O FENÔMENO VARIACIONISTA DO ROTACISMO E O PRECONCEITO LINGUÍSTICO.

AUTORES:

ARAÚJO, Maria Júlia de Lima

LIMA, Vanessa de

FRANÇA, José Eldení Alves de

SANTOS, José Willame Pinheiro dos

RESUMO: Falar e escrever de acordo com a gramática normativa da língua portuguesa é importante, mas conhecer e compreender a língua e seus desdobramentos é trivial para vivermos em sociedade, ao estudarmos o fenômeno variacionista do rotacismo, sempre surgem questionamentos sobre o porquê desse processo fonológico desencadear preconceitos linguísticos para um grupo ou indivíduo falante, causando para alguns uma falsa afirmativa que existem formas de expressões e dialetos que são superiores aos outros, nessa perspectiva analisaremos de forma sucinta através de pesquisa documental e bibliográfica trabalhos publicados na área, objetivando compreender mais nitidamente esse questionamento, assim como, dar ênfase ao papel do professor de língua portuguesa na desconstrução desses estigmas em sala de aula.

Palavras-chave: O Rotacismo, Preconceito Linguístico, Diversidade na língua.

1 INTRODUÇÃO

Esse artigo tem o objetivo de discutir através de pesquisa documental um dos processos fonológicos mais comuns em nosso convívio, o rotacismo, e como esse processo diastrático é estigmatizado em ser usado por falantes da língua com baixo nível educacional, esse estigma precede o preconceito linguístico a quem comete o rotacismo em sua fala/escrita, essa variante não-padrão ainda é muito discriminada em nossa sociedade, embora saibamos que existem várias nuances da língua e que cada uma delas têm suas especificidades “mudança diacrónica ou histórica é um dos aspectos mais evidentes da variação inerente a qualquer língua. Mas também a língua varia no espaço, razão por que o português apresenta as variedades nacionais” (MATEUS, 2005, p.5)

De acordo com Silva (2021) não se pode dizer que há algo certo ou errado em relação ao uso das variedades utilizadas pelas comunidades falantes da Língua Portuguesa, essa teoria só é permitida quando se trata da estrutura da língua, pois podemos dizer que ocorreu erro de grafia e não erro de Português. Devemos levar em consideração a variação diastrática e suas características socioculturais para uma melhor compreensão e aceitação da língua e suas variantes.

Para Marcuschi (2010), a fala pode ser apresentada como manifestação da prática oral e é adquirida ao longo da vida, através da informalidade, de acordo com Mateus (2005, p.10) “Além da variação dialectal, as línguas também apresentam variantes decorrentes dos diferentes grupos sociais a que pertencem os falantes (etários, sócio-culturais, sócio-profissionais 14) e que são denominadas sociolectos.”

2 FUNDAMENTAÇÃO

2.1 ROTACISMO, TÃO PRESENTE QUANTO EXCLUDENTE

O Rotacismo, fenômeno linguístico que ocorre quando o falante troca a lateral/l/ pela vibrante tepe /r/, e preconceito, uma opinião desfavorável, motivada por julgamento apressado, são coisas presentes em nossa sociedade. Nas pesquisas realizadas nas plataformas sobre esse assunto para produzirmos este trabalho, fizemos descobertas importantes a respeito do tema.

As obras a seguir foram as que utilizamos como fonte de pesquisas para a produção desse artigo, são elas: ‘’Avaliações e percepções sociolinguísticas, (Oushiro,2021), a autora traz uma percepção importante sobre o assunto. ‘’O Rotacismo na produção e escrita de alunos do ensino fundamental (SILVA, 2021), onde nos é apresentado como os alunos se expressam em seu dia a dia.’’ ‘’As minorias linguísticas no Brasil (ANDRADE,2020), nesta obra, nos é apresentada um contexto histórico da LP e a presença do fenômeno linguístico, por nós estudado.’’ Eu escrevo assim porque falo assim: reflexos da variação fonética na escrita de alunos do 4º ano do ensino fundamental I (Galli &Cardoso), abordam a trajetória escolar do aluno, e sua forma de expressar-se oralmente, e em textos produzidos por eles.”

Para compreendermos melhor o termo sobre o rotacismo, vejamos a definição de Silva (2021, 19) “O rotacismo é um processo fonológico intrassilábico, no qual há uma troca da lateral alveolar /l/ pela vibrante simples/tepe /r/, em ambiente de onset complexo, como por exemplo na palavra g[r]obo, ao invés de g[l]bo”. Esse fenômeno extremamente presente em nosso cotidiano, está presente em diversas palavras, como: Framengo, pobrema, pranta, chicrete etc.

É de suma importância o estudo da fonética e fonologia para que haja uma melhor compreensão e menos estigmatização das variações linguísticas. Seara (2015) nos explica de maneira sucinta esses respectivos fatores, quando nos diz que a Fonologia irá estudar os sons de forma sistemática, na abstração mental, e a Fonética estuda os sons produzidos, propagados, percebidos e quais aspectos estão envolvidos nessa produção.

