Como escrever um TCC de História

Um dos momentos mais marcantes na vida de um acadêmico, sem dúvidas, é a escrita do TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), também conhecido como monografia. Não é para menos, pois sem ele você não consegue colar grau, pôr as mãos no tão sonhado diploma e nem exercer uma profissão. Nesse texto pretendo dar algumas dicas de como escrever um bom trabalho final de História.

O QUE É O TCC?

De acordo com algumas universidades, como a Universidade Federal do Amapá (UNIFAP) e a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), “O Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) é uma atividade acadêmica obrigatória que consiste na sistematização, registro e apresentação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos, produzidos na área do Curso, como resultado do trabalho de pesquisa, investigação científica e extensão. O TCC tem por finalidade estimular a curiosidade e o espírito questionador do acadêmico, fundamentais para o desenvolvimento da ciência” (UFVJM, s. d.). Em síntese, no trabalho de conclusão de curso o acadêmico irá demonstrar, através de pesquisa, todos os conhecimentos adquiridos durante sua formação. Tudo o que aprendemos na graduação em História, como ler e analisar textos e documentos e pesquisar em arquivos, deve ser aplicado no TCC.

ESCOLHA E DELIMITAÇÃO DO TEMA

Os professores são unânimes nesse ponto: escolha um assunto que lhe agrade. Uma das piores coisas que se pode fazer é escrever sobre algo que você não gosta. Qualquer leitura, por mais simples que seja, se torna enfadonha quando o assunto abordado não nos interessa. Quantas disciplinas encaramos sem gostar, não é mesmo? Mas os créditos valem o sacrifício.

Ao entrar na graduação, preciso escolher logo de cara o assunto que vou abordar no TCC? Não, não se afobe. Temos, é claro, alguns casos de pessoas que já entram no curso decididas com o que vão trabalhar. Mas o mais comum é que a escolha vá se desenrolando ao longo dos períodos. E você tem todo o direito de mudar de opção. Ao entrar na graduação, tinha em mente falar sobre a história de Manaus. Escolhi falar sobre as origens de suas primeiras ruas. Ao ter contato com o livro História da Morte no Ocidente, de Philippe Ariès, optei por escrever sobre a proibição dos enterros nas igrejas e o surgimento dos cemitérios na capital. Exemplos de assuntos:

– História da Igreja;

– Historiografia;

– História Política;

– Questões de gênero;

– História da Amazônia;

Na pesquisa histórica utilizamos dois tipos de recortes: espacial e cronológico. Eles servem para delimitar a pesquisa, pois é praticamente impossível darmos conta, por causa dos prazos, de abordar períodos muito longos. Imaginem só o trabalho hercúleo que seria falar sobre a História da Amazônia. É algo muito amplo que foge da nossa capacidade, pois são milhares e milhares de anos para serem analisados. Como solução, escolhemos dentro desse assunto um tema, estabelecendo limites. Ex: economia gomífera no Amazonas (1880-1920). E não precisa ser necessariamente um recorte de várias décadas, podendo ser analisados alguns poucos anos. Em meu TCC, Os mortos e suas moradas na terra dos Barés: o fim dos enterros nas igrejas e seus arredores e a construção do cemitério de São José, em Manaus (1848-1859), estudei um período de 11 anos, justificando o recorte por ter constatado que foi nessa época que surgiram os primeiros discursos contra os enterros tradicionais e quando foram construídos os primeiros cemitérios públicos da cidade.

O que um bom TCC de História precisa ter? Vejamos o que dizem alguns professores:

– "O objeto de investigação claro para o leitor e o recorte temporal". Profa. Dra. Keith Valéria de Oliveira Barbosa.

– "Um TCC precisa ter o objeto de pesquisa bem definido espacialmente e temporalmente. Isso já deve estar apresentado no título. Deve ter uma base teórica e metodológica que dialoguem, pois a escolha das fontes, a sua coleta e o seu tratamento precisarão estar fundamentadas". Profa. Dra. Kátia Cilene do Couto.

– "Um bom TCC de história precisa ter basicamente dois elementos: 1) uma leitura/revisão bibliográfica consistente, seja com quem você concorda ou discorda como autor; e 2) um plano de pesquisa bem elaborado, sejam as fontes primárias ou secundárias. Algo que defina ‘eu vou trabalhar com isso’!". Prof. Dr. Bruno Miranda Braga.

