Da Equalização de Oportunidades a Escola Prisão, como chegaremos nisso
Um modelo escolar, que implica na organização de tempos, conteúdos e objetivos para o ensino, é, antes de tudo, uma construção histórica e variada, correspondendo, em uma mesma época, a expectativas e demandas diferentes: a escola devocional, a escola preparatória para o ingresso dos filhos no ensino superior, a escola reservada para pessoas "nobres", a escola alfabetizadora e disciplinar para os pobres, etc. Todos esses exemplos são suficientes para nos mostrar como diferentes modelos escolares se organizam conforme objetivos e públicos distintos.
O modelo escolar democrático, isto é, aquele que, pelo menos em linhas gerais, deveria promover a equalização de oportunidades educacionais, onde, independentemente da origem social, as possibilidades de ascensão social não dependeriam tanto das condições financeiras e do capital cultural da família, se mostrou um modelo híbrido entre o ideal e o real, por isso indefinido quanto a suas possibilidades. A implementação desse modelo, operacionalizado pelas políticas educacionais, tem se revelado uma repetição de um velho paradigma, onde a educação destinada aos pobres se torna disciplinadora e pouco efetiva em termos de equalização de oportunidades, no máximo potencializando o trabalho já destinado às classes mais baixas em termos de renda e capital cultural.
No Brasil, mesmo essa função disciplinar tem falhado, e a continuidade nos estudos se sustenta pelo valor, ainda que modesto, do diploma no mercado de trabalho. O modelo escolar democrático ora parece utópico, por se mostrar, na prática, o mesmo de sempre; ora parece sabotado para que não cumpra a função de equalizar as oportunidades. Certo é que, à medida que essa equalização não se realiza e nem a disciplina é prioridade, visto que mecanismos tais como reprovação e expulsão de alunos são praticamente proibidos e evitados, o que se chama de modelo escolar democrático se revela como algo utópico.
A verdade que poucos querem admitir é que o que pode engajar o jovem nos estudos, e nos custos de tempo e energia que isso demanda, é a percepção da relação entre maior dedicação aos estudos e maior possibilidade de ascensão social. Concorre contra essa percepção a própria figura do professor, mal pago e desvalorizado socialmente, que, sendo o próprio exemplo de alguém que estuda e estimula os demais a buscarem o conhecimento, não serve como referência dessa relação.
Quantos jovens realmente consideram a relação entre o que aprendem e o melhor desempenho e perspectiva profissional? Se tal percepção não é evidente para eles, isso se deve ao seu imediatismo ou à experiência cotidiana de parentes e colegas que se formam e pouco melhoram de vida em relação aos pais e parentes que também se formaram.
Quanto desse conhecimento, capaz de aumentar as chances de ascensão social, é ensinado pela escola? Tal pergunta implica em como o investimento das famílias pobres e da escola pública é capaz de competir com a reprodução do capital educacional e cultural pelas escolas particulares e famílias cujas profissões representam alguma progressão em termos de status e renda.
Quando pensamos em demandas por profissionais qualificados, e supostamente melhor pagos e valorizados socialmente, temos que considerar o quanto de investimento educacional cada família é capaz de legar e investir em seus filhos, e também o quanto de pessoas com perfis já disponíveis para ocupar esses cargos ou se qualificar para eles estão disponíveis. A classe média chega primeiro, dado um acúmulo de vantagens e capitais culturais previamente legados. De forma mais simples, quando uma vaga altamente valorizada é disponibilizada, aqueles que já possuem os pré-requisitos podem rapidamente se qualificar para ocupá-la — e esses são justamente os filhos daqueles cujas posições de classe possibilitam a reprodução de seus capitais culturais e educacionais. Isso implica que os pais escolhem escolas, valores e diretrizes que permitam que os filhos sigam caminhos similares aos seus em termos de qualificação e profissão.
É notável que, nessa corrida desigual, a equalização de oportunidades parece um objetivo surreal ou mesmo ideológico, dada a distância entre o que se defende e como a realidade da desigualdade é estruturada. De tal forma que o ensino crítico e reflexivo pode parecer um mergulho no pessimismo para aqueles que já não vislumbram na escola uma possibilidade de melhoria. Há muitos "Dons Quixotes" na Sociologia da Educação que acreditam que o problema da educação no Brasil é maldade ou incompetência didática em massa de professores.
