EDUCAÇÃO E TRABALHO

EDUCAÇÃO E TRABALHO

No texto Educação e Trabalho: representações de professores e alunos do Ensino Médio, os autores Cândido Gomes, Clélia Capanema, Jacira Câmara e Lakné Cabanelas, traçam um percurso histórico para caracterizar o processo de ensino de adultos no Brasil, desde os tempos coloniais quando os padres jesuítas começaram a ensinar ofícios aos nativos que aprendiam nas oficinas as profissões de alfaiates, sapateiros, agricultores, carpinteiros, enfermeiros, etc.

Os europeus ensinavam a homens livres, negros e indígenas, pobres em geral, a construir edifícios, embarcações, fabricar sinos, relógios, ferramentas, instrumentos musicais, armas, peças de cerâmicas, remédios, armas, pólvora e outros instrumentos úteis. No império, já a partir de 1808 quando chegou ao Brasil a corte real portuguesa, nasceram os famosos liceus, institutos de educação, que em 1881, em São Paulo, já incluía cursos para mulheres.

Na república, com a chegada da industrialização, surgiram os cursos profissionalizantes que foram concebidos para formar trabalhadores para as fábricas, tendo como público os jovens de famílias pobres, negros e imigrantes. Por outro lado, os filhos dos fazendeiros, comerciantes, industriais, membros da classe média e da burguesia em geral, faziam cursos de profissionais liberais, para formarem-se em advogados, médicos, engenheiros, odontólogos, etc. Desde o início da formação do povo brasileiro estes dois pólos da educação ficaram bem demarcados, ou seja, bacharelado e doutorado para os filhos dos ricos, e cursos técnicos profissionalizantes para os filhos dos operários.

No texto os autores citam a CEPAL e UNESCO que afirmam que “o binômio educação e trabalho não pode ser considerado isolado do conceito de educação integral, mas é um aspecto fundamental desse novo mundo e do futuro da humanidade.”

Ainda são apresentados os resultados referentes a pesquisas realizadas em escolas do Distrito Federal pela Universidade de Brasília, que captaram as tendências e preferências no Ensino Médio. Entre os dados referidos estão os que demonstram que 68% dos estudantes dos EJAs têm no máximo 33 anos; que 89% já tiveram experiências anteriores nas escolas entremeadas de insucessos; que 72% dos alunos trabalham e querem melhorar de nível escolar e profissional. A tendência é utilizar a escolaridade como uma ferramenta para a mobilidade social desejada. Quem mais estuda, mais se qualifica para o mercado de trabalho, e assim cresce econômica e socialmente. Com esta lógica hoje vivemos um panorama onde surgem centenas de cursos e milhares de escolas por todo o país, com o paradigma da meritocracia e competitividade saliente no processo educacional.

Outros dados também demonstram que a maior preocupação dos alunos é com o crescimento da violência e uso das drogas, seguida por preocupações com meio-ambiente, pobreza, favelas, moradores de ruas e situação econômica do país. Também a satisfação com currículo, estudo de línguas, liberdade de expressão, utilização dos espaços escolares e outras informações são reveladas pela pesquisa.

O EJA, como opção de ensino alternativo, por ser praticado por jovens adultos que trabalham durante o dia e estudam à noite, recebe suas críticas por ser ensino de massa e sem a qualidade do ensino regular, com objetivo apenas de diplomar pessoas em curto período de escolaridade sem que estas recebam os conhecimentos necessários para enfrentarem cursos superiores. Porém esta afirmativa não pode ser vista como hipótese totalmente válida, pois muitos destes estudantes acabam por revelar bons resultados quando vão frequentar as faculdades.

No entanto podemos compreender que educação e trabalho caminham juntos há séculos em todas as partes do planeta, com suas peculiaridades regionais e culturais, porém revelando as complexidades que as sociedades modernas contêm em suas configurações econômicas e sociais. É um binômio que exige reflexões, reformulações e adaptações pertinentes para que se obtenha mais harmonia e eficiência no Ensino Médio, unindo os conhecimentos clássicos universais com estudos de novas tecnologias.

