O Limite e a Tolerância
"Os maldizentes, como os mentirosos, acabam por não merecer crédito, ainda mesmo dizendo verdades. A maledicência é uma ocupação e lenitivo para os descontentes."
(Marquês de Maricá)
Há que ser intolerante com os que ultrapassam os limites da tolerância. Dos que fazem uso da ignorância e, sem mudar seus pré-conceitos, se alimentam da própria vaidade fazendo dos outros em sua platéia e, ultrapassam o limite da tolerância, fazendo uso da platéia para alimentarem a própria vaidade. A pobreza nunca foi desculpa para a falta de informação ou a falta de conhecimento ou de estudo. Uma frase de Umberto Eco revela bem a falta e o desinteresse das pessoas que se mostram auto suficientes sendo o que não são: "o mundo está repleto de bons livros que ninguém lê."
E a este efeito se soma "as pessoas cebola" que a cada camada que vai sendo descascada, mais se aproxima de um vazio de conhecimento. Afinal, as pessoas cebola não tem semente e não semeiam.
Ter recebido da vida pais analfabetos ou letrados não justifica o feito de ser o "mais ou menos" das pessoas "mornas"*. As que não são quentes nem frias, nem fedem e nem cheiram. As que escrevem um livro mais ou menos bom. Não são boas pessoas nem más, nem bons alunos tampouco ruins.
Não basta editar um livro para se considerar um escritor. Para tanto, há que se transferir o conteúdo pessoal e o conhecimento para o contexto da escrita. Um livro não pode ser uma cebola, não pode ser "morno", mais ou menos, uma simples recordação da vaidade pretensiosa para ser considerado escritor. Torná-lo num simples objeto de decoração de uma sala de visita. Os livros são importantes, importantes do verbo importar, o livro é aquele de quem importamos para dentro de nós o conhecimento, o lirismo poético, um novo aprendizado e a possibilidade de uma mudança de vida para melhor ou uma nova leitura da vida para melhor compreender a realidade.
A pressa é um passado mal feito. Cora Coralina que nos sirva de exemplo, publicando seu primeiro livro aos 76 anos de idade. Franz Kafka nunca publicou um livro em vida e todos os rascunhos foram editados após a sua morte em 1924, e é considerado pelos críticos como um dos escritores mais influentes do século XX. Tampouco William Shakespeare (1564-1616) nunca publicou um livro em vida. Só após ser reconhecido pela intelectualidade alemã que em seu país natal o considerou o único "Bardo", o poeta e dramaturgo, como o maior escritor do idioma inglês e o mais influente dramaturgo do mundo.
Ter um livro na estante não é ter apenas um livro na estante. Ter um livro na estante é ter um autor na estante. O livro é antes de tudo uma obra que o representa. "O livro pode transformar as pessoas e as pessoas transformam o mundo." José Saramago pesquisava por dois anos para iniciar um romance e não é por falta de mérito e dedicação que foi agraciado com o premio Nobel de Literatura.
Então, queres publicar um livro? Siga a sugestão de Saramago, saia de si e veja-se com humildade e responda: há talento e conhecimento para tornar-me um livro? Prudência, é o caminho mais longo e com menos riscos. Paciência, não importune parentes e amigos para custear a edição e, mesmo com recursos próprios, não entre no "Guinness" como o "book" menos lido do mundo. Nenhum livro merece conter uma alma tão pobre e pequena de espiritualidade.
Portanto, um texto de referência "O Limite e a Tolerância", abaixo transcrito, poderá ser útil para aqueles "mimados", que de sua majestosa superioridade, ultrapassam os limites dos outros e não fazendo uso da humildade em prol do aprendizado, contrariados na vaidade costumam rotular os outros de "intolerantes".
"Tolérance n’est pas quittance(7), que poderíamos traduzir por: "Tolerância não é liberdade total...". Numa pequena cidade do interior, um deficiente físico, sem pernas, perambulava pela cidade com auxílio das duas mãos e o apoio do tronco. Durante anos, no seu trajeto, era debochado por um homem que dizia: - Vai gastar o... Um dia ele perdeu a paciência e matou o importunador. Na justiça, o aleijado foi duramente atacado, e tido como assassino cruel. O advogado, ao iniciar a defesa, falou durante dez minutos elogiando a qualidade de cada membro do júri, até que o juiz interrompeu: - Se o senhor não iniciar a defesa, não permitirei que prossiga. Sabiamente, o advogado respondeu: - Meritíssimo, se o senhor não aguentou dez minutos de elogios, imagine a situação do réu que suportou anos de insultos... Nestes casos, pode valer o provérbio: "Não seja intolerante a menos que você se confronte com a intolerância"(8).
