O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO NA TEORIA PIAGETIANA: Epistemologia Genética de Jean W. F. Piaget
MATHEUS HIPÓLITO *
*Discente em Letras Vernáculas - Licenciatura
pela Universidade Santo Amaro - UNISA e Extensão
Universitária em Atualidades Socioeconômicas e
Políticas Brasileira pela mesma instituição.
O biólogo, epistemólogo e psicólogo suíço Jean Willian Fritz Piaget (1896-1980) é considerado umas das mais notórias mentes do Século XX. Com seus estudos, inovou a forma de entender os processos de evolução e operação mental das crianças em suas formas de pensar e agir face a cada atividade. Fundou a teoria da Epistemologia Genética, que culminou em inominável contribuição à Pedagogia e à Psicologia.
Enquanto pesquisador, debruçou-se durante toda sua vida a entender os processos de obtenção do conhecimento o que o fez estudar outros campos das ciências, como a Filosofia, a Epistemologia, Lógica e Matemática, além de Física e outros campos de estudo. Ainda novo, doutorou-se em Malacologia – ramo das Ciências Biológicas. – Desta forma, sua formação inicial exerceu forte influência sobre toda sua pesquisa, com os instrumentos empíricos empregados e o rigor do método científico em suas investigações em descobrir como o sujeito supina seus níveis de conhecimento, além do forte embasamento biológico em suas perquirições.
ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO COGNITIVO
O modelo teórico Piagetiano é classificado como interacionista. Isto significa dizer, que, o desenvolvimento da inteligência tem como premissa o contato do organismo com objetos; com o meio; de forma a permitir uma construção de arranjos de organização mental, que, por sua vez, permitem que o sujeito se adapte ao ambiente ao qual está inserido.
Todavia, este complexo processo ocorre de maneira gradual, de acordo com as exigências que o meio faz ao sujeito, provocando uma reconstituição na sistematização mental do indivíduo, como resultado de sucessivas assimilações e acomodações, regimes denominados por Piaget como Equilibração. Assim, quando o arranjo mental em que o sujeito se encontra não lhe permite incorporar novos aprendizados e informações, causando uma perturbação em seu organismo, ocorrendo a condição de Desequilíbrio.
Desta feita, infere-se que o recém-nascido tem pleno potencial para vir a se tornar inteligente, (desenvolvendo o que Vygotsky chama de Funções Psicológicas Superiores) conforme age sobre o mundo e constrói estruturas de operação mental que lhe permitem se adaptar a novas situações e ambientes, em uma sociedade dinâmica e virginalmente inédita.
Estes Estágios (ou Níveis, ou ainda, Estádios) são graduados entre zero a doze anos em diante, de acordo com o estágio com o que a criança se encontra e são denominados, respectivamente, como: Sensório-motor, Pré-operatório, Operatório Concreto e Operatório Formal.
Conquanto, quando a idade e os estágios avançam, não existe de nenhuma forma uma ascensão de maneira imediata, isto é: de maneira escalada; o desenvolvimento é, na verdade, uma incorporação do novo estágio adquirido aos estágios anteriormente desenvolvidos.
3.0 CONCEITOS ELEMENTARES
Antes de que haja maior aprofundamento no texto, é importante, no entanto o domínio de quatro conceitos que permeiam a teoria piagetiana:
ESQUEMA - Arranjo básico de pensamento que corresponde à estrutura biológica, a qual, muda e se adapta em consonância ao contato com o meio.
ACOMODAÇÃO - Modificação de um esquema para assimilação de uma particularidade existente de determinada assimilação. Este processo pode criar um novo esquema ou alterar um pré-existente, de modo que o novo estímulo possa ser incluído nele. Após conclusa, a criança tenta encaixar a acomodação em algum esquema, o que ocasiona o processo seguinte:
ASSIMILAÇÃO - Processo cognitivo de colocar e classificar novos eventos e informações em esquemas já existentes. É, em suma, uma incorporação do ambiente ao esquema ou estrutura do sujeito.
EQUILÍBRIO MAJORANTE / EQUILIBRAÇÃO MAJORANTE - Processo de busca de maior equilíbrio, assinalado por complexa organização cognitiva em um sistema interdependente que ocasiona ao sujeito adaptação à realidade.
4.1.1 ESTÁGIO SENSÓRIO-MOTOR | 0-2 ANOS
De modo sintético, é um período de adaptação e agregação da criança ao mundo que a rodeia através das percepções e ações, apenas reagindo por reflexos inatos. É uma etapa egocêntrica, de indiferenciação e isolamento onde a criança se vê só (o mundo se resume a ela mesma), pelo menos, no seu início.
