Nem Anjo, nem Demônio: o professor
Sabemos que um médico mal preparado ou mal intencionado pode causar extremos estragos na vida de uma pessoa, quando não extinguir esta vida. O médico lida com o corpo, pode fazer isto com boas ou más intenções, inclusive ser negligente para poder atender mais pessoas e ganhar mais.
Da mesma forma, o professor. O professor mal preparado ou mal intencionado pode causar muitos estragos. Por que apesar de não lidar diretamente com o corpo e a saúde do aluno, ele lida com sua auto-estima. O professor que transfere para o aluno a responsabilidade por seus limites didáticos e pedagógicos mina sua identidade e seus sonhos.
A questão é pensarmos no por que o aluno não aprende, não se interessa e não se compromete com as aulas. Os motivos geralmente escapam da alçada do professor individualmente ( como pintam certas revistas a serviços de redes particulares de ensino) que recebe um aluno com formação e histórico escolar precários.
Mas o que fazer com esta precariedade? Eu devolvo para a sociedade a responsabilidade? Devolvo para o aluno? Culpo as estrelas?
O professor não pode ser responsabilizado pela precariedade que as desigualdades sociais e políticas educacionais ruins criam e perpetuam. Mas cabe a ele decidir o que fazer com a precariedade diante de si.
Aí entre a competência do professor, pois ensinar alunos já motivados e realizados pessoalmente é fácil. Agora transformar a precariedade em esperança depende tanto de sua capacidade didática quanto de certa afinidade valorativa com a educação.
A educação implica em inclusão. Significa que o professor deve criar meios, procedimentos e ações que facilitem a aprendizagem. Se o professor só ensina para quem já tem facilidade, ele não está promovendo inclusão, pelo contrário.
Não faz sentido pensarmos em melhoria dos resultados educacionais sem pensarmos que isto depende do professor ser estimulado, cobrado e dado condições materiais para que facilite a aprendizagem.
Em relação a esta reforma do Ensino Médio, não vejo como ela poderia promover o que falta a educação para que ela avance. Não propõe valorização de um perfil de professor competente no sentido pedagógico e didático. Não propõe a renovação dos quadros através da valorização social e financeira de profissionais com perfis adequados para o desafio educacional de incluir apesar do peso que as desigualdades sociais possam ter.
Insisto na questão didática, mas do que na questão do domínio de conteúdo. Isto por que a aprendizagem não depende só do professor saber, mas dele saber ensinar. Se este professor não assume seus limites pedagógicos, ele vai transferir para o aluno a responsabilidade por sua insuficiente aprendizagem. Ele vai conseguir convencer o aluno que a responsabilidade por não aprender é sua pouca inteligência ou pouca força de vontade.
Ora, quem tem força de vontade ou interesse em concentrar em algo que não faz sentido para si mesmo? Preste atenção no por que conversam, no por que não querem, no por que não se dedicam.
É preciso que o professor considere todo o processo que leva a não aprendizagem. Saber ensinar é saber agir de forma que facilite a aprendizagem do aluno. Não basta só dominar seu conteúdo.
O aluno não se impressiona com eruditismo, ele se impressiona quando é alcançado na solidão dos seus pensamentos. Quando algo é dito ou feito que ao considerar lhe tira da confusão e da dúvida quanto a alguma questão ou problema.
Ao professor, que entende o poder e a responsabilidade do seu trabalho e tenta fazer da didática sua ferramenta para a transformação de pessoas, meus parabéns!