CAPOEIRA - MEMÓRIA COLETIVA
CAPOEIRA - MEMÓRIA COLETIVA
"Vou contar a minha história /
feita de imaginação..." (etc)
(início de ladainha, anos 70)
Em poucas palavras, se ninguém se mexer a História da Capoeira em Belém irá se perder... e PARA SEMPRE ! Se os que ainda têm um acervo dos tempos antigos dela na Capital não se unirem, até essa Memória concreta, real, de papel também virará "fumaça", porque em geral o Mestre de artes marciais -- da qual a Capoeira é parte -- não tem na família alguém que cuide de seu legado, da sua História e do material que guardou por décadas. Nem a viúva e muito menos filhos ou filhas (e netos) conseguirão ver valor naquilo, por vezes até detestam o assunto.
A História da Capoeira em Belém -- especificamente na Capital -- sendo de origem negra virá do Maranhão ou da Bahia. Documentos antigos nos informam que os escravos recusados pelos grandes centros nos 1750/60 -- por rebeldia ou pela compleição débil, físico raquítico -- eram enviados à província do Maranhão e Grão-Pará. Várias vezes protestou o governador Mendonça Furtado (e um parente dele, que o precedeu ou sucedeu) com a Capitania geral sobre a qualidade dos cativos mandados para Santa Maria de Belém. Optou êle então por "contratos" com indígenas locais, mas com igual insucesso !
O escritor Antônio Baena, através de seu "Anais da Província..." nos informa que supostos "capoeiras" (*1) atuando na Guarda real teriam fugido para o Amapá, após um "arrastão" em Belém, isso lá por 1759, não sei ao certo. De um modo geral, temos a presença da Capoeira em Belém dividida em 3 períodos bem distintos:
1) da fundação em 1616 até 1799, com raros registros dela em romances e crônicas oficiais, quase nada em jornais de antanho;
2) de 1800 a 1899, agora com a prática muito ativa, presente nas páginas de crimes dos jornais, em procissões e festejos populares e reconhecida como atividade temida pela Sociedade, concentrada na área central da cidade;
3) de 1900 para cá, já aceita por quase todos, com ídolos e admiradores e fazendo parte da vida da coletividade. De 1950 até nossos dias, se expandindo por diversos bairros e assistindo a chegada de instrutores de outros Estados.
Sempre "me incomodou" o conceito (?!) vigente em 1987/88 de que os dois nomes maiores dela na época a teriam TRAZIDO para Belém, entre 1974 e 76 (agora, talvez 1971 !), segundo suas palavras. A entrevista que ambos me concederam em março ou maio/1989 foi um "poço de decepções" (*2) e, a partir daí, decidi encontrar sozinho as raízes E ORIGENS da Capoeira praticada em 1990 em Belém. (*2) Passei perto de 6 meses na biblioteca do CENTUR consultando jornais de 1950 e 1960 -- só havia o "A Província do Pará", adiante surgiria a "Folha do Norte" -- e achei coisas interessantes: na época do Círio vinham para Belém Grupos de teatro e dança, principalmente da Bahia e do Rio, alguns com "capoeiras" entre os artistas. Estes quedavam por aqui após a partida dos demais membros, por semanas ou meses. Nem seriam necessárias suas presenças... a crônica "GINASTAS DA VALENTIA" do belo livro "Gostosa Belém de Outrora" nos relata os nomes de 10, doze ou quinze "ases da pernada", "BAMBAS" das rasteiras e cabeçadas atuando nos "Bois" e "Pastorinhas" dos bairros Jurunas, Condor e Umarizal.
Já naqueles primeiros dias de 1990 tinha eu o nome de um certo EDILSON, lá pros lados da Marambaia -- citado por "Rato" (Reginaldo), irmão dos também "capoeiras" "Búfalo" e... "Touro" ? -- além dos "sumidos" mestres "Marrom", no Guamá e de "Paulo Angola" (e "Ferro do Pé") na Sacramenta, pouco vistos em Rodas e Batizados. Pelo bairro da Guanabara tínhamos mestre "China" -- que teria vindo da Sacramenta (ou Guamá) em 1982 -- além de Nilton Barnabé e Antônio e seu irmão Gomes; no Marex, "Péba" e um Nonato, cujo aluno Robertinho, depois "Chaguinha", também ensinava, este "mestre de Angola, Regional, maculelê e Puxada de rede", segundo cartaz em modesta academia na Av. Almte Barroso. No famoso Jurunas estavam o famoso "Pica-pau", "Laíca" iniciando seu Grupo e Sérgio Nazaré, o "Zumbi" (que atuava com o c/m "Docinho" no DEFIDE, adiante DEAF), como morador do bairro, junto com Fernando Rabelo. Isolado no Bengui, mestre "Zeca", da ACANP, com aulas em colégio na Pedreira.