Ignorância e preconceito
As pessoas muitas vezes não atuam de modo errado por má fé, e sim por ignorância. Com certeza fariam de modo distinto, se soubessem como fazer. Esta tarefa não tem fim, e questionar-se sobre o empenho pessoal de diminuir o nível de ignorância, nos faria no mínimo reconhecedores da dívida social que carregamos. Aprendemos tanto, e por este motivo somos capazes de questionar as deficiências. Não são os professores e pais os únicos interessados. Ninguém dá o que não tem, e por isto sempre temos algo que dar a outrem, e assim diminuir a ignorância.
Outro ponto é o preconceito... O preconceito gera um prejuízo (e também um prejuízo). Uma ideia pré-concebida cria uma barreira para compreender a realidade. Uma pessoa que não queira ouvir, ver ou escutar, tem muitas vezes o preconceito de não aceitar que os outros possam pensar de modo diferente.
Considerações finais
A incapacidade pessoal provada, leva a ressaltar os possíveis limites alheios em vez de reconhecer os próprios.
No convívio social, a tolerância com os demais, clama por uma interação. Ou se ajuda, ou se atrapalha. A indiferença explica mas não resolve.
Mas a quem ajudar? E como ajudar? Castiga o bom e ele melhorará, castiga o ruim e ele piorará. Ou É melhor ensinar a pescar que dar o peixe. Como resolver situações pontuais, sem levar em conta o princípio da subsidiariedade? Se ajuda quem precisa, até que ela tenha condições de independência para aquele tipo de ajuda. Assim se respeita a autonomia, se exerce a autoridade, se compreende o verdadeiro valor da humildade.
As crianças mimadas representam um problema para a sociedade. As pessoas precisam de afetividade, mas mimar é dar mais do que elas realmente precisam. Com certeza, a tolerância e sua medida requerem um salutar e apaixonante exercício de análise e síntese. Esta é a postura de quem quer simplificar as coisas para ter o tempo livre, ou o ócio tão necessário em nossos dias.
Tolerância zero, é um tipo de lei social, que não permite o erro sem punição. Isto é levar em conta, que as pessoas são boas... Castiga o bom e ele irá melhorar... Mas o homem não é bom por natureza. Ele pode se fazer bom, se tem disposição de ser, pois o homem é um ser axiotrópico.
Não ter tolerância com qualquer tipo de erro, de certa forma ajuda a resgatar o que é próprio da personalidade humana: participação, unicidade, autonomia, protagonismo, liberdade, responsabilidade, consciência, silêncio, provisoriedade e religião. Höffner (1983). Cada uma das características do ser humano poderiam ser exploradas neste estudo, mas o protagonismo talvez seja o que mais atenção mereça. Somos sujeitos do nosso pensar, agir e omitir. Nossos atos assumem um caráter irrevogável do nosso eu. Podemos arrepender-nos, mas não nos desfazer nossos atos(10). E numa sociedade onde tudo é socialmente aceito, tudo acaba sendo tolerado. As pessoas perdem a noção do que é certo ou errado. A inteligência deixa de discernir, e a vontade fica fraca para agir. As pessoas prezam o que lhes é caro, e o dinheiro é caro a todos. Assim multar é uma forma de obrigar as pessoas a refletirem sobre si mesmas e a sociedade. Isto não é um direito, é uma tolerância(11).
Quem não vive como pensa, acaba pensando como vive. Aprender a observar a realidade do ser pessoal e do ser social é a melhor forma de compreender o limite que existe nas coisas e nas pessoas. Caso contrário, gastar-se-ia tempo moendo água, encontrando defeitos onde existem apenas características. Com certeza assim, seremos mais tolerantes com os outros e conosco próprios.
Para finalizar, vale a pena recordar os ensinamentos de Sócrates, recolhidos por Reale & Antiseri (1990) "A felicidade não pode vir das coisas exteriores, do corpo, mas somente da alma, porque esta e só esta é a sua essência. E a alma é feliz quando é ordenada, ou seja, virtuosa. Diz Sócrates: Para mim quem é virtuoso, seja homem ou mulher, é feliz, ao passo que o injusto e malvado é infeliz. Assim como a doença e a dor física são desordens do corpo, a saúde da alma é a ordem da alma - e esta ordem espiritual ou harmônica interior é a felicidade"(p. 92)."
http://hottopos.com/videtur5/o_limite_e_a_tolerancia.htm
Pessoas "mornas"
referência: https://portalsaibamais.wordpress.com/tag/cortella/