CELIE JOHNSON E A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DA MULHER NEGRA EM A COR PÚRPURA, DE ALICE WALKER.

AUTORA :

ARAÚJO, Maria Júlia de Lima

RESUMO: Este trabalho pretende levantar uma discussão sobre construção da identidade da personagem protagonista Celie Johnson, do romance A Cor Púrpura, que representa a condição da mulher negra da Zona Rural do Sul dos Estados Unidos no início do século XX, da escritora afro-americana Alice Walker. Neste estudo relacionamos o processo de evolução da protagonista, uma jovem negra pobre e analfabeta, abusada física e psicologicamente por homens a quem está legalmente submissa e que a destroem, atrasam o seu desenvolvimento pessoal e a sua vida durante um longo tempo, até que a mesma consegue se libertar, sendo influenciada por outras mulheres fortes presentes na narrativa. A situação dessas mulheres negras é aqui abordada sob os aportes teóricos de MASSETO (1997); BOURDIEU (2002); HALL(2006); FANON(2008), entre outros, apresentando a condição de inferioridade da mulher negra daquela época, onde o machismo imperava, como também e principalmente a importância do letramento como mola propulsora para a evolução da protagonista e para a consecução da sua identidade pessoal, social, sexual e até mesmo da sua cidadania.

Palavras Chave- Mulher negra. Alice Walker. A Cor Púrpura Identidade.

INTRODUÇÃO

No século XX as mulheres começam a lutar por seus direitos, possibilitando uma maior onda dos estudos sobre teorias feministas. Entretanto, estes eram relacionados apenas à aceitação do gênero, e a emancipação feminina delimitava-se à mulher branca e burguesa. Mas, com o surgimento e aprofundamento das teorias pós-coloniais e, pela literatura produzida pelas afro-americanas, entra em destaque a mulher negra.

Neste trabalho iremos abordar a obra A cor púrpura (1986), da escritora afro–americana Alice Walker, que traz novas concepções em relação à discriminação, tanto de gênero como de raça. Trazemos aqui o olhar para as mulheres e suas identidades no romance foco de nossa pesquisa, em especial para a protagonista Celie, que tem sua identidade construída, em relação à subordinação aos homens de um modo geral, já que não apenas os brancos a descriminam, mas também os negros, que incorporam os valores sexistas dos brancos e para o modo como ela vai construindo a sua identidade a partir das suas experiências de vida. A cor púrpura Walker mostra a vida de uma mulher negra, marginalizada, silenciada por uma sociedade preconceituosa, sexista. Abusada na infância pelo pai, que a engravida e dá seus filhos, depois a vende para um senhor que a maltrata, escraviza aos afazeres doméstico. Mas que em meio a tamanha falta de esperança se supera e juntamente com outras mulheres consegue dar a volta por cima e encontra o seu lugar na sociedade, se tornando uma grande mulher independe. Assim, podemos ter a visão dessa obra, como uma quebra do silêncio, no qual mulher negra rompe os tabus dos padrões impostos por uma sociedade patriarcal, favorecendo novos horizontes para si e para suas companheiras no contexto histórico do início do século XX.

E nesse contexto em que a obra está inserida, podemos observar como a união das mulheres é importante, para que Celie conseguisse vencer. Esta é ainda uma forma de mostrar que muitas outras mulheres também buscavam serem aceitas e respeitadas, além de alcançar a sua independência, trabalhar e ter os seus direitos em uma sociedade igualitária. Por muitos anos as mulheres negras foram e ainda continuam sendo injustiçadas, mas com força e coragem buscam suas salvações. Essas mulheres que tanto sofreram e sofrem, hoje ocupam seu lugar na sociedade. Uma história de perseverança, fé e determinação iremos encontrar no desenvolvimento desse trabalho.

2 FUNDAMENTAÇÃO

2.1 A CONDIÇÃO DA MULHER NEGRA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Quem você pensa que é? ele falou. Você num pode amaldiçoar ninguém. Olhe pra você. Você é preta, é pobre, é feia. Você é mulher, vá pro diabo, ele falou. Você num é nada. (WALKER,1986,p. 229)

O século XX apresenta grandes transformações, do sentido revolucionário ao feminismo, quando as mulheres começam a buscar a liberdade de gênero e direitos iguais, perante uma sociedade machista, marcada por um imperialismo opressor. A mulher, era silenciada, não tinha direito a votar, nem opinar. Sua única tarefa era cuidar do marido e da casa. Sendo totalmente submissa. E não bastando, a mulher negra sofria essa marginalidade de forma mais desumana, pela falta de aceitação de raça, era vítima de açoitamentos: Estupro, humilhações, agressões, frio, fome.