Ao final desta temporada, a criança já se sente “integrante” do mundo “com objetos, tempo, espaço, causalidade objetivados e solidários, entre os quais situa a si mesma como um objeto específico, agente e paciente dos eventos que nele ocorrem” (LA TAILLE, 2003). A inteligência é imediata, prática, baseada na experiência direta com o mundo por meio dos movimentos e sentidos (olfato, audição, paladar, visão e tato).
A criança é restringida por suas limitações quanto à linguagem (que ainda não é formada), pela não recordação de eventos e ideias, de tal forma que não conseguem categorizá-las.
Pode-se observar como comportamento da fase Sensório-motor por excelência, o comportamento dos bebês. Ao contato com agentes externos, ele costuma “mamar” o que está em sua boca, tocar objetos, vê o que está diante de si, e à aprimoração deste esquema, pega o que vê e o leva à boca.
Este período é dividido por Piaget em seis subestágios que começam no nascimento. À priori, sofrem pouca acomodação, todavia, Piaget acreditava que os reflexos do ambiente provocavam uma primeira conexão do bebê com o ambiente. No início, os lactantes não têm capacidade de compreender a permanência de objetos (eles só alicerçam esta capacidade por volta do oitavo mês após o nascimento.)
Evoluem para a chamada Reação Circular, ou seja: começam atividades repetitivas e intencionais de práticas que ensejam prazer a eles próprios. É possível observar, nesta fase, que os indivíduos passam a prestar mais atenção em dados auditivos e apresentam maior capacidade de coordenar diferentes informações sensoriais, administrando seu universo tátil e visual. Com o passar do tempo, as reações circulares começam a se estender também às vocalizações e o foco da ação (repetitiva e intencional) passa ser externa, quando ele começa a usar brinquedos para obter satisfação por exemplo, explicitando a segunda fase deste comportamento que passa a ser secundário.
Por volta dos doze meses, a criança já é dotada de intencionalidade, comportando-se deliberadamente; capacidades aprendidas de esquemas previamente assimilados para atingir seus objetivos.
Entre doze e dezoito meses, pode-se verificar Reações Circulares Terciárias, onde a criança não apenas repete experiências anteriores, como também, testam novas, a fim de obter novas sensações.
O último subestágio, finalmente representa a transição da fase Sensório-Motora para a Pré-operacional da segunda infância. Nele, surge o domínio da permanência do objeto; a imaginação e o faz de conta; pensam antes de agir e podem resolver problemas; além de já possuir ideia de causa e efeito. Por fim, o final deste período de é caracterizado pela capacidade de retratar o mundo mentalmente sem precisarem recorrer à tentativa e erro para pensar sobre ele.
4.1.2 ESTÁGIO PRÉ-OPERATÓRIO | 2-7 ANOS
Neste período, a criança já não está mais limitada aos seus sentidos, pode manipular o ambiente simbólico por meio de suas representações e pensamentos no concernente à realidade, também é caracterizado pela capacidade de representar coisas e objetos por palavras, que são manejadas mentalmente. O estágio pré-operacional divide-se em duas fases.
Período Simbólico (2-4 anos) – Determinando o início deste período, surge a linguagem, no nível do monólogo coletivo. Vale ressaltar que “não se pode atribuir à linguagem a origem da lógica, que constitui o núcleo do pensamento racional” (COLL E GILLIÈRON,1987). A linguagem é entendida como essencial, mas insuficiente ao desenvolvimento, já que o desenvolvimento da linguagem está diretamente relacionado à inteligência. O aparecimento da linguagem proporciona mudanças importantes em aspectos cognitivos, sociais e afetivos, posto que possibilita interações interindividuais, ocasionando a habilidade de significar representações à realidade. Ademais, surge o desenho e a imitação. Criam-se imagens mentais na ausência da ação ou objeto. A socialização é vivenciada de modo isolado, porém dentro do grupo. Não existem líderes.
Período Intuitivo (4-7 anos) – “A idade dos porquês.” Aparece o desejo de explicação dos fenômenos existentes que a criança pode observar. O pensamento prossegue centrado em si, de maneira subjetiva e egocêntrica. Ainda que esteja pronta a adequar suas respostas a de seu interlocutor, a criança não consegue sustentar uma conversa por longo período.
4.1.3 ESTÁGIO OPERATÓRIO CONCRETO | 7-11 ANOS
Nesta fase começa o desenvolvimento do raciocínio lógico por meio do desenvolvimento da linguagem simbólica. A criança, neste estágio, substancializa noções de conservação de número, substância, volume e peso. É capaz de arranjar elementos por sua grandeza, incluindo conjuntos.