Esses vendedores de ilusão atendem, e atenderam, a uma perspectiva muito conveniente para as gestões educacionais, de justificar um maior controle por meio da culpa e do estabelecimento de mecanismos de vigilância e supervisão do trabalho docente. Deram a essa visão, pretensamente séria sobre a educação, o nome de "política de responsabilização", que pode ser melhor compreendida como "responsabilização do professor". Tal perspectiva trouxe recursos da ordem de milhões para certas universidades públicas, com venda de projetos educacionais e modelos de gestão empresariais. Pensar que as pesquisas públicas educacionais e seus bem pagos "messias" ajudaram a criar a tempestade perfeita para que modelos de escola-empresa e cívico-militares se valessem do caos e das ruínas do que não conseguiu se tornar uma escola democrática é, no mínimo, desolador.
São idiotas ou um misto de tecnocratas com ideólogos profissionais? Deixo para quem quiser se aborrecer buscar sua convicção.
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A escola para os pobres, que poderia corresponder a um modelo democrático e inclusivo, cujo fracasso foi tão bem delineado por nossos "Dons Quixotes" da sociologia da educação, tendo como alvo a "incompetência" e insuficiência de meios para punir, demitir ou contratar "melhores" professores, hoje se concretiza em projetos atuais de governos dos Estados de Minas Gerais e São Paulo, isso sem considerar o que muitos municípios já têm feito.
Basicamente, a ideia é terceirizar a contratação de professores por meio de parcerias privadas e organizar escolas inteiramente geridas pela iniciativa privada, o que implica repasses consideráveis de dinheiro público para empresas e organizações ligadas à iniciativa privada. O professor servidor público é deslocado para escolas que ainda não são de interesse dos planos público-privados do governo.
A simplificação de que a iniciativa privada pode realizar o trabalho educacional ao aplicar a lógica de mercado e de exploração da força de trabalho por meio de competição e risco de desemprego, a ponto de equalizar oportunidades educacionais, ou pelo menos se aproximar mais disso que o modelo democrático, de forma alguma inviabiliza as transmissões de vantagens de classe na aquisição de capital cultural e educacional, assim como os pré-requisitos que os colocam sempre à frente quando demandas surgem.
Não havendo essa equalização nem a melhoria dessa percepção da relação entre estudo e ascensão social, o que fará necessariamente tal modelo senão qualificar mão de obra sem necessariamente aumentar as chances de competição por trabalhos e profissões mais valorizados?
Se não se realizar, pelo menos no nível ideológico, tal promessa de que a lógica de mercado aplicada à educação vai gerar essa equalização, a solução via modelo cívico-militar já estará à disposição.
Em um modelo cívico-militar, a disciplina e o controle são explicitamente admitidos, assim como as práticas de padronização e unidimensionalização das formas e meios de aprendizagem e ensino. A indisciplina e a violência gerada pelo confinamento e pela não correspondência entre o que se ensina e as oportunidades educacionais concretas dão a esse modelo a vantagem do uso mais legítimo da violência, onde a insatisfação é vista como uma ameaça à ordem e a obediência inquestionável uma virtude. Isso na melhor das hipóteses, porque a falha desse modelo militar na função ideológica implicará em sua readequação como escola-prisão — que terá como função punir e reduzir a violência dos jovens sem que a raiz social e econômica seja reformada.
É evidente que tais modelos coexistirão, conforme as condições, expectativas e possibilidades das categorias sociais por eles atendidas. A escola de modelo empresarial poderá se tornar mais próxima do modelo democrático, caso a participação dos pais fosse mais considerada e efetiva na gestão, assim como se os professores selecionados por tais modelos tivessem um perfil mais inovador e menos transmissor de conhecimento. Na verdade, o modelo empresarial se voltará para resultados quantitativos, medidos por avaliações educacionais (muitas formuladas por "Dons Quixotes" da sociologia da educação e da pedagogia).
O modelo cívico-militar trará algum resultado em termos de redução da violência no interior das escolas, pois agirá no sentido de monopolizar o uso dessa violência, desenvolvendo um adestramento capaz de conter as contradições no interior dessas relações, pelo menos o suficiente para não ser facilmente notada.
Se as desigualdades e a miséria nos locais de implantação dessas escolas apresentarem sérias barreiras aos aspectos ideológicos do modelo cívico-militar e sua capacidade de monopolização da violência, ela se converterá ao modelo da escola-prisão, onde uma rígida estrutura de contenção se erguerá como uma alternativa para que alguma função educacional da escola se desempenhe, a ponto de se distingui-la do mero encarceramento em massa de jovens.
Muitos perguntam pela solução de tais dilemas educacionais e políticos, quando a verdadeira pergunta deveria ser: quem realmente se interessa pela equalização das oportunidades mais do que aqueles que se encontram à margem? Os "Dons Quixotes", os empresários da educação, os governos ávidos por despejar dinheiro público na iniciativa privada, os professores (digo, os que ainda estão), os pais, estudantes?