Nas três primeiras décadas do século XX, começou a existir uma liberdade sexual, graças às forças que foram juntadas por essas mulheres, que buscaram um critério único de aceitação, os poucos, foram quebrando-se os tabus das inibições, e se tornando mulheres independentes e bem-sucedidas.

Apesar de não terem ainda exatamente os mesmos direitos dos homens, essas mulheres conseguiram ter acesso ao voto, educação e ao trabalho. E mesmo com esses direitos alcançados, ainda sofriam pela falta de aceitação. Sabemos que existiam aquelas mulheres que não tinham escolhas, que tiveram uma vida marcada por homens perversos, que as proibiam de estudar, e que continuavam a negar aos seus direitos, por achar que eram sua propriedade, e muitas por não terem voz e dependerem desses homens se submetiam a continuar em uma vida medíocre eternamente.

As mulheres negras, por exemplo, em sua história foram oprimidas, em duas vias de exploração: Pelo racismo e pelo sexismo. Durante a escravidão, o estupro a essas mulheres era algo comum, e mesmo depois da libertação dos escravos, os homens que continuavam a cometer tal ato, não eram eficazmente punidos, e mais ainda se fossem brancos. Portanto, a violência contra a mulher negra perdurou por muitos anos, como um ato natural. Podemos ver em A cor púrpura, o sofrimento de Celie , abusada pelo pai quando criança :

Ele nunca teve uma palavra boa pra falar comigo. Só falava você vai fazer o que sua mãe não quis. Primeiro ele botou a coisa dele na minha coxa e começou a mexer. Depois ele agarrou meus peitinho. Depois ele empurrou a coisa dele pra dentro da minha xoxota . Quando aquilo doeu , eu gritei .Ele começou a me sufocar , dizendo É melhor você calar a boca e acostumar (WALKER , 1986 , p. 9)

Por mais que o passado escravista estivesse extinto, a mulher negra ainda precisava lutar por sua sobrevivência juntamente com outras mulheres, pois, só elas poderiam mudar esse cenário, e deixarem de ser vítimas, tornarem-se agentes principais de sua história. A obra foco dessa pesquisa é marcada por mulheres que fizeram a diferença, que com as dificuldades foram ganhando impulso para se tornarem mulheres ativas e vitoriosas.

Nesse contexto, ao analisarmos a dominação masculina, podemos vê-la em variáveis situações. De um modo agressivo e visível, encontraremos a subjugação feminina no espaço público, observando as desigualdades trabalhistas; no meio privado, através da violência a partir do casamento, do assédio sexual e moral. O controle masculino é revelado de inúmeras formas, como enfatizado em Pierre Bourdieu (2002, p.22):

A dominação masculina encontra, assim, reunida as condições de seu pleno exercício. A primazia universalmente concedida aos homens se afirma na objetividade de estruturas sociais e de atividades produtivas e reprodutivas, baseadas em uma divisão sexual do trabalho de produção e de produção biológica e social, que confere aos homens a melhor parte, bem como nos esquemas imanentes a todos os habitus moldados por tais condições, portanto objetivamente concordes, eles funcionam como matrizes das percepções, dos pensamentos e das ações de todos os membros da sociedade, como transcendentais históricos que , que sendo universalmente partilhados , impõem –se a cada agente como transcendentes

Bourdieu demonstra acima situações visíveis nas quais as próprias mulheres aplicam à realidade as relações de poder em que estão envolvidas. É uma construção de fortes poderes, real entre gêneros, como se a mulher fosse um ser para o outro. Trata-se de convencionar que o ser feminino foi criado para suprir as necessidades masculinas. O privilégio masculino será mostrar à sociedade sua virilidade, não importa qual seja a circunstância, como podemos ver no trecho a seguir:

A virilidade, entendida como capacidade reprodutiva, sexual e social, mas também como aptidão ao combate e ao exercício da violência (sobretudo em caso de vingança), é, acima de tudo uma carga. Em oposição a mulher, cuja honra, essencialmente negativa, só pode ser defendida ou perdida, sua virtude sendo sucessivamente a virgindade e a fidelidade, o homem ´´verdadeiramente homem `` é aquele que sente obrigado a estar a altura da possibilidade que lhe é oferecida de fazer crescer sua honra buscando a glória e a distinção na esfera pública .( Idem, p.32)

Dessa forma, o homem tinha que adentrar os esportes, fazer coisas violentas, estuprar mulheres virgens, pois só assim ele teria sua honra e seria considerado homem. Devido a essa herança, nos homens perdura uma superioridade, um tipo de disputa uns com os outros para demonstrar sua capacidade e do que é capaz, assim como também no ato de procriar. Por muito tempo, tivemos uma sociedade masculina que pensava dessa forma individual, não se incomodando com o outro lado, o feminino, ultrapassando as fronteiras do respeito e passando por cima das lutas por igualdade.