Em Icoaraci havia um bocado de gente, além dos 4 formados mestres em 1976: Waldeci(r), Adauto, Nonato e Nazareno ! Um certo "Louro" (negro) era do bairro, além de João "Mineiro" (ou "Pêlo", que lá viveu), um Alabama e mestre "Abíu", dando aulas no SESC-Doca entre 1986/90, assumindo Imar a partir daí. Desta mesma "Vila Sorriso" vêm "Pato" e Luiz Carlos, ambos ainda ensinando. Mestre Luiz Carlos traz à tona os nomes do "Brinco Dourado", de um certo mestre "Decente" mais o do "Pula-Pula", todos falecidos e que atuaram por lá.
Mestre Fernando Rabelo lembra-se do hoje famoso "Mundico" (agora com nome de... "Rai", não se sabe porquê) e de um tal de "Maranhão", este visto por êle nas temidas Rodas noturnas do Ver-o-Peso -- "só de cachaceiros e onde o pau rolava", conforme um relato recente, que felizmente FOI DELETADO -- e o magnífico cenógrafo Luiz Carlos Moraes (do SESC) me identificou em pracinha da Sacramenta o mestre que lá fazia Roda às 16 horas de um dia qualquer de 1988 ou 89: Walcyr ! Também daquela área mestre "Ferro do Pé", Paulo "Angola" e diversos professores que ensinaram na Fundação Curro Velho. Pelos lados do estádio "Mangueirão", a partir de 1995/96 creio eu, está vindo do SESC-Doca o me. "Caiçara".
Na área central de Belém havia o "Canhoto" na Jaderlândia e outros locais, Divanei no CEDENPA (por onde passou um certo "Carlinho", um espanto), no colégio ASPECTO o "Zumbi", na universidade classe A de ricos e famosos UNAMA um certo Pedro Paulo a ensinar Angola, dizem. Em São Brás estava Silvério, mestre bem antigo, da mesma época de me. "Sapo" (este no Una em 1990 e atualmente no Guamá), além do ultraconhecido e considerado angoleiro rastafári "BIRA", com escola no Marajó, a ilha.
Juntando "num balaio só" todos os que ensinaram por um tempo mínimo em alguns bairros temos... "Juca Bala", EDILBERTO, "Bimba", "Montanha", "Bug", "Besouro", Cléo ou Léo, "Faquinha", Nêgo", "Cidinho", 2 ou 3 Paulinhos, Josimar, Romildo, Nilo, Nonato (irmão de "Rai", já falecido), "Limãozinho", Nelson Guedes, Welton ou Wellington, "Cebola", "Jaspion", Michel, "Louro", hoje "L. Guerreiro" e MUITOS outros mais, cujos nomes "se perderam". De MULHERES, só ouvi falar em uma Nazaré (vinda do SESC), mais "Cigana" e "Catita", sem garantias de que efetivamente ensinaram algum dia. Ficam DE FORA os considerados "de fora", instrutores vindos de outros Estados, a partir de 1989/90, a começar pelo distinto e criativo Roberto Di Lello, atuando mais como "gerente" do ensino dela, embora eu o tenha visto como professor (?!) no Colégio Moderno e numa Academia fitness próxima do CENTUR. Viriam pouco depois 'Cobra Preta" -- creio que antes do prof. "Magrelo", excelente no ensino -- além do baixinho cheio de disposição chamado "Orelha", que até MMA local disputou... e o pouco visto "Pica-pau". Pela ANGOLA (em 1993 ?) chegaram o jovem mestre "Índio" e seu c/m "Carimbó".
Como se vê, É MUITA GENTE com histórias e MEMÓRIAS que precisam SER RESGATADAS... quem irá fazê-lo ?! (Como sugestão, juntem-se TODOS num feriado prolongado e gravem o depoimento de cada um, já é um bom começo !) E as fotos e reportagens, os convites, papéis diversos, lembranças, etc, DE CADA UM... se perderão quando morrerem ?! (Nem precisam DOAR NADA, basta fazer-se CÓPIA, gente !)
Na Terra Firme/Guamá já ensinavam em 1990 e poucos os professores "Brás", "Rai" (o primeiro, falo do nome !), "Jôu" (seria John ?), Marlon ou Márlio e um "Formiga... nem toco no que havia no campus da UFPA, onde passaram "meia dúzia' ou mais ! No então bairro de Marituba -- pertencendo a Ananindeua até 1994/95 -- havia um certo "Pantera", que poucos conheceram e o considerado mestre "Beto", além do hoje mestre Dilson Brito. Em Castanhal temos os eficientes mestres Joel, Leão e Falcão atuando desde 1982/83, com Orlando e um certo "Jacaré" -- meio esquecido pela História -- mais o famoso mestre Jairo, até o momento o introdutor (?!) do ensino naquelas paragens.
