O leão desperta: a inesquecível tarde de Edilson
O leão desperta: a inesquecível tarde de Edilson
Naquele calor abrasante de uma tarde típica do sertão pombalense, o campo do São Cristovão fervia não apenas pelo sol escaldante, mas pela expectativa. Era década de 1970, e o jogo amistoso prometia ser um espetáculo. O Botafogo da Paraíba, mesmo com uma formação pré-temporada e sem os jogadores titulares, trazia consigo o peso da tradição e o respeito que apenas os grandes clubes do estado carregavam. Do outro lado, o São Cristovão de Pombal, consciente do desafio, havia se reforçado com três talentos inquestionáveis da Sociedade Esportiva Sousa: Chico de Dalva, o gigante da zaga; Zamba, o maestro incansável do meio-campo; e Edilson, o atacante conhecido tanto pelo brilho quanto pelos gols.
A torcida fervorosa não parava de entoar gritos de apoio e de ansiedade. A bola rolou e, já no primeiro tempo, o Botafogo mostrou o que veio, abrindo o placar em uma jogada rápida que surpreendeu até o mesmo o dono da zaga, Chico de Dalva. O 1 a 0 ecoava como um golpe duro para o São Cristovão.
Mas o que inquietava mais a torcida não era o resultado, e sim a apatia de Edilson. Ele parecia distante, displicente, acanhado, fora do jogo. Aos poucos, a paciência do público foi se esgotando. No intervalo, como não havia vestiário, os jogadores descansavam ali mesmo, à beira do alambrado, em meio ao murmúrio dos torcedores que não disfarçavam o descontentamento.
“Edilson, cadê o teu futebol, homem?”, resumiu um, com o olhar repleto de incredulidade. Outro, mais audacioso, arriscou: “Esse é o Edilson da Sociedade? Tá com a cabeça em outro lugar!”. A situação era desconfortável. Zamba e Chico tentaram dar uma força ao amigo, mas o brilho nos olhos de Edilson já começava a reacender. Quem o conhecia sabia: não se provoca o leão sem esperar uma resposta feroz.
O segundo tempo começou. E, com ele, uma transformação inesperada. O campo, que antes parecia dominado pelo Botafogo, agora se inclinava na direção ao São Cristovão, impulsionado pela fúria de Edilson. Em poucos minutos, ele começou um show por que seu nome era sinônimo de genialidade e imprevisibilidade. A cada toque na bola, a defesa do Botafogo se desorganizava, como se tentasse parar um vendaval com as mãos.
O primeiro gol saiu em uma lance de pura malícia: Edilson recebeu na ponta, fintou dois defensores e tocou com a frieza de quem já sabia onde a bola deveria ir. O estádio explodiu. Mas ele não parou por aí. Minutos depois, aproveitando um cruzamento perfeito de Zamba, Edilson subiu mais alto que os zagueiros e, com uma cabeçada certa, virou o placar. O estádio estava em êxtase. As críticas transformaram-se em gritos de entusiasmo.
A avalanche não cessou. Edilson estava possuído por um espírito imbatível. No terceiro gol, em um contra-ataque, deu um drible desconcertante no zagueiro e, em seguida, no goleiro, deixando-os no chão, e com a calma de um artista diante de sua obra-prima, apenas empurrou a bola para redes as vazias. O quarto e último gol foi uma pintura: ele partiu do meio-campo, deixando para trás todos os marcadores, como se fossem simples sombras em seu caminho, e fechou a conta com um chute forte, seco, no canto direito.
Aqueles que antes o criticavam estavam agora de pé, com os olhos marejados pela incredulidade do que testemunhavam. Os gritos de "Edilson! Edilson!" ecoavam no campo, como se o próprio sertão estivesse rendendo homenagem ao seu talento. No fim, o São Cristovão venceu por 4 a 1, e o Botafogo, mesmo com experiência e tradição, não conseguiu resistir ao furacão que Edilson se tornara.
Quando o apito final soou, muitos se perguntaram como aquele homem, criticado e duvidado minutos antes, havia virado o jogo com tamanha maestria. Mas para quem já o havia visto em seus dias de glória, aquilo era apenas mais uma tarde em que Edilson lembrava ao mundo do futebol que ele, quando inspirado, era simplesmente imbatível. E assim, sob o sol ardente e os olhares atônitos, a lenda de Edilson cresceu mais um capítulo, inscrita para sempre nas memórias de Pombal e de todos os que tiveram a sorte de presenciar aquela partida histórica.