Por esse conhecimento, nos vem à consciência de como os direitos adquiridos por essas mulheres se tornou uma conquista de muito tempo. Posteriormente, com a industrialização, a partir do século XVIII, as mulheres começaram a trabalhar, e garantir uma remuneração pelo seu trabalho. O setor têxtil e ateliê contratou o maior número de mulheres nas fábricas. As operárias entre 12 e 13 anos, já começavam a trabalhar, trabalho simples e monótono, em que a jornada de trabalho chegava a 14 horas diárias, e em cujo inicio o assédio sexual era algo fora de controle, levando ao pivô de algumas greves. O preconceito era algo estampado em todas as partes: As vendedoras de loja de departamento recebiam salários injustos, além disso, elas só conseguiam a vaga por indicação. Como se não bastasse a falta de aceitação, ainda se ouviam comentários maldosos, já que espaços públicos eram considerados uma afronta contra a reputação da mulher.

Mas com determinação, muita dedicação e resistência, os direitos iam sendo conquistado ao longo do tempo. Através de relatos históricos é percebível a evolução considerável a que estas se submeteram. Impulsionadas por um desejo coletivo de sexo feminino, de igualdade entre homens e mulheres. Hoje em dia, a mulher ocupa um grande espaço no mercado de trabalho, e inclusive ocupado profissões antes consideradas apenas masculinas. A mulher ganhou o respeito e liberdade para ser o que quiser, além de ser também uma grande dona de casa, mas de uma forma menos prisioneira. Ainda há muito que se conquistar, mas temos direito a igualdade e podemos ir em busca de um futuro promissor.

3 - LETRAMENTO E PODER :

Aprender a se comunicar foi uma das maiores conquistas do ser humano. Dessa forma, a mulher conseguiu ser vista como um ser crítico e consciente. De um modo geral, a mulher por muito tempo sonhou em aprender a ler e escrever e a da raça negra via-se ainda mais impulsionada pelo aprendizado e consequentemente uma melhor posição social, pois esta era uma ferramenta contra o racismo e o machismo de uma sociedade altamente opressora, onde ela era tida como invisível. Por conta disso, a mulher negra, não conseguia interagir, em seu convívio, sendo silenciada e ignorada. A mesma só podia se pronunciar se acaso fosse questionada pelo seu marido ou superiores. Em A Cor Púrpura podemos observar o quanto a privação do ensino prejudicou Celie Johnson. Ainda, a personagem que não conseguia dialogar com homem com quem era casada , que só o chamava de “Sinhô”, demonstrando sua condição de inferioridade e submissão.

O poder dessas mulheres, por toda a história, foi impulsionado juntamente com a aquisição do letramento: a mulher letrada tinha a condição de se posicionar socialmente, adquirindo voz e vez. Em A cor púrpura, Celie mostra que a ausência de ensino agrava seu grau de inferioridade perante a sociedade que dispunha de melhores condições de educação. Sem o privilégio de poder estudar de modo convencional, a alfabetização proporcionada pela irmã mais nova, Nettie, tem papel extremamente importante na sua ascensão pessoal e social. Nessa obra, é notório o quanto esse processo evolutivo fez falta. Isso pode ser reiterado nas palavras de Marcos Masseto (1997, p.21):

A escola surge teoricamente como fruto da necessidade de se preservar e reproduzir a cultura e os conhecimentos da humanidade, crenças, valores e conquistas sociais, concepções de vida e de mundo, de grupos ou de classes. Ela permaneceu e se modernizou à medida que foi capaz de se tornar instrumento poderoso na produção de novos valores e crenças, na difusão e socialização de conquistas sociais, econômicas e culturais desses grupos ou classes

A partir do momento em que a mulher negra consegue ter acesso às condições de ensino, ela começa a entrar no seio da sociedade e se aproximar intelectualmente dos brancos. Uma mulher negra quando concebe a linguagem falada e escrita, tem o mundo diante de si. Ela começa a ultrapassar os padrões impostos por uma sociedade preconceituosa, podendo ter acesso ao mercado de trabalho e outras participações civis, onde um passado e uma herança de inferioridade vão ficando para trás. Com essas informações podemos analisar, a escola com uma ponte de esperanças para essa mulheres dessas mulheres.

Uma construção da identidade dessas mulheres negras começa a surgir, a partir do domínio da escrita, e por meio desse processo, que elas entram em atividade e começam a se socializar. Segundo Stuart Hall (2011, p.11):

A identidade é formada na ´´interação`` entre o eu e a sociedade. O sujeito ainda tem uma núcleo ou essência interior que é o ´´eu real``, mas este é formado e modificado num diálogo contínuo com os mundos culturais ´´exteriores`` e as identidades que esses mundos oferecem.

