Uma Noite Inesquecível
1985. Um ano em que todos os xavantes jamais esquecerão. O ano em que se tornaram respeitados e conhecidos pelo país inteiro.
O Bento Freitas já era conhecido por suas constantes lotações e por sua fanática torcida que jamais deixou de apoiar o time nos bons e também nos maus momentos.
Depois de voltar á ativa em 1975 após dois anos fechado devido a problemas financeiros e de se firmar no Campeonato Gaúcho nos anos seguintes – quem não se recorda da célebre invasão a Estrela em 1977 - o Brasil resolveu aventurar-se em disputas nacionais.
Em 1978, o Brasil não se saiu muito bem e no ano seguinte, fez uma campanha bem mais digna ao chegar a segunda fase do torneio com direito a uma vitória contundente sobre o Atlético Mineiro de Cerezo, Reinaldo e Paulo Isidoro por 2 x 1 no Bento Freitas.
Quatro anos depois, em 1983, veio o vice-campeonato gaúcho com Luiz Felipe Scolari de técnico e com um plantel que traria mais tarde um dos momentos mais marcantes da história do clube.
Esse mesmo plantel teve um bom desempenho no Campeonato Brasileiro de 1984 ao derrotar Cruzeiro, o próprio Flamengo e o Internacional no Bento Freitas com um gol de cabeça do Bira contra os mineiros e dois petardos do Chico Fraga contra o Mengo e o Colorado.
Mais tarde, o técnico foi-se para a Arábia Saudita e o plantel do Brasil segurou as pontas naquele segundo semestre de 1984 fazendo outra grande campanha naquele Gauchão, só perdendo o vice-campeonato para o Grêmio no saldo de gols e naquele empate de 1 x 1 no Bra-Pel do aguaceiro. Mesmo assim conseguiu carimbar a faixa do Internacional vencendo em pleno Beira-Rio, por 1 x 0 com outro gol do Bira.
Veio então 1985. O técnico era o Cassiá e o plantel havia sofrido algumas modificações em relação ao do ano anterior, mas permanecia competitivo.
Embora tendo uma primeira fase cheia de altos e baixos que culminou inclusive na queda do técnico Cassiá, o Brasil conseguiu ficar entre os 16 melhores, o que já era um resultado dos mais promissores.
Após a parada para as Eliminatórias da Copa de 1986 que se realizaria no México, nenhum torcedor imaginaria que aquele time do Brasil faria uma das maiores façanhas de sua história.
Era um grupo bastante complicado que tinha o forte Bahia, o imprevisível Ceará e o badaladíssimo Flamengo, detentor até então de três títulos brasileiros e uma das bases da Seleção Brasileira naqueles tempos.
Eu tinha 9 anos na época e me lembro bem daquele jogo contra o Ceará que terminou por 4 x 0. Foi três gols do Bira se não falha minha memória sendo que o último deles foi uma matada no peito e um foguete lá onde a coruja dorme.
Lembro-me ainda que todos já pensavam naquele jogo contra o Flamengo e tinha entre eles uma sensação de reparação de uma injustiça. Tudo por causa do primeiro confronto entre eles no Maracanã onde o Brasil perdeu por 1 x 0 graças a um pênalti polêmico.
Foi então que chegou o grande dia, melhor dizendo, a grande noite de 18 de julho.
Era uma noite fria como gelo e a torcida, como sempre, foi ao Bento Freitas em massa. Tão lotado que nem sequer cabia uma mosca.
João Luis; Nei Dias, Silva, Hélio e Jorge Batata; Doraci, André e Alamir; Junior Brasília, Bira e Canhotinho. Esse seria o time que poderia fazer história naquela noite.
E do outro lado um Flamengo cheio de astros de primeira grandeza tais como Andrade, Adílio, Bebeto, Fillol e principalmente Zico, que havia recém-voltado da Itália.
O jogo em si não foi fácil. Foi ataques de parte a parte com o Flamengo mostrando o porquê de ser um time tão respeitado e temido pelo mundo inteiro.
Até ocorrer o lance fatídico.
Era uma bola despretensiosa. O zagueiro poderia afastar ou atrasar para o goleiro ou até mesmo o próprio goleiro agarrar com segurança e repô-la em jogo. Porém um deixou pro outro, o outro deixou pro um e o Bira surgiu por entre os dois e a levou mansamente para o fundo do gol. Era 1 x 0 e a primeira parte da história estava sendo escrita.
O primeiro tempo terminou com alguma confusão e também com uma explosão maravilhosa de alegria. Afinal de contas, 1 x 0 contra o fortíssimo Flamengo já era de bom tamanho naquela situação.
O segundo tempo teve início e junto com ele, veio um verdadeiro bombardeio do Flamengo sobre a meta do João Luís. Chutes de fora da área, de dentro dela, cabeçadas perigosas e até mesmo uma cobrança perigosa de falta do Zico, um dos melhores do mundo na época nessa especialidade.
O Brasil aguentou tudo com maestria inclusive mesmo depois de Márcio entrar para fortalecer o sistema defensivo daquele time esperando o momento de dar o golpe certeiro.
E veio outra bola despretensiosa. Fillol estava adiantado demais para defendê-la. O Júnior Brasília não sei o que tentou fazer se foi chute ou cruzamento, mas a bola foi descendo caprichosamente para o fundo do gol. Era o 2 x 0 em um único golpe certeiro fazendo a torcida delirar de alegria e êxtase.
Assim que o jogo terminou, foi uma daquelas festas que a cidade de Pelotas praticamente parou para comemorar a memorável vitória xavante.
Era o modesto xavante derrotando o todo-poderoso Flamengo e abrindo caminho para se tornar um dos quatro melhores do país terminando em terceiro lugar naquele ano, um feito onde nenhum outro clube do interior gaúcho conseguiu igualar até hoje.
Naquela noite de 18 de Julho de 1985, á 30 anos atrás, foi um divisor de águas para o Brasil que se tornou conhecido pelo país inteiro graças a essa grande vitória.
E para um técnico que se tornou conhecido por ser o líder daquele inesquecível plantel, Walmir Louruz, que nos deixou recentemente.
Foi, sem sombra de dúvida, uma noite inesquecível.