2.2 O PAPEL DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA NA CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE AS ABUNDANTES VARIAÇÕES DA LÍNGUA

Para que ocorra uma melhor compreensão em torno desses aspectos, é necessário que os professores de Língua Portuguesa tenham essas habilidades ao longo de suas formações, coisa que não é muito frequente. O estudo do plano fônico da Língua Portuguesa vem destacando-se, atualmente, mesmo havendo um certo desprezo do mesmo, no que se refere às formações dos profissionais de Letras. Mesmo com a dedicação de pesquisadores para analisar os fenômenos fonêmicos e fonéticos no português do Brasil e de Portugal, o tempo na grade curricular do curso de Letras, dedicado ao estudo do plano fônico, é curto. (SILVA, 2020).

Tratando-se do rotacismo, o professor precisar conhecer os aspectos de produção e percepção orais do fenômeno. Esse conhecimento dar-se por meio dos estudos da Fonética Acústica e Articulatória. Como já dito nesse trabalho, o rotacismo é um fenômeno da Língua Portuguesa onde ocorre a troca de um fonema por outro, mas que pertence à classe dos róticos. Nesse fenômeno, além de ocorrer a substituição do tepe /r/, pela lateral /l/, como por exemplo em “p[r]ático” por “p[l]ático, ou pode ocorrer o contrário, ou seja, quando ocorre a troca da lateral líquida pelo tepe, como em “p[l]ano” e “p[r]ano.

Muitas vezes, os desvios ortográficos resultantes da oralidade são atribuídos a fatores sociais e caracterizados como algo resultante da falta de acesso à escolaridade. Nesse contexto, Martelotta nos apresenta o rotacismo dessa maneira:

Outro exemplo é o caso da alternância dos grupos consonantais do português: ―c[l]aro- c[ɾ]aro, “bicic[l]eta-bici[ɾ]eta” “. Pesquisas demonstram que esse ‘é um caso de variação estável que caracteriza duas comunidades de fala: a forma não padrão [ɾ]é usada por falantes das classes menos favorecidas e com baixo grau de escolaridade. A outra, canônica, é usada pelo grupo mais escolarizado (MARTELOTTA, 2013, p .151).

Esse fenômeno da Língua Portuguesa, ocorre há muito tempo, desde a época dos colégios dos jesuítas, isso é, no Brasil Império como nos traz (ANDRADE, 2016). Nesse caso, podemos observar o estudo feito pela sociolinguística e perceber que ela não condena a correção dos desvios gramaticais, ao contrário, busca encontrar equilíbrio entre a variante-padrão e as demais. É importante ressaltar que é de responsabilidade do professor ensinar ao aluno que existem várias diferenças na língua, que não se escreve do jeito que fala, que existe uma distinção entre a organização da língua que se fala e também da língua que se escreve (GALLI e CARDOSO, 2020).

De acordo com as ideias de Oushiro (2021) algo que se faz presente na vida dos falantes desse fenômeno é o preconceito, que como sabemos, é algo que em nenhum aspecto faz bem. No contexto do rotacismo podemos observar que muitas vezes além do preconceito linguístico, ocorre também o preconceito regional e o social, basta atentarmos para casos em que nordestinos migram para a região sul/sudeste do país e sofrem esses preconceitos. Algo que muitas vezes ocorre e passa despercebido, é que esses preconceituosos cometem equívocos em suas falas quando colocam um pronome oblíquo no início da sentença, como por exemplo ao dizer “me passa o açúcar”, colocando o pronome oblíquo no início da sentença, fugindo assim da norma culta. Uma situação diferente ocorre quando um falante diz “bicreta, cerular e etc”, logo é estigmatizado e corrigido. Felizmente o combate ao preconceito linguístico tem pautado seu discurso na valorização das diversidades e na valorização das variações existentes na língua.

Ao observarmos a imagem 1, podemos notar a presença do rotacismo nessa junção, que traz o nome do modelo do automóvel juntamente com adesivos contendo letras do alfabeto formando assim, um caso de rotacismo.

Imagem 01:

Fonte: instagram/brasileironaotemlimite

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS

O presente artigo é de caráter qualitativo, feito através de pesquisas bibliográficas e com materiais estudados anteriormente na formação acadêmica, como também através de artigos pulicados em plataformas digitais, como o Google acadêmico, feita pesquisa com palavras chaves: Rotacismo + Preconceito Linguístico, com apresentação inicial de 491 artigos, sendo 06 filtrados e escolhidos por terem temáticas que mais se aproximaram do objetivo de estudo do presente artigo, a mídia social Instagram também foi utilizada. Sendo assim, estudamos essas obras e extraímos informações que colaborassem para um bom resultado desse artigo.

