CAPOEIRA: MEU MESTRE SABE TUDO! Parte 1 e 2
Parte 1
Mais um domingo maravilhoso (23/05/2021) numa Roda á beira do rio, com paisagem aconchegante". De repente lá pelas tantas, um graduado faz a Chamada de Angola no São Bento de Angola, o "chamado" recusa pegar e ele questiona a recusa, tendo como resposta:
"Porque eu não quis"!
Saem para novo jogo e ele repete a chamada e o cara pega. Finda a Roda eu falo com o graduado sobre a possibilidade de ele estar errado, pois só conheço chamada no toque de Angola. Ele me garantiu estar certo pois tinha a melhor fonte que é o mestre dele e para ele (o graduado) Angola e seus São Bentos é tudo Angola.
Repliquei que lá pelos anos 80 no Rio de Janeiro não se usava o São Bento da Regional nas Rodas (que só foi usado após mestre Camisa sair da Senzala), daí se jogar Regional no São Bento Grande da Angola. Sugeri a ele pesquisar outras fontes, mas sem chances:
"Se eu tenho a melhor fonte, para que vou procurar outra!
Presente na discussão outro mestre me atualisa:
Já estão usando Chamada no toque de Benguela!
Findo o evento já na casa de um amigo sou informado por ele através de vídeo da mais impressionante novidade: estão jogando Cobra Mansa e C..... e um deles faz a Chamada. Onda vai, onda vem, de repente sem mais nem menos, C....... da um salto mortal ajudado pela mão de Cobra Mansa. Se Cobra, conceituado, gabaritado, consagrado, está fazendo uma 10graça dessas, que dirá os menos cotados!
Ja passou da hora de nós os mais conceituados, sentar-mos e debater visando criar diretrizes que diminuam as deturpações que qualquer um pode fazer, já que todos nós somos donos da "Nossa" Capoeira!
Apesar desses anos todos na Arte, só neste domingo eu tive certeza do problema que é as rodas de rua no futuro da Capoeira. È nelas que eu vi todo tipo de invenção nefasta, agora massificada pelos "olheiros" fornecedores de conteúdo na NET. Urge aos organizadores de rodas, sejam em academias ou ruas, dizer sem receio:
Isto pode e isto não pode!
Pode parecer que eu sou contra Rodas de Rua, muito pelo contrário!
As Rodas que o Lua fazia eram uma verdadeira Salada Cultural ( o Lua sabia que a Capoeira atraía público) e os menos avisados que chegavam depois dos jogos, iam ouvir os beribas tocando Capoeira, mas rolando dentro da Roda, um Boi, uma Ciranda.
E eu falando em deturpação!
Em que momento na Capoeira se permitia inserir novos movimentos? Essa resposta é fácil:
Na Chamada ou Passo a Dois!
Chamado, você ía no pé do berimbau e voltava mostrando tudo e mais um pouco do que sabia e não duvido nada que alguém, na época, não tenha combinado com um amigo para ser chamado!
O que impedia um jogador de fazer esses movimentos num jogo qualquer?
Nada!
Correção: a língua dos invejosos!
Você viu o exibido? Só quer se mostrar!
Por isso o uso da Chamada, aonde não só pedia, como exigia você se mostrar!
Entendeu, Tadeu?
Nem eu!
Para piorar, (ou seria melhorar) após um Batizado concorrido na Senzala na época ( entre 1975 e 1980 ) foi feita uma disputa amigável entre os bambas, para ver os novos movimentos que fatalmente entrariam na Capoeira brevemente! Com a entrada dos hip hops na Capoeira certamente a Capoeira estará na tão sonhada Olimpíada, junto com a ginástica de solo é óbvio!
Oremos!
Godeme é para quem gosta!
Carioca
Opinião de quem vive nela:
Eu uso a chamada se é toque de Angola . Principalmente se o toque está bem amarrado . As divergências são muitas como é de costume na capoeira. Beber água na fonte é super necessário para entender ás subjetividades da chamada ou do passo a dois , ou ainda chamada para a mandinga . Do contrário o risco de fazer uma coisa desprovida de sentido é grande . A chamada é a mandinga dos angoleiros que tem mandinga .