Dessa forma, a mulher negra tem o poder nas mãos, sob a forma do letramento. Esse grupo marginalizado por tanto tempo é trazido por essa obra de Alice Walker, através de experiências vividas, mostrando a condição subalterna da mulher negra, com fatos que realmente aconteceram e mostrando como a interação dessas mulheres em seu meio de convívio é um obstáculo a se vencer todos os dias. Muitas dessas mulheres encontram na escrita, um refúgio, para poder testemunhar seu sofrimento, e buscar forças para a construção de sua identidade. Vítimas de tantos danos ao psicológico, abusos sexuais, violências, injustiças, humilhações. Revelando seus sentimentos, anseios, angústias. Como podemos ver em Alice Walker, as revelações vividas por Celie em suas cartas para Deus:

Querido Deus,

Harpo pergunta pro pai porque ele bate em mim. Sinhô

Fala, Porque ela é minha mulher. Depois, ela é teimosa.

Todas mulher são boa pra... ele num termina. Ele só infia a cara no jornal como ele faz sempre. Me faz lembrar o Pai.

O Harpo me pergunta , Por que que você é teimosa?

Ele num pergunta Por que que você é mulher dele? Ninguem

Pergunta isso.

Eu falo, eu nasci assim,eu acho.

Ele bate em mim como bate nas crianças. Só que nas

Criança ele nunca bate muito forte. Ele fala, Célie, pega

o cinto. As criança ficam lá fora olhando pelas fresta. Tudo o queu posso fazer é num gritar. Eu fico que nem tábua. Eu falo pra mim mesma, Célie, você é uma árvore. É por isso

queu sei que as árvore têm medo dos homem. (WALKER,1986, p.33)

A representação da mulher negra nessa obra vai mostrando o quanto o letramento ajuda na aquisição de autoestima da marginalizada e oprimida Celie Johnson. A herança escravocrata faz com que essas mulheres negras fossem julgadas pela cor e pela raça, elas não eram aceitas e continuavam sendo perseguidas, muitas vezes o sorriso lhe era cortado, como se fosse um castigo nascer negra, tornando-a motivo da exclusão, como podemos ver no pensamento de Frantz Fanon (2008, p.103):

“Preto sujo!” Ou simplesmente: “Olhe um preto!”

Cheguei ao mundo pretendendo descobrir um sentido nas coisas, minha alma cheia do desejo de estar na origem do mundo, e eis que me descubro objeto em meio a outros objetos.

Enclausurado nesta objetividade esmagadora, implorei ao outro. Seu olhar libertador, percorrendo meu corpo subitamente livre de asperezas, me devolveu uma leveza que eu pensava perdida e, extraindo-me do mundo, me entregou ao mundo. Mas, no novo mundo, logo me choquei com a outra vertente, e o outro, através de gestos, atitudes, olhares, fixou-me como se fixa uma solução com um estabilizador. Fiquei furioso, exigi explicações... Não adiantou nada. Explodi. Aqui estão os farelos reunidos por um outro eu.

Muitas pessoas ainda não respeitam a diversidade racial nem as culturas dos povos. Por isso muitas mulheres negras foram corajosas e não permitiram mais serem tratadas inferiormente, e exigiram respeito. Percebemos as grandes batalhas que foram vencidas por elas, que conseguiram chegar ao sucesso se tornando mulheres independentes, que não deixaram se abater e seguiram em frente. Mulheres inteligentes que se esforçaram por aprender a ler e escrever, fazendo uso dessas armas, conseguindo assim construir suas identidades, tornando-se pessoas participativas e se integrando à sociedade. Por mais que não fosse algo aceitável, elas persistiram e chegaram ao poder. Sem esquecer-se das suas origens, algo que as impulsionavam ainda mais a quebrar as correntes, por seus próprios méritos. O orgulho de sua raça tinha que estar cada vez mais forte. A essas mulheres batalhadoras, que tanto suaram e deram suas vidas pelo bem comum, é mais que merecido o reconhecimento, especialmente por parte de outras mulheres.

4- SHUE AVERY COMO MENTORA

No romance A Cor Púrpura, Shug Avery, é retratada como uma mulher negra, independente, forte e rebelde. Tem os homens nas mãos, sendo um exemplo de feminilidade e tudo o que nossa protagonista precisa conhecer. Celie conhece Shug Avery, através de um cartaz (de que?) e pela primeira vez consegue sentir amor por alguém, fora sua irmã Nattie. Ela fica impressionada com a beleza física e a personalidade, pela elegância, sensualidade e poder de Shug Avery, como podemos ver no trecho abaixo:

Docí Avery era uma mulher. A mulher mais linda que já vi. Ela é mais bunita que minha mamãe. Ela é mais de dez mil vezez mais bunita que eu. Eu vejo ela lá dentro do casaco de pele. O rosto dela vermelho. O cabelo dela parece uma coisa! Ela tá rindo com o pé encima do carro de aguém. Mas os olho dela tão sério. Um pouco triste. (WALKER , 1986, p.15)

Celie, que desde criança é humilhada e vive sob o regime de homens machistas, onde frases como: ´´Ela é feia, ele diz`` ( p.18), você é mesmo feia, ela diz (p. 50) são usualmente ouvidas sobre si no dia a dia. Muito infeliz, Celie não consegue amenizar seu sofrimento, a não ser escrever cartas a Deus.

