O dia em que a Santa Casa de Misericórdia de Manaus fechou

No dia 21 de novembro de 2019, o prédio da antiga Santa Casa de Misericórdia de Manaus, localizado na rua 10 de Julho, no Centro, foi comprado, em leilão, pelo Grupo Ceuni Fametro, que se comprometeu em preservá-lo e transformá-lo em hospital universitário. Aparentemente um novo capítulo, mais feliz, começa a ser escrito. Vamos nos lembrar, no presente texto, de como se deu o fechamento desse hospital.

Construída entre 1873 e 1880, a Santa Casa de Misericórdia de Manaus funcionou até 2004. A partir de seu fechamento, o histórico prédio onde várias gerações de amazonenses - da capital e do interior, - foram atendidas, entrou em processo de deterioração, transformando-se em abrigo para pessoas em situação de rua, usuários de drogas e criminosos.

Desde a década de 1990 a Santa Casa de Misericórdia de Manaus sofria com problemas financeiros. Em 1999 a dívida com fornecedores, funcionários e previdência já era de 700 mil reais. Mesmo com inúmeras dificuldades, em 2002 o hospital realizou 2.905 cirurgias, 5.723 partos, 3.123 internações de adultos e 540 internações de crianças (JORNAL DO COMÉRCIO, 08/10/2003).

Em 2003, um ano antes do fechamento, no Governo de Amazonino Armando Mendes, a Santa Casa de Misericórdia perdeu o convênio com o Governo do Estado, convênio esse que lhe garantia um repasse mensal de 300 mil reais (JORNAL DO COMÉRCIO, 27/01/2004). O hospital possuía cerca de 450 funcionários, mas à medida em que a crise se agravava, foram ocorrendo demissões voluntárias. No fim, restaram apenas 260.

A justificativa do Governo do Estado do Amazonas para dar fim ao convênio foi de que a administração da Santa Casa teria apresentado irregularidades na prestação de contas, o que motivou o fim do acordo (TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, 2016). Tinha início o fim da Santa Casa de Manaus. Até a decisão pelo encerramento de suas atividades, ela se manteve através de doações de empresários, shows beneficentes e bazares, o que já vinha ocorrendo desde fins dos anos 90. A Provedoria da Santa Casa tentou um empréstimo junto a Caixa Econômica Federal, mas este foi recusado pelo órgão. Em 2003 foi realizada uma campanha, Santo de Casa faz Milagre, destinada às pessoas interessadas em contribuir financeiramente para a sua manutenção. Poderiam ser doados 10, 20 e 30 reais através de ligações (JORNAL DO COMÉRCIO, 08/10/2003).

Pensava-se que aquela seria uma crise passageira, pois problemas financeiros eram recorrentes na área da saúde. No entanto, daquela vez, a crise veio para ficar.

Sem remédios no estoque e sem ter dinheiro pagar os funcionários, em outras palavras, sem ter como continuar suas atividades, no dia 7 de dezembro de 2004 a Santa Casa de Misericórdia de Manaus fechou as portas. Terminou seus dias com uma dívida estimada em 4 milhões de reais (ESTADÃO, SP, 07/12/2004). Como última alternativa, o Governo do Estado do Amazonas, já no mandato de Eduardo Braga, em 2005, tentou assumir a Santa Casa e administrá-la através do contrato de comodato para contornar a situação, mas nada foi acertado.

Seu fechamento representou diferentes perdas. A perda do patrimônio histórico do século XIX, símbolo das transformações da área da saúde naquele período. Perda da dignidade, tanto de pacientes quanto de funcionários, abandonados e sem receber seus vencimentos. Em síntese, uma tragédia de grandes proporções.

Que venham dias melhores...

FONTES:

Jornal do Comércio, 08/10/2003.

Jornal do Comércio, 27/01/2004.

Estadão, SP, 07/12/2004.

Tribunal de Contas da União, TC 015.588/2009-7, 2016.