Quem faz , sem saber fazer, está se expondo ao outro (*) e a sua própria arrogância...
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... eu ligo esses gestuais da capoeiragem em geral a nossa mãe África . Que está fazendo aniversário ! Existe hoje, e sempre existiu, um grande esforço em querer explicar certos aspectos de nossa cultura com uma visão euro-centrada . Penso no embranquecimento das capoeiras , e de uma hegemonia branca, que não cessa na busca de uma suposta origem da capoeira desprovida de África... posso ir mas longe, mas fico por aqui companheiro.
Axé!
Mestre GUARÁ, in 26/maio 2021.
(*) Possivelmente ele quis dizer:
Quem faz, sem saber fazer, está expondo ao outro a sua arrogância...
Meu Mestre sabe tudo!
Parte2
O menino Guaracy tirou a sorte grande de o Lua (hoje Lua Rasta) não ter demorado no Morro dos Cabritos, por que hoje ele não seria Mestre Guará, mas por causa do estrondoso sucesso do seriado Kung Fu, fatalmente seria: Mestre Gafanhoto!
Embora recém chegado no RJ (1978?) tive a impressão de que o Lua ja conhecia o Bebeto Monsueto no nosso encontro no Morro dos Cabritos.
Não demorou para eu entender que o objetivo do Lua não era ter alunos, mas sim, formar um grupo de artistas que fizessem Capoeira e outros Folclores!
Dei azar pois o Lua conheceu uma Suiça (Graziella) e aí virou um ioiô, indo e voltando do Exterior. Como era nosso contato eu não lembro, mas era ele chegar, eu aparecia. Aí ficava direto em Santa Tereza na casa dele, vendo-o fazer atabaques, berimbaus, pandeiros e caxixis. Quando não, saíamos para encourar atabaques em Academias, comprar couros no Curtume em Santa Cruz, ou comprar atabaques na Pavuna.
Deu aulas no IPCN (Instituto de Pesquisa da Cultura Negra) , na Academia de Klaus Vianna e fêz apresentações com o Jongo da Serrinha, completando com ir a São Paulo salvar o Teatro Oficina, Campanha do fantástico Zé Celso!
Oque o Lua sabia?
No início logo que cheguei, Capoeira, Samba de Roda e Maculelê, sendo o coreógrafo do Maculelê no Filme Cordão de Ouro com Nestor Capoeira! Não demorou nadinha para me mostrar Boi e Ciranda. Aí fomos fazer estágio no Morro da Serrinha para as apresentações de Caxambu sob o comando de Darcy do Jongo! Viajou novamente pro exterior só para participar de uma faixa no disco Favela. Como bom Bahiano devia/deve saber mais alguma coisa de lá, ja que participou do Grupo de Shows do Mestre Canjiquinha! Faltava a pá de cal e aconteceu quando ele descobriu uma Oficina do Augusto Boal ali pras bandas do Peru.
Danou-se!
A ave estava pronta para voltar para o ninho. Voltou e não demorou a recrutar os "malucos" , digo artistas que tornaram possível seu acalentado sonho. Coisas do Destino, o Lua não conseguiu formar seu Grupo de artistas no RJ, mas na Bahia vem "rebentando a bôca do balão" ha muitos anos com o fabuloso Bando Anunciador, cujo filme curta-metragem registrando esse trabalho foi premiado num Festival!
Com o coração partido eu choro pois não estou la, não faço parte dele.
Eu não consigo entender que diabos tem no murro de Jerusalém, que centenas de pessoas desejam vê-lo antes de "subir". Acredito que 9 entre 10 Capoeiras querem o mesmo em relação a Bahia.
Oque é que a Bahia tem, hein?
O que é que a Bahia tem....
Faço minha as palavras do Graduado de cujo Mestre sou Fã:
Com todo respeito, Meu Mestre Lua Rasta, sabe tudo e mais um pouco!
Capoeira de mestre lua - As sextas no Pelourinho - Completo
https://www.youtube.com/watch?v=4mdmM6OGILU
Fonte:
Ernest Bowes
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Link com fotos:
http://professorleiteiro.blogspot.com/search?q=lua+rasta
4ª- Chave de Ouro!