Os negros dessa época, já sofriam demais, mas a mulher negra não era respeitada, e muito menos aceita naquela sociedade opressora. Marginalizada por todos os homens com quem convivera, para ela todos são símbolos da maldade. Então devido as suas experiências de mulher submissa, fraca, sem perspectiva de dias melhores, ela encontra em Shug Avery, um despertar dentro de si, um sentimento intenso de admiração. Ela sabe talvez nunca conseguirá ser alguém como Shug, mas o simples fato de vê-la linda e negra, além de conhecida por todos, é como se fosse um símbolo de orgulho para si própria. Então, com o desenrolar da história, ela descobre que Shug Avery é amante do seu marido, o “Sinhô”, e assim por acaso do destino, ela por ser escrava do marido, a recebe como hóspede doente e necessitando cuidados. Ao contrário do que todos pensam, ela não fica com raiva por saber disso, mas feliz por ter a oportunidade de realizar seu sonho de conhecê-la:

Quem é essa? O Harpo pergunta.

Essa mulher devia ter sido sua mãe, ele fala.

Docí Avery? Harpo pergunta.Ele olha pra mim.

Me ajuda a levar ela pra casa, sinhõ falou.

Eu acho que meu coração vai vuar pra fora da minha boca quando eu vejo um pé dela aparecer. (WALKER , 1986, p.57)

Shug Avery consegue despertar em Celie uma verdadeira visão de amor, já esta tem uma personalidade marcada por experiências negativas com os homens desde a infância. Dessa maneira, Shug aparece no decorrer da narrativa para questionar a identidade de Celie, que começa a ter uma visão de mundo a partir da convivência a partir dela, uma mulher decidida e a frente do seu tempo. A construção dessa amizade é consolidada aos poucos, quando Shug Avery vai sendo conquistada pela bondade da esposa do seu amante:

Sinhô me pergunta como eu consegui fazer ela comer.

Eu falei, ninguém vivo aguenta o cheiro de um pre-

Sunto feito em casa sem provar um pouco. Se ele tá morto, ele inda tenta resitir. Quem sabe.

Sinhô riu.

Eu reparei numa coisa doida nos olhos dele.

Eu tava com medo, ele falou. Medo. E ele cobriu os

Olhos dele com a mão.(WALKER, 1986, p.64)

Até o “sinhô” não acredita como elas estão se dando bem, e assim os dias vão passando e Shug Avery vai se recuperando. As duas não se separam mais, e dessa forma Celie desperta um desejo diferenciado, a sua sexualidade começa a ser explorada por sua mentora. Devido aos abusos sexuais do padrasto, e depois de casada com Albert, apesar de ter tido experiências com homens, Celie parece ser retratada como alguém que não apresenta qualquer desejo sexual, pois não conhece seu corpo e sua feminilidade. Tais exemplos desse fato podem ser vistos abaixo, nos trechos momento da conversa em que as duas comentam sobre as experiências sexuais com Albert:

Você gosta de dormir cum ele? Eu pergunto.

Gosto, Celie, ela diz, eu tenho que confessar. Eu adoro. Você não?

Não, eu digo, Sinhô pode dizer procê, eu num gosto de jeito nenhum. Como é? Ele trepa em cima da gente, levanta a camisola até a cintura e infia. Na maioria das vez eu finjo que num tô lá. Le nunca repara a diferença. Nunca me pergunta como eu me sinto, nada. Só faz o negócio dele, sai, via dormir.

Ela cumeça a rir. Faz o negócio dele, ela diz. Faz o negócio dele. Ora, Miss Celie. Do jeito que você fala parece que ele pensa que você é um banheiro.

É assim queu me sinto, eu digo.

Ela pára de rir.

Você nunca gostou de jeito nenhum? Ela pergunta, espantada. Nem cum o pai de suas criança?

Nunca, eu digo..