4 ANÁLISES E DISCUSSÕES

Entre todas as discussões levantadas pelos autores estudados, é evidente entre eles que as variedades linguísticas são diversas em nossa língua e que são resultados de várias premissas que acompanham historicamente as populações e tem o seu valor em sua geografia e nos aspectos culturais de cada povo, indo de encontro aos estigmas que surgem em relação aos falantes das variações, dando ênfase ao papel do professor de língua portuguesa como trivial nas desconstruções desses preconceitos. “Estereótipos precisam ser ativados. Uma das formas de ativação de estereótipos dar-se-á por meio da indexicalidade resultante da associação entre traços linguísticos e grupos sociais” (FREITAG et al, 2020, p. 5)

Faz-se necessário estudos in loco para averiguar com mais exatidão o perfil desses falantes e as causas que levam a utilização do rotacismo, esses processos fonológicos são de cunho social, cultural e geográfico.

5 CONSIDERAÇÕES

Este trabalho foi realizado com o objetivo de apresentar resultados de pesquisa bilbliografica, abordando a temática Rotacismo e Preconceito. O primeiro, um fenômeno da Língua Portuguesa e o segundo, algo que infelizmente é tão presente na sociedade.

Ao realizarmos nossas pesquisas, pudemos observar que os desvios ortográficos que geram essa estigmatização para com os falantes desse fenômeno, dar-se, muitas vezes, pela falta de acesso à escolaridade. Outro fator importante que destacamos é a não formação dos profissionais da Língua Portuguesa para lidarem com essas situações em sala de aula.

Em suma, o fenômeno do Rotacismo e o preconceito são tão presentes quanto excludentes em nossa sociedade. Uma situação não tão agradável que pode ser mudada, desde que, possamos aprender e ensinar que esse fenômeno é algo que não se pode ser excluído o estigmatizado e sim aceitado e analisado.

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Tadeu Luciano siqueira; ANDRADE, Tadeu Luciano Siqueira. AS MINORIAS LINGUÍSTICAS NO BRASIL. Direito em Movimento, [S.l.], v. 18, n. 3, p. 236-258, fev. 2021. ISSN 2238-7110. Disponível em: <http://emerj.com.br/ojs/seer/index.php/direitoemmovimento/article/view/304>. Acesso em: 05 out. 2021.

BRASIL. Instagram, brasileirosnaotemlimites. Disponível em: < https://www.instagram.com/p/CTuJT6ILD-6/ > Acesso em: 12 de set de 2021

GALLI, Michelli Cristina. CARDOSO. Luiz Felipe Felizardo. “Eu escrevo assim porque falo assim”: reflexos da variação fonética na escrita de alunos do 4o ano do ensino fundamental I. Letras, Santa Maria, Especial 2020, n. 01, p. 371-397. Disponível em: < https://scholar.google.com.br/scholar?hl=pt-BR&as_sdt=0%2C5&as_ylo=2020&q=%E2%80%9CEu+escrevo+assim+porque+falo+assim%E2%80%9D%3A+reflexos+da+varia%C3%A7%C3%A3o+fon%C3%A9tica+na+escrita+de+alunos+do+4o+ano+do+ensino+fundamental+I&btnG= > Acesso em: 01 de set. 2021

FREITAG, R. M. K., LIMA, M. E. O., SILVA, L. S., & Souza, V. R. A. (2020). O uso da língua para a discriminação. A Cor Das Letras, 21(1), 185–207. <https://doi.org/10.13102/cl.v21i1.5233> Acesso em: 18 de set. 2021

MATEUS, Maria Helena Mira. A mudança da língua no tempo e no espaço. In: Mateus & Bacelar (orgs.). A língua portuguesa em mudança. Lisboa:Editorial Caminho.Portugal, 2005, p. 1-19. Disponível em :< https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=1372087&forceview=1> Acesso em: 02 de out de. 2021

MARCUSCHI, Luis Antônio. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 10. ed. – São Paulo; Cortez, 2010

MARTELOTTA, M.E. (org.). Manual de Linguística. 2ª ed., 2ª reimpressão. São Paulo: Contexto. (2013).

SILVA, Alcione Vieira da. O ratacismo na produção oral e escrita de alunos do ensino fundamental [ manuscrito]/ Alcione Vieira da Silva-2021. Disponível em : < http://tede.bc.uepb.edu.br/jspui/handle/tede/3714#preview-link0 > Acesso em: 06 de set de. 2021

OUSHIRO, L. (2021). Avaliações e percepções sociolinguísticas. Estudos Linguísticos (São Paulo. 1978), 50(1), 318–336. Disponível em: < https://revistas.gel.org.br/estudos-linguisticos/article/view/3100 >Acesso em: 06 de set de. 2021

Ma Júlia Araújo, Vanessa de Lima, Jose Eldeni Alves de França e Jose Willame Pinheiro dos Santos
Enviado por Ma Júlia Araújo em 16/03/2023
Reeditado em 17/03/2023
Código do texto: T7741789
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