FATORES QUE AFETAM O DESEMPENHO E A SAÚDE DE FUTEBOLISTAS PROFISSIONAIS: UMA APRECIAÇÃO À LUZ DAS CIÊNCIAS FISIOLÓGICAS
 
     O profissional do futebol, representado na figura do jogador, é antes de tudo um organismo vivo sujeito a uma série de eventos fisiológicos que podem provocar oscilações biológicas tanto positivas quanto negativas no desempenho de suas funções vitais. Isto ocorre devido a um fenômeno denominado de adaptação, oriundo dos mais diversos estímulos podendo ser de origens externa e interna (WEINECK, 2005). O futebol como fenômeno social, talvez seja o esporte mais praticado no mundo e com maiores adeptos também, gerando emprego formal e informal que envolve milhões de cifras. Segundo a FIFA( Federação Internacional de Futebol Association, 2013), este esporte hoje conta com 209 Federações afiliadas, 06 Confederações e centenas de milhares de jogadores em diferentes categorias organizados em clubes oficiais. Talvez a expressão, o esporte das multidões encontre nesses números sua razão de ser, apenas levando-se em consideração seus praticantes.

     O espetáculo proporcionado pelo futebol profissional é qualquer coisa extremamente impressionante. Entretanto, este espetáculo possui um custo benéfico muitas vezes antagônico e contraditório em relação as suas necessidades peculiares. Como já frisado no inicio desse texto, este indivíduo jogador possui papel central na arena de jogo. Do ponto de vista das regras que regem este esporte, nada mudou ou quase nada significante aconteceu ao longo desses anos ( A Fédération Internationale de Football Association foi fundada em 21/05/1904, na França), porém, do ponto de vista da exigência motora e do condicionamento físico dos jogadores muita coisa sofreu modificações. Assim temos a fisiologia como ciência norteadora para a preparação física dos atletas competidores. Neste contexto, os esforços exigidos para a prática do futebol o caracterizam como um esporte de ações intermitentes e de alta intensidade, com períodos de descanso relativamente curtos. Isto posto, chega-se a uma primeira conclusão, a de que o futebol possui uma alta exigência de seus protagonistas (BOSCO, 1994; GOMES, 2008). As acelerações e desacelerações durante uma partida podem ultrapassar a frequência de 70 vezes, acompanhadas de mudanças repentinas de direção.

     Hoje sabemos que um jogador percorre entre 8 e 12 km em um jogo. A exigência fisiológica nos reporta a afirmar que isto possui um alto custo energético, o que necessita de medidas recuperativas e profiláticas para o completo restabelecimento dos atletas. Portanto, a questão da nutrição é um ponto que não deve ser negligenciado, necessitando de apoio especializado no campo nutricional esportivo por um profissional da área. Atrelado a isto, surge um quadro preocupante e perigoso, a desidratação. Um jogador pode perder de 2,5 a  5 kg de peso corporal durante uma partida em aproximadamente uma hora sob condições quentes e úmidas, sendo esta perda resultante essencialmente através do suor. Na prática isto pode ser compreendido tendo como exemplo uma perda  em torno de 3% apenas de peso, significaria uma diminuição do desempenho de um jogador significativo. De 5 a 10% de rápida diminuição do peso corporal seria bastante sério e preocupante. Se levarmos em consideração as altas temperaturas ambiente e a baixa umidade do ar, como a que estamos atravessando agora no Estado do Ceará, esta situação poderá agravar-se perigosamente, pondo assim em risco iminenete a saúde e a vida do jogador ( BARROS e GUERRA, 2004; AOKI, 2004; McARDLE, 2005; GUYTON, 2011).

     Um fator que poderá contribuir negativamente para o agravamento desse quadro de desidratação é o repouso inadequado ou uma sequência de jogos que não deixariam o organismo se restabelecer, uma vez que a velocidade de reposição hídrica é menor que a perda contínua de líquidos. Desta forma, teríamos uma série de alterações metabólicas no organismo desse indivíduo (ASTRAND, 2006). Portanto, o calor, a perda de líquidos e sua reposição insatisfatória são fatores agravantes a performance e a saúde do atleta futebolista. Não raro, encontramos acidentes fatais não “esclarecidos”, envolvendo jogadores e temperaturas ambientes elevadas. O próprio corpo, aquecido pela atividade que está a desenvolver, pode gerar temperaturas internas que podem atingir facilmente a casa dos 41 a 42 graus Célcius, o que já representa um perigo à própria saúde, acelerando assim o processo de desidratação (McCARDLE, 2005).
 