Ora, Miss Celie, ela diz, você inda é uma virgem. (WALKER , 1986 p.77)

Quando ela começa a sentir desejos por Shug Avery, as duas começam a sentir desejo sexual pela outra:

(...) A primeira vez queu vi inteiro o longo corpo negro da Docí Avery com os bico de peito que nem ameixa preta, parecendo a boca dela, eu pensei queu tinha virado homem. (WALKER, 1986,p.61)

Celie se apaixona por Shug Avery e com ela descobre o prazer sexual. A partir dali ela começa a ser moldada por Shug Avery e a relação das duas começa a aflorar. Agora começa uma nova história, pois conhece um amor de verdade, em que é amada por uma mulher de sua mesma raça, que lhe aceita do jeito que é, que veio para lhe trazer paz e proteção. Vivendo esse amor, é perceptível o quanto as duas estão próximas. Dessa forma, com a presença de Shug, a vida de Celie vai melhorando e assim as ofensas e maus tratos do seu marido vão diminuindo: “Ele num tá mais batendo em muito em mim desque você Fez ele parar”, eu falei. “Só um tapa uma vez ou outra quando Ele não tem o que fazer” (WALKER, 1986,p.127).

Uma das boas ações de Shug é descobrir as cartas da Nattie, que o senhor esconde da mulher. Sendo assim, Celie descobre que sua irmã não está morta, e sim que havia partido como missionária para África. A partir das leituras dessas cartas, Celie vai descobrindo suas origens, e vendo como os negros estão conquistando seu espaço, através dos olhos de Nattie:

Escuta, Celie, Nova Iorque é uma cidade linda. E os negros têm um bairro inteiro só deles chamado Harlem. Tem mais negro andando de carro de luxo do que eu poderia imaginar existir, e morando em casa mais bonitas que qualquer branco da nossa cidade. (WALKER,1986,p.154)

Celie sempre tem recordações ruins dos homens, pois a dominação masculina da época prevalece. Elas sempre se mantem calada, nunca se impõe diante de qualquer situação, seja lá qual seja. Sofre abusos, violência, maus tratos, e sempre conta para Deus tudo o que sente em suas cartas, até que ela acaba se vendo sem saída e desistindo até da fé. Pensa que como Deus é homem, ele também não vai escutá-la por ser negra, que se caso ele já tivesse dado atenção às mulheres negras elas não sofreriam tanto. Mas Shug lhe encoraja a não se deixar dominar por esses sentimentos, que a imagem que ela tem de Deus está errada e que ela não deve compará-lo com os homens , fazendo Celie refletir que ela não deve se sentir inferior, que ela como mulher tem forças para superar essas memórias negativas e não se deixar abater, e sim ser firme com sua feminilidade, como podemos observar nesse trecho:

O homem corrompe tudo, a Shug Avery fala. Ele tá na sua cumida, na sua cabeça, e o tempo todo no rádio. Ele tenta fazer você pensar que ele tá em todo lugar. E quando você pensa que ele tá em todo lugar, você começa a pensar que ele é Deus. Mas ele num é. Quando você tiver tentando rezar e o homem se estatelar lá no fim, diga pra ele se mandar, a Shug Avery fala. Invoque as flores, o vento, a água, a pedra . (WALKER, 1986 , P. 218)

Celie Já não tem mais motivos pra aguentar tamanha humilhação, e devido a isso uma nova mulher começa a surgir, mais corajosa e pronta pra enfrentar o homem que tanto lhe faz mal. Ela já está cheia de aguentar tudo calada, quando percebe que só ela mesma pode mudar o rumo das coisas e já não se importa mais com o que irão pensar. Simplesmente se segura até uma oportunidade de desabafar na cara de todos e principalmente de Albert, sua insatisfação para com esse homem com quem conviveu por tanto tempo e do qual só tem más recordações :

Você é um cão ordinário, é isso que tá errado, eu falei, já é hora de deixar você e começar a viver. E o seu cadárver será o bom começo queu priciso . O que você disse? Ele perguntou. Istatelado. Todo mundo em volta da mesa ficou de boca aberta.

Você afastou minha irmã Nattie pra longe de mim, eu falei. E ela era única pessoa no mundo que me amava. (WALKER, 1986,p.222)

Shug finalmente vê Celie mostrando o seu poder como mulher. O silêncio é quebrado, sua voz é consequentemente ouvida e com certeza ela está ali dando um ponto final àquela vida de sofrimentos. Shug Avery é com certeza uma heroína ela que consegue plantar em Celie a semente feminina fazendo-a enxergar que tem que se amar e procurar motivos para isso. Um exemplo de mulher livre e independente, Shug é um modelo seguido. A convivência da protagonista com mulheres fortes ao longo da história, motiva Celie e a faz perceber que a felicidade ainda é possível. Porém ela tem que enfrentar seus medos, sem desanimar, buscar forças onde não há, até perceber que só ela terá a honra de quebrar essa. Exemplo de garra, Celie protagoniza a realidade da mulher negra do sul dos estados Unidos há mais de um século atrás, sendo mais uma das que conseguem se libertar da opressão masculina, consequentemente construindo um novo caminho e novas experiências a serem vividas.

