A UNIVERSIDADE PÚBLICA É DE TODOS NÓS

O curso superior representa muito pra mim, pois cresci em um contexto onde filho de pobre não tinha que se formar. Ler, escrever e fazer conta era o bastante. Na infância, eu era a sobrinha da empregada doméstica e nas férias minha “diversão” era passar dias com ela, ajudando-a nos afazeres da casa gigantesca, de muitos quartos, cada um com um banheiro, que precisavam ser lavados um por um. Ou então ir com a família dos patrões para casas de praia para ajudar nos serviços, enquanto todos se divertiam e tomavam banho de piscina. Talvez por isso eu nunca tenha sido muito feliz com a tradicional redação “minhas férias” no retorno às aulas.

Na minha ignorância, eu acreditava que uma matuta, vinda do interior, filha de pais sem muita instrução, tinha mais era que ser grata à oportunidade de trabalhar para ganhar uns trocados. Na adolescência, eu era a faxineira. Minha tia, já envelhecida, mais pelo tempo de serviço do que pela idade, precisava de ajuda. Em certa época fui também a lavadeira. Eu lavava e passava as roupas da família dos “ricos”, do pessoal “mais ou menos”, como dizia minha mãe, como forma de garantir o dinheiro do transporte para a escola (já no ensino médio).

Diante da pobreza, minha formação não se daria de outra forma que não fosse por meio da escola pública e, posteriormente, da universidade pública. A “neguinha” se formou. E agora se sente incomodada com a leitura de mundo que faz, com os acontecimentos políticos que visam o desmonte das universidades públicas. A “neguinha”, movida pela curiosidade e sede de conhecimento, quer saber, quer se informar, quer investigar sobre tudo o que está acontecendo; quer entender como o Ministério da Educação declara guerra à educação. Que governo é esse, meu Deus!

Hoje, se estou a um passo do título de Especialista em linguística aplicada e ensino de línguas estrangeiras, também pela UFC, foi graças à educação pública e gratuita. Fazendo faxina eu jamais conseguiria acesso à universidade paga! Lavando roupa pra fora eu jamais teria garantido o curso superior e com ele as possibilidades de ascensão profissional e visão de mundo por mim alcançada, repito, graças à educação pública e gratuita.

Por isso temo o retrocesso ao qual estamos sujeitos, diante das ações pouco democráticas do atual (des)governo que veio com um projeto muito bem definido. Corte de verbas da educação e redução no repasse às universidades federais são ações que invalidam tudo o que se propôs até aqui, na perspectiva da educação como prioridade para o desenvolvimento humano e o consequente crescimento do país.

Para finalizar, quero esclarecer que universidade não é balbúrdia, termo utilizado pelo senhor Ministro da Educação para justificar redução no repasse a universidades federais. Talvez ele tenha se baseado na sua própria experiência.

Posso dizer, pelo que tenho vivenciado na UFC desde 2011, que o argumento do Ministro é totalmente descabido, pois a minha universidade é destaque nos rankings da vida, aparece entre as melhores do mundo, o que não poderia ser diferente, pois conta com um quadro de excelentes professores, comprometidos com a formação de profissionais de diversas áreas, e vem contribuindo sobremaneira para a sociedade cearense.

Um pouco mais de respeito com essa casa que me recebeu e me formou, e com meus professores, merecedores de reconhecimento e gratidão, seria razoável.

Maria Celça
Enviado por Maria Celça em 07/05/2019
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