós(ela e eu)  e tu estamos em extremos;
Se lambes teu protegido amigo e seus fícus,
De vocês maior distância nós queremos.

Sandra Fayad Bsb
Enviado por Sandra Fayad Bsb em 22/11/2009
Reeditado em 14/04/2022
Código do texto: T1936968
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