Aqui no bairro Cidade Nova (na época "dormitório" de Belém) estavam o mestre "Robertão" e seu c/m Gerson, os professores "SOM", "Cascavel", um certo "Jararaca", Rui "Pérola Negra" e seu irmão "Gato", "Junião", mestre Walter e seu c/m "Ori", além de um certo "Louro" (branco), já citado e do muito jovem "Geléia", no lugar do professor... que "patinava". Romão falava de um certo "Gão" (João ?) como aluno seu !
A HISTÓRIA DA CAPOEIRA em cada local, cidade, região, depende de uma MEMÓRIA COLETIVA, das recordações de quem acompanhou o Mestre por algum tempo, dos demais professores e Mestres de bairros próximos que com êle conviveram, de Entidades, colégios, academias e Federações pelas quais passaram e atuaram. Esses breves registros DE CADA UM precisam ser juntados como um "quebra-cabeça" para formarem a HISTÓRIA oficial e real da Capoeira em Belém & adjacências, sem mistificações nem fanatismos, atentos à presença efetiva de cada nome citado NO ENSINO de nossa Dança-Luta. Chega de "fantasias"... esta enorme relação não finda aqui, pelo contrário, é somente o INÍCIO de pesquisa que irá bom tempo para ser concluída.
"NATO" AZEVEDO (em 23-24/agosto 2021, 16hs)
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ADENDO AO TEXTO: a coisa que mais lamento em meus antigos escritos é o fato de que representavam o pensamento de meu irmão Renato, embora eu o endossasse e concordasse com êle. Mesmo assim, as opiniões eram radicais em excesso. São "águas passadas"... só me resta lamentar !
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OBS: (*1) "CAPOEIRAS" - interessados em "mão de obra" para seus Regimentos e para enfrentar rebeliões e Guerras dos 1800 -- esvaziavam-se as CADEIAS para isso -- tanto o Império quanto a Justiça da época definiam assim qualquer desordeiro ou arruaceiro, quase sempre negro, que iriam formar os Batalhões como "Voluntários da Pátria". Em sua obra De Campos Ribeiro separa bem os peritos na "Arte das negaças" (em Belém de 1905) do curioso comum, com poucas noções dela. A pesquisadora Paula Juliana Foltran Fialho em seu abrangente ensaio sobre as "mulheres-"capoeiras" de Salvador dos 1910/20 também faz esta distinção.
(*2) - conforme depoimento de J.R.S., ao chegar em Belém em 1976 encontrou aqui um certo Carlinhos, vulgo "mestre Babel". Em nosso bairro tinha êle amigo negro que me exibiu em 1990 seu cartão... "mestre MARINHO". Já do outro famoso me veio este relato: "conheceu em seus primeiros dias aqui, na praia de Icoaraci, um Lourival -- que o ensinou a fotografar -- atividade que o manteve por um bom tempo. Curiosamente, não há 1 FOTO sequer do mestre, naquela época, exceto o que está em jornais.
(*3) - Ouvi falar sobre várias teses, boa parte delas escrita por universitários da UFPA, que não sei se consultaram ou entrevistaram os professores de Capoeira ou Mestres citados nelas e se comunicaram ao mesmos as opiniões emitidas sobre êles, em seus trabalhos.
3.1 - sobre o nosso CCCP haveria uma tese de Maria Zeneide Gomes (da Silva ?)... como nunca me entrevistou, nem imagino o que possa ter escrito. Disse-me ela que eu... "além de saber onde morava, até a visitei"! Ainda que tenha ESQUECIDO seu endereço (e até sua casa, com móveis e pessoas nela) me seria impossível apagar da memória entrevista sobre o tal Centro, que efetivamente sequer EXISTIU !
3.2 - a criação do CCCP surgiu de uma reunião (em fins de 1987) na casa do prof. de Karatê Abílio Farias, (rua WE 45 ?) que seria aluno de Capoeira do Romão. Com este Mestre participei de reunião noturna num colégio público em São Brás (seria o "Santa Rosa ?) com mais 8 ou 10 "capoeiras", isso já em 1988 e que foi um "desastre" do começo ao fim. A idéia de fundar o Centro "morreu" ali... por volta de maio meu irmão e eu entendemos de recomeçar tudo, "do zero" !