Estava de serviço, andando pela Presidente Vargas no RJ, 12,30 (1980?) quando encontro meu Professor o Lua Rasta! Ele me convida para ir a São Paulo, topo na hora. Fui no ônibus de janela aberta, vestindo camiseta sem manga e calça Lee. Cheguei lá resfriado!
A Missão era das mais honrosas possíveis:
Salvar o Teatro Oficina!
Ficamos na casa do famoso teatrólogo Zé Celso. Eu fiquei num quarto com um fanático da religião dos caminhoneiros, o Budismo! Ai 4-5 horas da madruga, o xiíta abre a janela e totalmente nu, na posição de Lótus virado para um invisível Sol, e com aquele rabão côr de maizena virado pra mim, começou sua monótona ladainha imitando o motor de caminhão: HUUUUMMMM, HUUUUMMMM, HUUUMMMM, interminável!
Passamos a manhã de sabado sem fazer nada e de tarde a mulher do Lua e Bebeto chegam. A noite nos dirigimos para o Ginásio Ibirapuera, aonde seria um Super Show com grandes nomes da MPB!
Já na ida para o ponto do ônibus, íamos tocando e cantando, animadíssimos para uma noite que prometia. Entramos no coletivo e reiniciamos o batuque. Pra quê:
O motora parou o ônibus e ameaçou:
Ou acaba o fuzuê, ou vai todo mundo pra delegacia!
Naquela hora caiu a ficha:
Eu estava em Sampa, a Terra da Garoa!
Já no Ibirapuera, enquanto o Show rolava para umas 5000 pessoas, nós e muitos outros, vendíamos posteres grandes e pequenos para a platéia. Não havia contabilidade, voçe pegava um tanto, vendia, entregava o dinheiro e pegava mais posteres. Aí, eu vi 2 ou 3 patifes embolsando parte do dinheiro e resolvi não "trabalhar" mais.
Foi a minha sorte!
Fiquei atrás do Palco e vi e:
Dominguinhos tocar, Pepeu Gomes, Caetano Veloso e Gilberto Gil cantando a lindíssima Oração Musical:
PRECISO FALAR com DEUS!
Fiquei com medo de fechar os olhos, tamanha a Interação-Elevação Espiritual que a musica me causou. Nisto Bebeto encosta e quem vai para o Palco:
ZEZÉ MOTA!
Zezé canta:
Tem Capoeira, na Bahia, na Mangueira!
Invadimos o palco com paus de Maculêle e batemos por cima dela, (ela ficou com receio) e na frente dela. Eram nossos 3 minutos de fama no Ginásio Ibirapuera! Saímos e fui pro vestiário tomar banho, (era quente) e dou de cara com Caetano e Gil a 1 metro de mim.
Não tive coragem de pedir autografo, mas depois apareceu Zezé Mota e eu consegui o dela! Não me lembro oque comi nestas 2 noites e 1 dia, só sei que na manhã de domingo amanheci com fome! Do jeito que eu estava comia até Cupim ao Môlho Madeira!
O céu de Sábado tinha sido totalmente cinzento e a manhã de Domingo da mesma côr! Paisagem de outro Planeta, Avenida de largura gigantesca, sem uma Viva Alma. Nem carro, nem gente. De cá, avistamos do lado de lá, um Bar PS, que serve PF! Não tinhámos vindo do RJ, para comer Prato Feito num Bar Pé Sujo!
Só tinha um Restaurante aberto e era Japonês! A vitrine era de cair os cabelos, tripas, galinhas e coelhos abertos na barriga e provavelmente "chupados" por um Vampiro, tamanha a brancura dos mesmos!
Entramos, só um senhor uns 45 anos, e um jovem uns 15 anos comendo. Sentamos na frente deles e a garçonete nos trouxe o cardápio. Lua escolheu a famosa YAKISOBA que no RJ seria Y-AKI-SOBRA!
Era ruim só de olhar quanto mais de comer!
Era uma água branca, provavelmente maizena, com uns matinhos verdes, talvez couve retalhada, sem tempero ou sal. Encostamos e Lua pediu outra, nº 98! Vieram uns canos de massa de Pastel e dentro uns macarrõeszinhos com carne moída, pingando um óleo avermelhado em abundância.
