Contribuição da filosofia clínica como conhecimento

Percebo que a filosofia clínica se apresenta como uma terapêutica pautada em todo o pensamento filosófico base do conhecimento da humanidade.

É a concatenação dos principais estudos filosóficos ao longo dos tempos, para que possam ser tratadas questões cotidianas da vida humana.

O que me parece central nesta terapêutica está na não utilização de métodos prontos para todas as pessoas, desligamento de tipologias e a preservação a subjetividade, procurando entender como cada pessoas funciona baseado em sua historicidade.

Para a definição desta historicidade, cito um comentário do professor Lúcio Packter, seu idealizador. O professor diz que:

“A historicidade é a interpretação que a pessoa dará ao que ela viveu, e não ao que de fato acorreu.”

Assim vejo que, como conhecimento, a filosofia clínica nos leva ao cerne da palavra alteridade. Aquilo que é só do outro, ou só de cada um.

Mas em relação ao meu conhecimento próprio, qual seria a função da filosofia clínica?

Creio que o contato que tenho com tais ensinamentos, me fazem entender as relações internas do meu pensamento, mas também ficar mais próximo do entendimento das relações com os outros, não apenas tendo alteridade, mas sim verificando os melhores caminhos de vivencias e convivências sociais.

Fazendo-me aprender a consultar a trajetória de vida para enfrentara as questões cotidianas atribuindo a elas as dimensões que lhe são devidas e não o todo. Estas questões existenciais aparecem e fazem mostrar que nem sempre somos autores da própria história, e que, por muitas vezes, esta história depende de fatores externos dos quais não temos controle.

Este entendimento nos leva a naturalidade da vida, liberta da busca sem escalas pela moral existencialista (inexistente) da vida, nos coloca no controle do tal farolete de Nietzsche.

Friederich Nietzsche, filósofo alemão do século XIX, dizia que a nossa psique é infinitamente maior que a nossa consciência. A consciência seria uma espécie de farol iluminando uma “bola” no mar em uma noite escura, ao mover o farol, iluminaria outra bola, e assim por diante.

Fazendo iluminar (trazer à tona) aquilo que está na consciência naquele momento.

Porém, se a consciência é a bola iluminada, quem é que movimenta o farol?

Para Nietzsche, o movimento do farol seria de responsabilidade da vontade de potência, a vontade da vida. Assim você não seria soberano no seu pensamento.

Dizia ele que: “não és senhor no teu próprio lar”.

E isso também acontece na vida. Isto ilustra uma visão com relação ao aprendizado da filosofia clínica.

Há um potencial de ligação entre o conhecimento nesta área e o bem-estar neste universo caótico.

Quando pensamos em bem-estar, vem à cabeça a ideia de movimento tranquilo da vida, de equilíbrio, do domínio de atitudes para lidar com questões existenciais, em buscas (ou encontro) das respostas simples buscadas ao longo da história da humanidade.

E estes entendimentos, possivelmente, estão nos locais ainda não iluminados, bastando obter o controle do farol. Porém não há o sistema pronto que possa oferecer a solução e tais respostas.

A filosofia não tem respostas prontas, ela tem o posicionamento necessário para enxergar o caminho que levará a elas, mas deverá haver a atitude diante da vida. Um questionamento sobre o que, como, porque e principalmente sobre a possibilidade de outros modos de ser.

A busca do bem-estar passa pelo cuidado ao próximo é claro, mas a si mesmo também.

“Bem-estar é encontrar o equilíbrio no movimento da vida. É conhecer a si mesmo e a seu entorno, é ser capaz de situar-se diante das mais diversas circunstâncias.” (Monica Aiub)

A cada momento observo que a técnicas de terapias engessadas se aproximam da filosofia clínica. Alguns, ainda que eventualmente, defensores destas técnicas, ao avaliar a própria obra são levados a conclusões que esbarram frente aos seus ensinamentos inclinando-se ao entendimento de que não poderia haver um método único e universal.

Karl Theodor Jaspers, filósofo e psiquiatra alemão do século passado descreve que:

“Quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso de partilhar, com seus concidadãos, o destino comum da humanidade.”

E ainda Irvin D. Yalom escritor e psiquiatra americano em entrevista para a revista Super Interessante:

“Nos últimos anos, as forças econômicas, por meio do sistema de assistência médica, fizeram com que o tratamento psicológico se tornasse cada vez mais ágil, com terapias extremamente breves e superficiais, orientadas pelo diagnóstico de sintomas sem observar a verdadeira natureza do problema. Acho que esse enfoque não é o correto – penso que a ênfase deveria ser dada ao tratamento individualizado. Espero que os novos terapeutas, apesar dessa pressão, encontrem pacientes dispostos a assumir um compromisso com a terapia. Os Desafios da Terapia são dirigidos para terapeutas e pacientes que tenham esse interesse subjetivo.

Posso concluir que esta busca também se aplica ao estudante de filosofia clínica, que antes de tudo é um “procurador” do seu próprio equilíbrio, buscando lidar com seus pensamentos e com as relações humanas das quais tem contato.

Seria a busca da inspiração para trazer a vida de fora para dentro, retroalimentando a própria filosofia.