Escolhido o assunto e delimitado o tema, você deve se perguntar sobre a viabilidade da pesquisa. Tenho tempo? Qual sua relevância? Existem fontes e referências bibliográficas disponíveis? Se existirem, estão ao meu alcance (compra, troca e empréstimo de materiais e livros)? Esses são os principais pontos a serem avaliados antes do início do trabalho. Vejam abaixo algumas monografias de História publicadas nos últimos anos na UFAM:

– Da Vida para a História: a crise de 1954 e a repercussão da morte de Vargas na imprensa manauara. Autora: Larissa Leite Colares. Ano: 2019.

Desde a época em que fazia curso preparatório a autora gostava de estudar a vida de Getúlio Vargas, principalmente a sua morte. Já na graduação, decidiu que sua monografia seria sobre a o impacto da morte de Vargas em Manaus, entrando em contato com o professor de Brasil Republicano, que decidiu orientá-la.

– O Egito faraônico no período Armaniano (1352-1336 A. C.): Cultos, Diplomacia, Poderes e Problematizações. Autora: Inara Kézia Gama Araújo. Ano: 2021.

A autora vinha pesquisando esse tema em projetos de iniciação científica. Pensou em abordá-lo na monografia pensando na pluralidade que esse período representa na egiptologia.

ESCOLHENDO O (A) ORIENTADOR (A)

Baseado na minha experiência e nas conversas com amigos de curso, afirmo que existem dois tipos de orientador: anjos e carrascos. Os anjos são aqueles que lhe acolhem, respeitando suas escolhas e fazendo críticas e sugestões construtivas, indicando fontes e referências e contribuindo para a realização da pesquisa. As seções de orientação são bastante produtivas. Ele também cuida dos seguintes aspectos:

– Ajuda na estruturação do trabalho;

– Informa sobre as normas técnicas que devem ser obedecidas e as corrige;

– Corrige e revisa o trabalho ao longo de sua execução;

Os carrascos, por outro lado, têm o prazer de depreciar a pesquisa de seus orientandos e, sempre que podem, dão uma de Mestre dos Magos (desaparecem quando mais precisamos). As seções de orientação parecem mais uma estadia no Purgatório. Lembro que, certa vez, quando fazia um projeto voltado para o estudo da Amazônia, a orientadora só queria aceitá-lo se incluísse o referencial teórico de sua formação, no caso Michel Foucault. Com a minha negativa, perdi a orientação.

Escolha um (a) orientador (a) que tenha afinidade com o assunto que você escolheu. E também com você. As sociabilidades são muito importantes na vida acadêmica. Muitas dores de cabeça serão evitadas dessa forma. Aliás, qual seria a lógica em escolher um especialista em História Social do Trabalho para lhe orientar em uma pesquisa sobre História Cultural no Brasil Colônia?

No entanto, por conta do grande número de trabalhos, pode ser que aquele professor que você esteja interessado não tenha mais vagas abertas. Isso acontece com frequência. Não desanime. Dialogue com o que foi escolhido, mesmo que não seja o que você esperava.

MONTANDO O PROJETO

MONOGRAFIA HISTÓRICA I

O TCC, ou monografia histórica, é dividido em duas partes: Monografia Histórica I e Monografia Histórica II. A primeira é o projeto do seu trabalho, e deve ter a seguinte estrutura: Introdução; Justificativa; Objetivos; Metodologia; Fontes; e Referências Bibliográficas.

A introdução, como o próprio nome indica, é a parte em que você introduz o leitor ao tema do trabalho, apresentando as questões norteadoras, fazendo uma revisão da literatura existente, apresentando as fontes que serão utilizadas e o referencial teórico. Na justificativa você deve, obviamente, justificar a importância de sua pesquisa para a comunidade científica e as contribuições que ela traz para a temática pesquisada. Observações:

– Faça uma revisão consistente da literatura, mas não exaustiva. Lembre dos prazos. Escolha alguns dos principais autores e apresente suas perspectivas;

– O mesmo ocorre com o referencial teórico. Não é necessário escolher um planetário de autores. Fique com os fundamentais: vai escrever sobre metodologia da pesquisa histórica? Não esqueça de Marc Bloch. Vai falar de história das mulheres? Tenha em mãos trabalhos de Michelle Perrot;

Os objetivos são divididos em objetivo geral e objetivos específicos. O objetivo geral é amplo e está relacionado com o problema da pesquisa: qual o objetivo principal do trabalho? Dica: use verbos de compreensão/aplicação como explicar, ilustrar e demonstrar. Os objetivos específicos são a ponte de acesso ao objetivo geral. Neles são utilizados verbos de análise como analisar, comparar, categorizar e compreender. O ideal é que sejam formulados um objetivo geral e dois ou cinco específicos.

