A Construção da Didática em Uma Perspectiva Histórica
A educação, enquanto prática sistematizada, iniciou-se no Brasil em 1549, com a chegada dos jesuítas. Eles foram os principais educadores de quase todo o período colonial, atuando até 1759. A proposta pedagógica instituída pelos jesuítas direcionava-se à catequese e à instrução da população indígena, materializando-se no Plano Geral de Estudos, denominado Ratio Studiorum, baseado nos pressupostos de uma formação de cultura geral, universal e humanista; i.e., na visão essencialista do homem. Essa concepção enxerga o homem como constituído por uma essência universal e imutável. Tal essência é considerada criação divina e, nessa direção, o homem deve se empenhar para atingir a perfeição, para fazer por merecer a dádiva da vida sobrenatural.
Após a expulsão dos jesuítas, em 1759, novas diretrizes educativas foram instituídas pelas reformas Pombalinas; entretanto, tais proposições e a nova organização do ensino representavam um retrocesso para a educação brasileira, uma vez que essas reformas instituíram a presença de professores leigos para ministrarem as “aulas régias”.
No final do século XIX, suprimiu-se o ensino religioso das escolas públicas, surgindo a escola laica. Nesse contexto, tomam corpo movimentos cada vez mais independentes da influência religiosa, o que ajuda a provocar uma revolução em termos pedagógicos.
No período do império, muito pouco foi feito pela educação no Brasil. Em 1889, Ferreira Viana, ministro do Império, dizia ser fundamental formar “professores com a necessária instrução científica e profissional”. Contudo, poucas eram as escolas existentes, e apenas 12% da população em idade escolar estava nelas matriculada.
Em 1890, a Reforma de Benjamim Constant – Primeira Reforma Republicana – apresenta um novo panorama no cenário educativo brasileiro, na medida em que legitima os princípios da pedagogia tradicional leiga. Tal vertente também sustenta a visão essencialista de homem, porém despreza a ideia de criação divina, articulando sua concepção de homem à racionalidade. Essa perspectiva inspirou a criação da escola pública laica, universal e gratuita.
A Revolução de 1930 foi o marco referencial para a entrada do Brasil no mundo capitalista. A nova realidade passou a exigir uma mão de obra especializada e, para tal, era preciso investir na educação. Com isso, entre as décadas de 30 e 50, alguns acontecimentos merecem destaque no segmento educacional, entre os quais: a criação do Ministério da Educação e da Saúde Pública (MES); a Reforma Francisco Campos (1931); o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova (1932) e a paralisação dos debates educacionais (1937) em função do Regime Ditatorial.
A Reforma Francisco Campos foi a primeira de caráter nacional, realizada pelo então ministro da Educação e da Saúde. Ela instituiu a adoção do regime universitário para o ensino superior, criando a primeira universidade brasileira e organizando o ensino comercial. A reforma deu uma estrutura orgânica ao ensino secundário, comercial e superior. Estabeleceu definitivamente o currículo seriado, a frequência obrigatória, o ensino em dois ciclos. Além disso, equiparou todos os colégios secundários oficiais ao Pedro II, mediante a inspeção federal, e deu a mesma oportunidade às escolas particulares que se organizassem, segundo o decreto, e se submetessem à mesma inspeção.
Com relação ao ensino de línguas estrangeiras, a reforma introduziu mudanças não somente no conteúdo, com maior ênfase às línguas modernas (francês, inglês e alemão, em detrimento do Latim), mas na metodologia, com o uso do Método Direto.
O início do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova (1932) apresentou uma nova proposta para a escola em face da sociedade industrial emergente. Essa perspectiva, reação às tendências exclusivamente passivas, intelectualistas e verbalistas da escola tradicional, tem como base de todos os seus trabalhos a atividade espontânea, alegre e fecunda, dirigida à satisfação das necessidades do próprio indivíduo. A Escola Nova concebe o homem como um ser que deve participar de todas as dinâmicas sociais, mesmo que a sociedade na qual ele está inserido encontre-se estratificada; defendendo, assim, os princípios democráticos. Essa vertente percebe a existência de variadas problemáticas educacionais; no entanto, entende que tais problemas se constituem como questões pertinentes à escola e que, por isso, cabe a ela solucioná-los. Sua didática, portanto, é pensada como um somatório de métodos que privilegiam o caráter instrumental – prático-técnico – do ato de ensinar e, nesse processo, teoria e prática são justapostas.
Até o final dos anos 30, as Faculdades de Filosofia e de Educação formavam professores para lecionar apenas no curso secundário. Em seus cursos, na parte pedagógica, havia a disciplina Metodologia do Ensino Secundário, que seria equivalente à atual Didática. Em 1939, a Didática é reconhecida como disciplina dos cursos de formação de professores em nível superior. Em 1941, o Curso de Didática passou a ser considerado curso independente, realizado após o término do bacharelado.
Nos anos 60 buscou-se implementar no país um projeto desenvolvimentista, que tinha por objetivo acentuar o crescimento socioeconômico. Nessa perspectiva, a instituição escolar desempenhava um papel fundamental: preparar o capital humano necessário à incrementação do crescimento econômico e tecnológico do Brasil. Surge, assim, a didática tecnicista. Tal abordagem seguia o modelo empresarial do taylorismo e do fordismo e enfatizava o behaviorismo. A técnica passa a se configurar como objeto central no processo de ensino e de aprendizagem. A racionalidade é enfatizada. Assim, surgem a instrução programada, os módulos instrucionais, o controle da avaliação, a burocratização do planejamento e da ação pedagógica.
Com a abertura gradual do regime autoritário militar, em 1974, vários educadores e pesquisadores tecem uma crítica efetiva acerca da organização do sistema de ensino, denunciando as reais finalidades das políticas educacionais até então em vigor. Consequentemente, a prática didática sustentada nas escolas é questionada, emergindo, então, movimentos que preconizavam sua redefinição.
Na década de 80 instalou-se no Brasil a Nova República, dando-se início a uma nova fase político-econômica-social no país. Esse novo regime, porém, mantém muita coisa do período anterior. Entretanto, surge também novas propostas educativas que visam a inserção do homem nesse novo quadro de cidadania, sobretudo aqueles pertencentes às camadas mais pobres. Trata-se, pois, do surgimento de uma concepção crítica de educação.