O CRIME QUE VIROU MANIA

O CRIME QUE VIROU MANIA

Certamente AGOSTO é, para muitos, mês de desgostos... estou entre os que creem nisso e sigo o mês inteiro temendo alguma surpresa indigesta. Pois neste ano de TREVAS, graças ao "bolsonarismo", amiga de longa data me traz notícia alvissareira: existiu um texto meu sobre Capoeira, lá por 1994, que merecia ser reeditado. Com um pouco de sorte, talvez eu o tenha enviado à revista MUZENZA... mestre "Burguês" nos mandou 3 ou 4 lotes, às suas custas, num total de 130 ou 150 revistas. Afora umas 10 ou 15 que vendemos na Praça da República (em Belém) para custear as passagens de ônibus ou um outro "chope" (sorvete em saquinho, o tal "sacolé" carioca) as demais foram doadas para grandes bibliotecas, boa parte para Universidades. Na da UFPA tive ligeiro dissabor, devia ser agosto, com toda certeza... apresentei à jovem secretária 19 exemplares da revista, entre os nºs 1 e 25 ou 30, já nem lembro mais. Replicou, sem tremer:

-- "Só poderia EXPOR quando eu completasse a coleção" !

Saí da hemeroteca, no tal "Vadião", com a sensação de que elas iriam todas "pro lixo" ! Era 1993/94, o prestígio da Dança-Luta em Belém era quase nenhum. Com praticamente todas as portas de Órgãos oficiais fechadas, pouco ou nada conseguíamos. (*1)

Tento agora "recuperar" alguns escritos daquela época (de 1987 a 1995) e vejo que quase tudo se perdeu. Publiquei algo pelos jornais Diário do Pará e no O Liberal, embora relutasse, eram textos "reacionários", estava eu numa "desconstrução" da prática, numa visão crítica que o leitor comum poderia não compreender inteiramente. Além disso, haviam as "diferenças regionais" que eu desconsiderava na análise, o eixo Rio-SP-BH tinha outro ritmo, a expansão se dava pelo método da Capoeira Regional "herdada" de mestre "Bimba", objetivando uma massificação dela. Belém atuava ao jeito da Angola, "Capoeira de segredos" ensinada com discrição e para poucos, até porque Escolas (públicas ou mesmo particulares) e academias recusavam a modalidade.

Restavam os Centros ditos Comunitários, que a aceitavam "por esperteza", interesse com aspas, pois o ensino dela mantinha abertos esses "mausoléus" sem coisa alguma, sem uma cadeira ou mesa sequer, nem uma TV velha de 50 reais, um jogo de dominó ou dama de 3 ou 4 "vinténs". A Capoeira, atividade diária (ou quase isso) sustentava-lhes a aura de Entidade vital à Comunidade, quando na verdade "só renasciam" a cada ano e meio, justo em época eleitoral.

Isso são "águas passadas"... boa parte dos prédios fechou, outros locais viraram CRAS e a Capoeira deixou "DE ESCONDER-SE" a partir do ano 2000. Ao criarmos em 1988 o CCCP -- que nem foi idéia nossa, de meu irmão e eu -- partimos de uma premissa equivocada, usamos para comparação de nível de qualidade a Capoeira do Rio "da Zona Sul", que se expandia desde os anos 60... ou bem antes, até. Em Belém vigorava -- creio que ainda resista -- mentalidade que vê com bons olhos (?!) qualquer pessoa QUE ENSINA, qualquer mesmo. Isso dá margem a todo tipo de "curioso", que aprendeu pouquíssimo da atividade, ensinando com boa vontade o que (pensa que) SABE e sendo chamado de MESTRE pela comunidade e por seu alunado.

Vindos de uma Capoeira onde os ditos Mestres estavam no auge de suas formas técnica e física, esbanjando talento, nos deparamos em Belém com os dois nomes maiores dela jogando pouco, tocando mal e sem cantar nem encantar... (eu nunca os ouvi !)... pior, NEM ENSINAVAM em 1990, deixavam tal trabalho para "terceiros", faturando prestígio sem esforço algum. Entrevistei-os em março ou maio de 1989... chegaram "verdes" em Belém, entre 1974 e 76 (nem tais datas são confiáveis, mesmo declaradas por êles) e aqui fizeram fama, tendo suas supostas "estórias de vida" sustentadas por antigos alunos. (*2) Sei O QUE ME DISSERAM, embora a fita cassette C-60 não exista mais, foi-me "exigida" por um deles, para seu "acervo".

O "crime que virou mania" -- título de artigo positivo publicado pela revista "Sua boa Estrela", da Mercedes Benz, em 1992 eu acho -- está agora no Mundo inteiro e vai bem em Belém com certeza, ensinado hoje POR MESTRES de gabarito, excelentes professores nos anos 90, a maior parte deles. Que continuem assim, é o que espero ! SALVE, Capoeira !!!

"NATO" AZEVEDO (em 10-11/agosto 2022, 4hs)

OBS: (*1) - aliás, a presença dos 2 grandes nomes dela ensinando na UFPA precisa ser analisada a fundo, sem fanatismos toscos nem "redirecionamentos".

(*2) - seria a tal SEMI-VERDADE, citada em ensaio sobre a Capoeira em São Luís, desde os anos 60. Aliás, pelos jornais de Belém da época (1987/2005) há 2 "versões" da chegada de um deles, mais um vídeo recente, com uma nova "estória".