Na metodologia devem ser abordados os procedimentos utilizados na condução da pesquisa: pesquisa de campo, revisão bibliográfica, entrevistas, pesquisa documental, levantamento fotográfico, estudo de caso etc.

Na seção fontes deve ser arrolada a documentação empregada: jornais, revistas, leis, decretos, requerimentos, certidões de nascimento e óbito, registros paroquiais, fotografias, relatórios municipais e estaduais e outros tipos de documentos. Nas referências bibliográficas são elencados os artigos, livros e obras consultadas.

MONOGRAFIA HISTÓRICA II

A Monografia Histórica II é o trabalho em si, contendo os resultados da pesquisa. Têm a seguinte estrutura: capa; folha de rosto; agradecimentos (opcional); resumo; resumo em língua estrangeira; lista de figuras (se forem utilizadas); sumário; introdução; desenvolvimento; considerações finais; fontes; e referências bibliográficas.

A capa deve contar o cabeçalho com o nome da universidade, do instituto e do departamento, o nome do autor, título, cidade e ano de entrega. A folha de rosto começa com o nome do autor, seguida do título e, abaixo, informações sobre o trabalho e o nome do orientador (a). Por último, cidade e data novamente. Em seguida temos o resumo, que deve ser um compilado do tema estudado, trazendo as questões que serão trabalhadas, o objetivo, metodologia empregada, as considerações finais e as palavras-chave (de 3 a 5). Ele deve ser feito novamente na próxima página, só que em língua estrangeira (inglês, espanhol e francês).

Na introdução, o tema deve ser apresentado, contextualizado e delimitado, bem como as questões que norteiam a pesquisa, os objetivos e a metodologia. Os capítulos que compõe o trabalho também devem ser expostos, só que de forma sucinta. O tamanho da introdução varia, mas geralmente a encontramos com extensão de 3 a 5 páginas. No final, ela vai depender do tamanho da pesquisa. No desenvolvimento são apresentados os resultados da pesquisa, divididos em capítulos. É recomendável que o trabalho tenha de 3 a 5 capítulos.

Conclusão ou considerações finais? É um termo que gera debate na academia. Uma parte da comunidade científica defende que são termos diferentes que possuem o mesmo significado. A outra afirma que considerações iniciais e conclusão possuem diferenças: as considerações finais indicam que não existe uma verdade única sobre a pesquisa. Novos pontos de vista podem ser lançados ao tema, fazendo surgir novos resultados. A conclusão, por outro lado, transmite a ideia de totalidade, verdade absoluta, ideia rechaçada nas ciências. Para as considerações finais, você deve recapitular, de forma geral e sucinta, o tema pesquisado, reapresentar a justificativa, a metodologia, os objetivos, as hipóteses e, por fim, os resultados.

Nas fontes devem ser listados os documentos utilizados (leis, decretos, requerimentos, certidões de óbito e nascimento etc) e, na bibliografia, os textos, artigos, teses, dissertações e monografias que foram consultados.

CONCLUSÃO

O TCC, ou monografia, não é um bicho de sete cabeças. Infelizmente se sabe que é grande o número de pessoas que saem do ensino médio sem saber redigir um texto, problema que aflora na hora de realizar trabalhos acadêmicos. Por isso a importância, na graduação em História, de disciplinas como Metodologia da Pesquisa Histórica, em que temos contato com o instrumental de pesquisa. Você não precisa escrever a nova Apologia da História para ser aprovado por uma banca. A grande maioria dos trabalhos de conclusão de curso, não só de História como de outras áreas, são revisões bibliográficas. Com um bom orientador, fontes e referenciais teóricos, é possível fazer um bom trabalho, ser aprovado e tornar-se historiador.