5- Análise do Enredo

Celie Johnson, uma mulher negra que tem um passado marcado por muitos traumas psicológicos, vive em uma sociedade que menospreza os negros. Por muitos anos é vítima do machismo opressor, onde criança é estuprada pelo padrasto, que consequentemente a engravida por duas vezes, tem dois filhos o quais lhe são tirados após as primeiras horas dos nascimentos, e vendidos como se fossem objetos. Mais adiante é vendida a um viúvo conhecido como “Sinhô” em casamento. Diante disso sua vida vai ficando mais difícil, ela não tem felicidade e sua carga de tarefas só fez aumentar. Além de escrava sexual do marido, ela é obrigada a cuidar da casa e dos filhos do seu esposo. Diante de tais fatos, podemos ver que Celie representa a situação das mulheres negras da época, em que a mulher buscava direitos iguais e que pudesse ser aceita, tanto pelo gênero como pela a raça. Ao contrário de muitas, Celie é um grande exemplo de superação, apesar de não ter sido fácil, ser vítima desses homens por tanto tempo.

Na nossa concepção, a identidade da protagonista Celie, vai sendo construção através dos exemplos de outras mulheres negras fortes da . Que são rebeldes aos comandos masculinos. Celie cansa da vida que leva, e quer apagar de vez os seus sofrimentos passados: O abuso sexual do padrasto, a separação da irmã, as violências pelo marido, as humilhações que sofre por se negra. A convivência com essas mulheres fortes é o que mais a motiva a começar a construir um novo futuro. Ela, como sempre fora submissa aos homens, ficava observando, a forma com que Sofia, que é casada com seu enteado Harpo, resiste ao seu machismo, quando este quer impor-lhe limites e obediência, o quanto a nora é forte e não admite maus tratos, revidando qualquer tipo de violência ;

Eles lutam. Ele tenta dar um bofetão nela. Pra que que ele faz isso. Ela agacha e pega um pedaço da lenha do fugão e senta nele bem no meio da cara. Ele acerta ela na barriga, ela se dobra gemendo mas levanta com as duas mão agarrando bem a parte baixa dele. Ela continua de pé só com a roupa de baixo. Ela nunca mexe nem um olho. Ele pula pra dar uma porrada no queixo dela, ela joga ele de longe. Ele cai pumba! Contra o fugão. (WALKER,P49)

Celie, presencia a força de Sofia contra o Harpo, seu esposo, percebendo que ela não tem medo de enfrentá-lo. Ela sente inveja da firmeza de Sofia, pois ela nunca permitiu ser humilhada, e nem aceita ser espancada pelo homem com quem vive. Celie sabe que não dá conta de fazer isso, pois lhe falta coragem e o medo dos homens lhe consome. Mas o fato de ter presenciado, e visto a força de Sofia, com certeza lhe traz muitas reflexões, já que aguenta tudo calada. Sofia representa a mulher negra que luta por direitos iguais, e na nossa concepção é um exemplo para Celie, já que a luta das mulheres no século XX estava cada vez mais forte e elas buscavam mais respeito.

Mesmo percebendo que ela também não deve aceitar os maus tratos do seu marido, Celie não tem saída, pois não tem onde morar, é dependente dele em tudo e não existe uma motivação para tal, desde que a única pessoa que a ama tinha ido embora, sua irmã . Ela tem que se contentar e sublimar seu sofrimento através da escrita que aprendeu com a irmã Nattie, expressando seus sentimentos e sua situação através de cartas para Deus, onde consegue desabafar as agruras da sua vida.

Eis que surge novamente no caminho de Celie outra mulher forte, Shug Avery, da qual já falamos antes, uma mulher negra, cantora de blues amante do marido da narradora, que por ironia do destino precisa de cuidados, e é trazida pelo “Sinhô” para passar um dias com eles, tocando a Celie a responsabilidade de cuidar da enferma . A convivência entre as duas vai gerando uma grande amizade, em que Shug Avery, é a principal responsável pelo encorajamento de Celie a deixar aquela vida para trás. Assim como Sofia, Shug não se deixa vencer pelos homens, é independente e bem-sucedida na vida. Ela abre os olhos de Celie em relação aos homens, e lhe ensina a se amar do jeito que é, e ter orgulho da sua raça.

O letramento de Celie, graças a sua irmã Nattie, é algo que a ajudou muito a compreender mais suas origens, e ter a possibilidade de um dia poder fugir, como ela mesma diz:

Nós duas, a gente dava duro nos livros da escola da Nettie, porque a gente sabia que tinha que ser isperta pra poder fugir. Eu sei queu num sou bonita nem tão isperta quanto a Nattie, mas ela falou queu num sou boba. (Idem, p.19)

Essas mulheres negras, não tinham outros meios de se livrar dos seus opressores, ao não ser procurar suas próprias melhorias, estudando, mesmo que fosse escondido, lutando contra a autoridade masculina ou até mesmo Celie encontrando a cada dia um motivo pra seguir em frente. E é assim, juntando forças, que Celie Johnson encoraja-se a fugir, a sair de vez de perto do marido que tanto lhe atrasa a vida. Shug Avery, grande responsável por abrir os olhos de Celie, leva- a embora dando-lhe novas possibilidades de um futuro. Celie então é livre, e pode fazer o que quiser para tentar a vida, em Memphis, cidade para onde escapa com Shug Avery.