PEDAGOGIA E MODERNIDADE

O pensador polonês Zygmunt Bauman, o teórico da modernidade sólida e modernidade líquida, entrevistado pela professora Alda Porchedu para a revista Cadernos de Pesquisa, vol. 39, aborda o diálogo entre pedagogia e sociologia. Neste contexto ele vai revelando a perversidade da sociedade contemporânea em descartar objetos e conceitos, em nome de um processo brutal e galopante de consumismo, isso, sempre, para favorecer a corrida industrial proposta pelo capitalismo. Portanto, para Bauman, um dos desafios da pedagogia é enfrentar um modelo que aproveita um tipo de conhecimento pronto para utilização imediata, ou seja, para ser utilizado momentaneamente e depois “trocado” ou atualizado, como os softwares descartáveis. Seriam as duas faces de uma mesma moeda, a pedagogia como reprodução do conhecimento milenar acumulado pela humanidade e a necessidade momentânea de se enquadrar nos processos civilizatórios em permanente mutação.

No mundo mutável da modernidade líquida, para Bauman, “caminhar é melhor do que ficar sentado”, ou seja, avançar os processos pedagógicos é uma alternativa para melhorar a almejada aprendizagem, sem, no entanto, abandonar o conhecimento acumulado, e somar a este os conhecimentos novos. O autor ainda faz uma metáfora com o exemplo de um surfista para explicar seu pensamento quanto a relação de equilíbrio e a escolha das técnicas e práticas utilizadas para atingir seu objetivo.

A modernidade sólida, a era dos valores mais duradouros, era muito vigiada e isso implicava em utilizar a pedagogia para impor este conceito aos jovens humanos em formação para o mundo. Já na modernidade líquida, a pedagogia assume um papel social de propor mudanças em períodos menores de tempo, no entanto, com a ameaça do descompromisso. Estas variações de conceitos estão presentes no contexto educacional onde pratica-se a docência. Procuramos utilizar todo conhecimento acumulado pela história da humanidade e pela história da tecnologia como instrumento utilitário para a humanidade avançar dialeticamente. Forjamos realidades que muitas vezes não são duráveis e necessitam de transformações, tanto nos aspectos socioeconômicos que abrangem a sociedade, como no pedagógico que necessita se enquadrar aos novos enfoques e paradigmas, também forjados.

Para Bauman os educadores contemporâneos têm que “separar o joio do trigo” (esta expressão metafórica é minha aqui nesta resenha) dentro do “inferno” onde vivemos e praticamos a docência, ou seja, na escola e na sociedade, se é que entendemo-las como um imaginário inferno (aquele ambiente pegando fogo e gerando desespero nos condenados a este espaço descrito na Bíblia). E separar o joio do trigo pode ser aproveitar os bons momentos de convivência no espaço de tempo disponível para praticar o ensino, buscando participação ativa e aprofundada dos envolvidos docente-discente neste processo de ensinar-expor-entender-absorver.

A velocidade impressionante com que o conhecimento muda de rumo é referenciada pelo pensador polonês em sua entrevista. Seja no “inferno” ou no “paraíso” nos espaços da atividade educacional, temos que estar atentos e vigilantes quanto à manutenção do conhecimento acumulado, para expô-lo e criticá-lo, como devemos estar flexíveis para novas técnicas e prática pedagógicas que facilitem e causem interesse dos alunos. Só assim conseguiremos ter um aproveitamento maior para obtermos resultados melhores nesta relação imprescindível para a humanidade.

A configuração mercantilista no ensino, que substitui a relação aluno-professor por fornecedor-cliente, propicia um fortalecimento do individualismo, que ultrapassa as fronteiras do período escolar para a vida social. O mercado propicia soluções para tudo, prega-se, porém com um alto custo social nas sociedades atuais, com a concorrência acentuada, situações sociais diferentes e resultados de desigualdade social.

Para Bauman é importante atentar para que tenhamos uma escola que exerça processos de educação que se renovem permanentemente, para dar a nós mesmos a possibilidade de escolhas que estejam ao nosso alcance. Este fundamento nos coloca no que o autor classifica como modernidade líquida educacional, ou seja, o que restou no âmbito das reflexões sobre o sistema de ensino.

Isso vale para mortais de todos os continentes?

Fica mais esta questão para fragmentarmos o tema em regiões e culturas diversas do planeta.

VLADIMIR CUNHA DOS SANTOS
Enviado por VLADIMIR CUNHA DOS SANTOS em 05/11/2017
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