No que toque à organização social, participa de maiores grupos. Lidera e é liderada. Compreende regras, as obedecem e estabelecem compromissos. Agora, a conversação é possível, mas há dificuldade em chegar a uma conclusão por um ponto de vista em comum.
Nesta faixa etária, irrompe a capacidade de interiorização de raciocínio coerente, de acordo com La Taille (2003, p.17), as ações executadas mentalmente se referem, a objetos ou situações passíveis de serem manipuladas ou imaginadas de forma concreta. O entendimento das relações é notado partindo de sua possibilidade de testagem e especificidades.
4.1.4 ESTÁGIO OPERATÓRIO FORMAL | 11 ANOS EM DIANTE
As valências incorporadas na fase precedente são aprimoradas e obtêm uma melhor forma de equilíbrio, que se consolidará para vida adulta, o que, todavia, não significa que estas não possam vir a se estagnar a partir do auge obtido durante a adolescência. Desta feita, termina o desenvolvimento intelectual que persistirá por toda vida adulta da criança, mas o repertório teórico intelectual em aquisição e profundidade ampliar-se-á sobre o modo de operação mental estabelecido. De modo simplificado, o aprendizado continua, mas, a forma predominante de raciocínio se estaciona.
É possível se relacionar sobre proposições, caracterizados pela generalização do pensamento e aumento substancial no raciocínio, condicionando uma experimentação mais flexível. A manipulação das ideias abstratas torna-se possível neste momento, que é o desenvolvimento do pensamento hipotético-dedutivo ou lógico-matemático.
Se antes não era possível, agora a dialética é uma realidade tangível e praticável. Onde, mesmo que partindo de pensamentos abstraídos e divergentes, é possível chegar a uma conclusão após certo debate.
5.0 DESCONTINUAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
A teoria de Epistemologia Genética ainda prevê, que algumas pessoas por inúmeros motivos podem acabar estacionando em alguns dos estágios e não atingem o estágio formal do desenvolvimento que caracterizaria o funcionamento lógico-formal que possui o adulto.
6.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em vista do exposto, pode-se verificar que a Epistemologia Genética de Piaget, prevê um desenvolvimento contínuo, dinâmico e em estágios bem definidos por suas características muito específicas. Avançando e incorporando a fase anterior, quando o arranjo mental atual não permite assimilar novas informações e situações, causando a condição de desequilíbrio, no momento da acomodação. Com esta cadeia de eventos, (retomando, em que, a acomodação não se torna possível, gerando o desequilíbrio) o organismo busca o Equilíbrio Majorante, tentando, de modo muito complexo em sentidos fisiológicos, psicológicos e orgânicos, equilibrar os esquemas que regem a série organismo-indivíduo.
Os estágios, conforme enunciando anteriormente, variam de 0 a 12 anos, e atingem seu ápice de desenvolvimento no início da pré-adolescência, mas, o aprendizado não é interrompido. Aprofundando este escopo, é possível examinar, que, desde os 0 meses aos 12 anos (aproximadamente) o mesmo indivíduo elevou seu conhecimento e esquemas mentais de forma muito expressiva; da incipiência intelectual, à maturação de suas competências cognitivas.
Desta forma, observa-se a evolução: da ausência da permanência do objeto à possibilidade de trabalhar temas e fatos presumidos. E, em um raciocínio formal, conseguir chegar a uma conclusão em comparações e análises hipotéticas, mesmo havendo inumeráveis pontos de vistas de vistas diferentes (aceitando-os democraticamente.)
É necessário assinalar, que, ainda que pareçam sinônimos, há uma abissal distinção entre desenvolvimento e aprendizagem: O desenvolvimento é relativo à maturação das estruturas neuronais, onde o cérebro, deve funcionar de maneira integral e integrada, relacionando os recursos necessários à aprendizagem e ao pensamento de acordo com as exigências feitas do meio para o indivíduo, tendo processo de avanço gradual até o ápice de sua formação e o início de operações mentais formais. Por outro lado, a aprendizagem é a aquisição de novas informações e experiências, no processo de construção do conhecimento formal, implicando o envolvimento entre estímulos e suas respectivas respostas equivalentes, ocasionando a adaptação do sujeito ao ambiente.
Efetivamente, o desenvolvimento, termina (considerando estritamente a teoria em análise), por volta dos doze anos, variando de indivíduo para indivíduo. Mas, a possibilidade de aprender e se aprofundar em novos assuntos acontece de acordo com o interesse do discente, até condição incapacidade ou a inexorabilidade da morte.
Isto posto, em sentido lato, o desenvolvimento cognitivo humano para Piaget, é configurado como uma série de sucessivos desequilíbrios e acomodações constantes, onde o organismo buscará sempre a equilibração majorante, na aquisição do conhecimento.