Ser professor no país do “não sei, não quero saber”
Nos anos 30, o compositor Noel Rosa eternizou a expressão “Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe”. Quase um século depois, lamentavelmente, pode-se dizer que essa frase representa o sentimento de grande parcela da população brasileira diante da educação. Afinal de contas, o que se vê é uma maré de incultura devastando o país.
Basta dar uma rápida vista nos livros atualmente publicados, sejam brasileiros ou traduzidos; nos programas televisivos; nos ditos “influenciadores digitais”; nas músicas amplamente divulgadas em diversas plataformas, para constatar o cenário devastador: o tétrico definhamento da linguagem, da arte, da cultura, do raciocínio. Não raramente, vê-se pessoas soberbamente bradando expressões como “nunca ouvi nada sobre tal assunto”, jactando-se de forma que tal a crer que ignorância e autoridade são sinônimas. Esse quadro também é desenhado em muitos lares. Quantas vezes não se vê pais aplaudindo que seus filhos conheçam, por exemplo, toda a escalação de um determinado time de futebol, ou que suas filhas tenham decorado o repertório de certo grupo musical? Esses mesmos pais não se preocupam se os filhos conhecem as classes gramaticais ou conseguem realizar as quatro operações aritméticas fundamentais.
Na contramão dessa estrada, estão os professores. A sala de aula é o ‘locus’ do conhecimento, da reflexão, da disciplina. Aristóteles já dizia que a educação tem o objetivo de fazer com que o aluno goste e desgoste do que é certo gostar e desgostar. Porém, como atingir esse horizonte em um contexto no qual as pessoas tendem a amar o desprezível e desprezar o que merece ser valorizado?
Lidar diariamente com essa batalha é, no mínimo, cansativo. Oito em cada dez professores da educação básica já pensaram em desistir da carreira, como fora apontado pela pesquisa Perfil e Desafios dos Professores da Educação Básica no Brasil, divulgada no primeiro semestre pelo Instituto Semesp. O desinteresse e a falta de disciplina dos alunos são citados como alguns dos principais desafios desses profissionais. As consequências desse ambiente são sentidas na pele. Recentemente, uma pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com professores do ensino básico do Brasil e de Portugal sinalizou que a principal causa de adoecimento docente (53,3%) são os transtornos mentais comuns, como ansiedade, depressão e sofrimento emocional.
Os ‘frutos’ desse plantio não podem ser saudáveis. Estudos mostram que mais da metade dos estudantes de licenciatura abandonam o curso. Jovens professores deixam o lecionato em cinco anos de profissão. Se essa tendência persistir, em menos de duas décadas o deficit de professores da educação básica será um desafio muito difícil para o Brasil enfrentar.
Assim sendo, é imperioso cuidar da saúde mental dos professores, sejam eles da rede pública ou privada. Os que atuam por vocação devem ser estimulados ao aprimoramento profissional. Famílias e escolas devem promover o respeito e a admiração aos mestres e aos conteúdos por eles ministrados. Em meio a uma geração que se degrada no vazio, é urgente a promoção de uma educação virtuosa, que eleve o espírito humano aos mais sublimes patamares.