Celie começa a ganhar dinheiro com a produção calças compridas femininas, que fazem grande sucesso, deixando-a cada dia mais conhecida e poderosa. Sua vida da o pontapé para um grande avanço pessoal, que desemboca na aquisição da sua identidade, pois uma mulher negra com passado massacrado e manchado por grandes hematomas físicos e mentais, entra no mercado de trabalho trazendo ideias revolucionária para a moda :

Vamos botar um anúncio no jornal, ela falou. E vammo aumentar bem o preço dessas calça e vamos fazer ainda mais, vamos deixar você ficar com esse salão como ateliê e vamo botar mais umas mulher aqui pra cortar e costurar, enquanto você fica lá atrás e desenha. Você já tá ganhando sua vida, Célie, ela falou. Mulher, você ta indo em frente . (Ibidem, p..237)

Celie finalmente conquista sua independência. É uma mulher negra que está feliz em todos os sentidos, sabe que logo irá encontrar com sua irmã Nattie, da qual foi separada na juventude, e que é a única representação de amor de que podia recordar na sua família.

A trajetória de vida é um exemplo de superação, pois ela apesar de não ter bons motivos de acreditar numa vida melhor, mesmo assim encontra motivações de seguir em frente. Uma nova fase começa e com ela o desejo de mergulhar de cabeça numa vida que até então havia sido considerada impossível e que agora se apresentava como real. Finalmente Celie está feliz e satisfeita com tudo que lhe acontece. O silêncio é quebrado e agora ela anda com suas próprias pernas, e de cabeça erguida sempre: “Querida Nattie, Eu tô tão feliz. Eu tenho um amor. Eu tenho um trabalho. Eu tenho dinheiro, amigos e tempo. E você tá viva e logo vai voltar pra casa com nossas crianças”. (WALKER, 1986, P. 238) Celie representa a situação da mulher negra da zona Rural do Sul dos Estados Unidos no começo do Século XX. A luta por seus direitos e uma sociedade mais passiva. Muitas mulheres tiveram seus direitos de se expressar violados, sofrendo os piores tipos de preconceito. Porém a perseverança histórica dessas mulheres fez o diferencial. Com muita garra enfrentaram a sociedade machista, que mesmo nos dias atuais ainda desfila certos preconceitos. Estas heroínas a cada dia mais ocupam e lideram o espaço feminino.

6- CONCLUSÃO

Em A cor Púrpura pudemos analisar a construção de Identidade da personagem principal, Celie Johnson, representando a condição social da mulher negra na zona rural do Sul dos Estados Unidos no início do século XX. O romance nos trouxe várias reflexões sobre diversos aspectos dos preconceitos sofridos por essas mulheres, que tiveram uma luta árdua em busca de aceitação e igualdade social.

Celie passou por um processo lento de aquisição de sua liberdade e consequentemente de sua identidade como mulher, e para isso teve influências femininas fundamentais nas figuras de outras mulheres da narrativa até conseguir construir sua identidade e prosseguir sua vida como merecido. Esse trabalho nos faz ter a percepção da luta feminina inclusive das mulheres negras que sofriam duplamente as agressões masculinas por serem negras e mulheres, tidas apenas como objeto sexual e escravas do lar, que tinham suas vidas determinadas pelos pais ou maridos que as tratavam como mercadorias.

A obra também retrata a grande importância do letramento para o empoderamento dessas mulheres, que com essa evolução foram adentrando a sociedade, tendo acesso aos conhecimentos e tornando-se seres críticos, abrindo assim novos caminhos e oportunidades de se libertarem das correntes da ignorância e da subserviência.

REFERENCIAS

BOURDIEU, Pierre. A dominação Masculina. Tradução de Maria Helena Kuhner. Rio de Janeiro:Bertrand Brasil, 2002.

FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Tradução de Renato da Silveira. Salvador: EDUFBA , 2008.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Paulo Editora. Rio de Jnaeiro: DP&A Editora 2006.

MASSETO, Marcos Tarcísio. Didática: Aula como centro. 4 ed. São Paulo: FTD, 1997.

WALKER, Alice. A Cor Púrpura. Tradução de Peg Bodelson, Betúlia Machado e José Silveira. São Paulo: Círculo do livro, 1986.

Ma Júlia Araújo
Enviado por Ma Júlia Araújo em 16/03/2023
Reeditado em 17/03/2023
Código do texto: T7741779
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