A geração nutella ou leite com pera

Homens fortes criam tempos fáceis e tempos fáceis geram homens fracos, mas homens fracos criam tempos difíceis e tempos difíceis geram homens fortes.

Provérbio Oriental

Todos os que estão pensando em ter filhos deveriam conhecer a frase de Aristóteles “A virtude está no meio.” Assim, tendo esta frase em mente, eles deveriam entender que não é bom ser negligente nem superprotetor, nem severo demais ou permissivo demais nem proibir demais nem fazer todas as vontades dos filhos. Quem quer ter filhos também tem que lembrar o que disse Flávio Gikovate sobre educar ser preparar para a vida, porque, para preparar bem os filhos, é necessário moldar o caráter deles, ensinando valores e ensinando-os a ser independentes e capazes de, um dia, poderem viver por sua própria conta, até porque os pais não são eternos. Infelizmente, hoje em dia, estamos vendo muitos pais cometerem o erro da superproteção dizendo que não querem que os filhos sofram ou que o mundo é cheio de perigos. Acontece que, se o mundo é cheio de perigos, os pais não podem usar isso como motivo para tratar os filhos como se fossem feitos de cristal e não tivessem condições de suportar as adversidades da vida e se reerguer após passar por decepções. E não querer que os filhos sofram é irreal. Não sabemos por que sofremos, acontece que sofrer faz parte da condição humana. Então, a preocupação maior dos pais deve ser tornar os filhos fortes para que se defendam dos perigos e lidem com os sofrimentos pelos quais vierem a passar, porque ninguém está livre de sofrer.

Antigamente, ao nos referirmos a filhos criados com mimos e regalias, com os pais superprotegendo e fazendo todas suas vontades, dizíamos que eram filhos tratados a pão-de-ló. Hoje, ao vermos tantos adolescentes e crianças mimados e criados cheios de facilidades, dizemos que é a geração nutella ou leite com pera. De toda forma, temos de concordar que nunca vimos tantos jovens e até adultos tão mimados e insuportáveis como estamos vendo agora. É uma geração de crianças, adolescentes e adultos mimados e superprotegidos que os pais tratam como se fossem pequenos príncipes ou princesas, cercando-os de cuidados exagerados, fazendo as vontades e tentando, a todo custo, evitar que sofram contrariedades. Qual será o resultado? Esses filhos, no futuro, irão sofrer para enfrentar pressões e problemas, porque os pais não os prepararam para o fato de que, no mundo real, ninguém tem a obrigação de se curvar às suas vontades.

Sabemos muito bem que a proteção exagerada deixa qualquer um despreparado. Um bom exemplo é o de uma moça a quem chamaremos Joseane*, que nunca aprendeu a andar de bicicleta porque os pais diziam que ela iria cair. Quando ela tinha doze anos, os pais achavam que ela não podia ir à escola sozinha nem ficar em casa porque a achavam inocente demais e diziam que ela poderia abrir a porta para qualquer um. E mesmo quando ela tinha quinze anos tinham medo que ela se perdesse na rua. Até hoje, essa moça é insegura. Além da superproteção, há o mimo exagerado. Muitos pais dão tudo aos filhos e nunca os corrigem, criando verdadeiros tiranos insuportáveis. E isso está se refletindo no sofrimento dos professores. Se os professores dão uma nota baixa ou uma bronca no aluno, os pais vão à escola reclamar com os professores em vez de corrigir os filhos. Já houve o caso de um adolescente de dezessete anos cujos pais, para salvar da reprovação, arrumaram atestado de déficit de atenção. Não se está negando que existam distúrbios de aprendizagem, só que é necessário que vejamos como os pais podem errar ao fazer de tudo para salvar um filho em vez de obrigá-lo a ter mais responsabilidade.

A superproteção está tanta que estamos vendo pais acompanhando até o quartel filhos que vão servir ao Exército, indo às faculdades reclamar com os professores porque os filhos tiraram notas baixar ou estão para ser reprovados ou não entregaram o TCC a tempo e fazendo questão de acompanhar os filhos em entrevistas de emprego. Pensemos nisso. Imaginemos os pais indo à faculdade resolver os problemas de um filho barbado que já vota e, com certeza, dirige o próprio carro ou então fazendo questão de estar presentes quando um filho ou filha que vai a uma entrevista de emprego vai falar com o entrevistador. Quem vai confiar na capacidade de alguém cujos pais acham que tem que falar por ele? Que tipo de profissional será esse a quem os pais sempre superprotegeram e fizeram de tudo para ter suas vontades satisfeitas? Irá aguentar quando o empregador reclamar de um trabalho mal-feito? Deve ser por isso que está cada vez mais comum vermos adultos infantilizados e que, mesmo se aproximando dos trinta, não sabem o que querem da vida.

Os pais precisam entender o seguinte: o futuro do mundo depende das pessoas que estamos formando hoje. Criar um filho envolve ensinar os valores da responsabilidade e do trabalho duro, impor limites, saber quando ser severo e quando deixar que o filho ande com as próprias pernas. Muitos filhos não lavam um prato ou dobram um lençol, especialmente os filhinhos de papai que estudam em escolas privadas, nunca pegaram ônibus lotados para ir às escolas e são criados dentro de bolhas, pensando que são especiais enquanto os pais os tratam como se fossem serzinhos especiais. Acontece que a vida, fatalmente, mostrará a esses principezinhos que a realidade é muito mais do que as bolhas em que foram criados. Tempos difíceis sempre vêm para todo mundo e quem sempre foi mimado sofrerá muito mais para enfrentar as intempéries da vida. Então, quem quiser ter filhos, precisa pensar muito bem em que ser quer formar.

Os filhos que estão sendo formados hoje serão os profissionais do futuro. Como alguém se tornará um profissional competente ou uma pessoa responsável e apta a lutar para encontrar seu lugar no mundo se hoje os pais tratam com todas as regalias e mimos?

*nome trocado para proteger a privacidade