                A possibilidade de um agravamento está na condição gerada deste quadro denominada de intermação. Vários sintomas como dor de cabeça, tonteira, náusea, suor profuso, confusão, marcha instável, colapso e perda da consciência, são indícios de que muita coisa vai mal. Se um tratamento não for feito imediatamente, poderá levar à morte do indivíduo, uma vez que na intermação, a temperatura corporal elevada aproximadamente dobra as taxas de todas as reações químicas, fazendo com que mais calor seja liberado (GUYTON, 2011).

            Um espaço de tempo em torno de 72 horas seria o ideal necessário para um bom restabelecimento hídrico do corpo, salvaguardando as individualidades dos jogadores. Deve-se lembrar também que um jogador em estado de desidratação está mais exposto a fadiga e consenquêntemente a uma baixa performance. Além do mais, as competições, apesar de representarem o ápice desta prática esportiva, ela envolve apenas uma fração do tempo dedicado a esta prática. As sessões de treinamentos físicos, são momentos importantes e decisivos na preparação das equipes, e isto exige um custo bastante alto que envolve gasto energético, hídrico, sais minerais e eletrólitos (BARROS e GUERRA, 2004).

            Somado a esta série de eventos fisiológicos podemos salientar outro aspecto tão importante quanto, a questão do estresse mental. Uma carga de cobrança por resultados positivos pode provocar um outro problema de ordem emocional, prejudicando sobremaneira o desempenho do atleta e podendo inclusive trazer complicações psicossomáticas ( MOOREN, 2012).

            Diante das implicações técnicas a respeito dos fatores que podem influenciar na performance e na saúde do jogador profissional de futebol, nenhum custo benefício seria tão bom quanto a preservação da vida destes individuos. A tomada de medidas preventivas no sentido de se evitar excessos desnecessários na programação de jogos seria uma ação tão importante quanto levar um espetáculo de boa qualidade às pessoas. Bom senso e inteligência nas tomadas de decisões por aqueles que dirigem o futebol seria fundamental para todo o sucesso de forma segura e democrática no sentido de uma participação mais humana e igualitária por todos os afiliados de uma Federação Esportiva comprometida com seus colaboradores.
Ricardo Lima dos Santos
 
 
Licenciado em Educação Física (1989)
Especialista em Treinamento Esportivo e Fisiologia do Exercício
Especialista em Métodos e Técnicas de Pesquisa
Especialista em Educação Física Escolar
Especialista em Avaliação da Performance Humana
Mestre em Educação em Saúde
Doutorando em Biotecnologia em Saúde
Ex-Treinador e Preparador Físico da Seleção Brasileira Universitária de Futebol
Ex-Treinador e Preparador Físico da Seleção Universitária de Futebol da Unifor
Ex- Preparador Físico do SUMOV Atlético Clube
 
REFERÊNCIAS
 
Aoki, Marcelo Saldanha. Fisiologia, Treinamento e Nutrição Aplicados no Futebol. Jundiaí, Fontoura, 2004.
 
Astrand, Per-olof et all. Tratado de Fisiologia do Trabalho, Bases Fisiológicas do Exercício. 4 ed. Porto Alegre: artmed, 2006.
 
Barros, Turibio e Guerra, Isabela. Ciência do Futebol. Manole, São Paulo, 2004.

Bosco, C. Aspectos Fisiológicos de la Preparación Física del Futbolista. Barcelona, paidotribo, 1994.
 
Gomes, A. Carlos e Souza, Juvenilson. Futebol. Treinamento Desportivo de Alto Rendimento. Artmed, Porto Alegre, 2008.

Guyton e Hall. Tratado de Fisiologia Médica. 12 ed. Elsivier, São Paulo, 2011.

McARDLE, William. Nutrição para o Desporto e o Exercício. Rio de Janeiro: Guanabara/Koogan, 2005.

Mooren, Frank C.; Völker, Klaus. Fisiologia do Exercício Molecular e Celular. São Paulo: Santos, 2012.
 
 
Weineck, Jurgen. Futebol total. O Treinamento Fisico no Futebol. Phorte, São Paulo, 2000.
           
 

 
 
Ricardo Mascarenhas
Enviado por Ricardo Mascarenhas em 01/09/2021
Reeditado em 13/09/2021
Código do texto: T7333217
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.