Sal e Tempero: Abaixo de Zero!
Comi porque, pra quem comeu uma rapadura inteira, aquilo era galho fraco!
Aí, foi minha vez de escolher: Entre 100 pratos, meia dúzia em português, pedi:
Carne de porco agridoce!
Cada pedido nosso demorava meia hora para ser atendido. Enquanto isso a dupla de mortos de fome chinesa ou japonesa, nunca se sabe ao certo, devorava tigelas e tigelas de comida!
Meia hora depois chegou nosso prato, feito com pedacinhos de carne de porco, e pedacinhos de abacaxi no suco de laranja e açúcar queimado!
Por isso o agridoce !
Na 1ª engolida, pensei que tinha tomado um sal de frutas, ou o famoso Sonrisal!
Quase vomitei. Chupei devagar os minúsculos pedacinhos de carne, mas meu domingo tinha acabado. Lua pediu a conta mas não queria pagar a yakissoba.
A garçonete disse que tínhamos mexido e era verdade, mas mesmo assim o Lua insistiu! Então, ela que era nordestina e falava chinês, chamou o cozinheiro. Desse eu não tive dúvida, era chinês mesmo!
Olhos bem abertos, 2 metros de altura por 1 de largura, 200 quilos mais ou menos.
Vinha com uma frigideirinha de ferro de 50 cm de circunferência, na possibilidade de ter que jogar tênis com nossas cabeças. Discute de lá, rebate de cá, Lua queria pagar com cheque do RJ. Chegou-se a um denominador:
Levamos a yakissoba para viagem!
Colocada na geladeira do "Zé" Celso junto a um tomate e meio saco de pipoca, a dita cuja resistiu 5 longas horas, (o tomate e a pipoca "tomaram Doril") hora em que saímos para o Teatro Oficina, sem que uns 15 zombies, que circulavam em sua volta, tivessem coragem e apetite para devorá-la. No Teatro Oficina lindas homenagens, culminando com o fechamento do filme "Rei da Vela" com os ícones dos tempos da Rádio Nacional:
Emilinha Borba e Marlene (na época, inimigas) agora cantando juntas esta magistral música:
Que meus inimigos tenham longa vida
Para verem de perto a minha vitória
E com razão, fazerem a louvação, da minha História
É a Lei que determina, Sou Povo, venho debaixo pra cima
Trabalhei e consegui lutar
Venci a maldade como um caracol
Para ver a Luz do Sol
Para ver a Luz do Sol!
Findo o espetáculo me arrumaram uma carona até a rodoviária. Na rodoviária a garota me deu um beijo de cinema, e olhe que eu nem a conhecia! Era umas 11 horas da noite e eu com a mesma roupa, camiseta e calça Lee. O ônibus da 1 hora era leito e eu só tinha dinheiro para o normal, às 3 horas da "madruga".
Enquanto eu estava no Teatro, iluminação de cinema, 30 pessoas em volta, logo entrei no carro, provavelmente motor quente, não senti nada! Mas, depois de uma hora numa rodoviária aberta, vento ártico soprando, comecei a congelar. Três dias de má alimentação, só de camiseta, 1 hora da manhã, já me sentia um pinguim.
A calça Lee estava sensivelmente dura por causa do frio! Aguentei até as 3 horas, mas não conseguia mais articular palavras, o queixo batia descontroladamente. Não deixei o preenchedor de bilhetes nem perguntar o meu nome, não ía conseguir falar mesmo!
Joguei minha carteira de identidade sobre sua mesa!
Adeus São Paulo, se um dia voltar, venho com duas malas:
Uma de roupa e outra de comida!
Vão comer mal assim, lá no Inferno !
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Neste link Lua conta como chegou no Rio de Janeiro e mostra boas imagens de um Show que fez em Burkina Faso!
A capoeiragem de um Mestre e o seu Bando Anunciador
https://www.youtube.com/watch?v=v3QiNycVEGM
Direção Gabriela Barreto
Produção Executiva Marijô Fernandez
Fotografia e Montagem Matteo Bologna
Realização Atelier Lua Rasta