GÊNERO E FORMAÇÃO CONTINUADA: a construção de práticas pedagógicas em gênero e diversidade

Maria Neusa de Oliveira – email neusa_mel@hotmail.com

RESUMO:

O artigo apresenta as mais diferenciadas formas de preconceito e estereótipos acerca das relações étnico-raciais, das relações de gênero, da construção da identidade sexual, e da diversidade cultural no seio das duas instituições observadas. Sendo elas pertencentes à Secretaria Municipal de Educação - SME de Goiânia. Através de diálogos com textos faz uma análise reflexiva de que as posturas dos professores e professoras, podem aumentar as desigualdades sociais e o preconceito pra com aqueles tidos como fora da normatividade. As pesquisas e observações mostram como sendo emergencial a formação continuada, os novos saberes para o desenvolvimento das práticas educativas que, verdadeiramente, respeitem a todos com igualdade de direitos.

Palavras chave: Diversidade cultural e gênero X práticas pedagógicas – formação continuada

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa visa, a partir de dados coletados nas ações pedagógicas, planejamentos individuais e coletivos das unidades educacionais Parque Acalanto e Cantinho do Saber , de um lado, compreender como determinadas práticas e ações pedagógicas reforçam no cotidiano escolar as mais diferenciadas formas de preconceito e estereótipos acerca das relações étnico-raciais, das relações de gênero e da construção da identidade sexual. E de outro, o papel da formação continuada na superação destes estereótipos e preconceitos. Tais dados retirados foram dos Relatórios de Observação de Planejamento-ROP , produzidos no período de 2009 a 2011. Os sujeitos envolvidos na pesquisa são todos educadores e educadoras da Secretaria Municipal de Educação/SME Goiânia, órgão ao qual integro desde 1994.

Ao longo desses anos de magistério tenho presenciado no seio das escolas pelas quais passei as mais diferentes formas de manifestação de preconceito acerca das relações étnico-raciais, das relações de gênero, da construção da identidade sexual, além de maneiras estereotipadas de ver a diversidade cultural e a falta de respeito pelas diferenças, com modos de falar, agir e ser. Tais práticas estão presentes não só nas práticas cotidianas do corpo docente, mas também nos materiais didáticos utilizados pelos mesmos, tais como: músicas, filmes e também nos livros didáticos.

Considerando que a sociedade é fruto do que foi constituído ao longo do tempo e acreditando que o sentido da vida é construído etapa por etapa, pela família, sociedade e escola, temos o compromisso, enquanto cidadãos e cidadãs, de semear o futuro que sonhamos.

Desta forma, destaco a responsabilidade de cada um de nós, em fazer desta sociedade um lugar onde as pessoas possam ter igualdade de direito, acesso à educação de qualidade e viver com dignidade. E é função da escola enquanto “medidora do conhecimento” instigar a contribuição e transformação de cada um para a superação de obstáculos que ao longo do tempo, nós-sociedade, temos enfrentado. Cada qual com seus costumes, seus valores e suas crenças, objetivando assim nos tornar uma nação forte e solidária, com um olhar para a realidade presente, já focalizando o futuro em que nossas crianças serão protagonistas dos próprios destinos. Para isso concordo com Libâneo (1995) quando este afirma que:

Os educadores devem ajudar os estudantes a construírem seus próprios quadros valorativos [Ex: heterossexualidade e homossexualidade], a partir do contexto de suas próprias culturas, não havendo valores com sentido universal. Os valores a serem cultivados dentro de grupos particulares, são a diversidade, a tolerância, a liberdade, a criatividade, as emoções, a intuição (LIBÂNEO, 1995 p.24).

Nesta perspectiva é que se propõe a consolidação de uma discussão mais aprofundada daquilo que se compreende por organização do trabalho pedagógico. Para tanto buscarei dialogar com vários/as autores/as no intuito de fazer com que este estudo seja direcionado ao atendimento dos anseios dos profissionais das escolas campo. Mattéi (2002) observa que é através do enfrentamento da realidade que está posta que vislumbramos possibilidades de desconstrução de estereótipos “pré-conceitos”.

Pensando na seriedade dos problemas que podem ocorrer pela falta de conhecimentos necessários para lidar com temas tão complexos, e ao mesmo tempo tão comuns em nosso cotidiano, é que se faz urgente _ e necessário_ a formação continuada para docentes.

Observando as mudanças ocorridas no sistema de ensino e de atendimento aos alunos e alunas no ensino fundamental, pode-se verificar que a discussão que envolve a elaboração de propostas educativas no tocante ao preconceito e os estereótipos que cercam as relações étnico-racial, de gênero e sexual na sociedade e nas escolas, só ocorre em nível de questionamentos por parte dos docentes. Conforme Libâneo:

A realidade atual mostra um mundo ao mesmo tempo homogêneo e heterogêneo, num processo de globalização e individualização, afetando sentidos e significados de indivíduos e grupos, criando múltiplas culturas, múltiplas relações e múltiplos sujeitos (LIBÂNEO, 1995, p.15).

É nessa conjuntura de incertezas e reflexões que se busca compreender a importância do conhecimento e aprimoramento das atividades do/a professor/a para a elevação do nível de qualidade da educação escolar nos tempos atuais. São essas concepções que fazem com que pensemos na possibilidade de mudanças no campo educacional através dos processos de formação continuada dos professores e professoras, levando-os/as à reflexão sobre a sua prática pedagógica.

Segundo Morin (2001):

A cultura é constituída pelo conjunto dos saberes, fazeres, regras, normas, proibições, estratégias, crenças, ideias, valores, mitos, que se transmitem de geração em geração, se reproduz em cada indivíduo, controla a existência da sociedade e mantém a complexidade psicológica e social. Não há sociedade humana, arcaica ou moderna, desprovida de cultura, mas cada cultura é singular. Assim, sempre existe a cultura nas culturas, mas a cultura existe apenas por meio das culturas. (MORIN, 2001, p. 56).

No atual contexto social a escola e as práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores e professoras precisam contemplar as manifestações mais vastas da cultura que atuam cotidiana e dialeticamente na sociedade de forma específica ou tácita, não apenas nas representações e práticas individuais, mas também nas percepções gerais relacionadas ao gênero e à sexualidade, à etnia, à diversidade cultural, entre outros dispositivos que contribuem para moldar as representações de culturas permeadas pelas relações sociais, políticas, econômicas e ideológicas, historicamente construídos.

Nas buscas de teorias que levassem à reflexão acerca do fazer pedagógico, no tocante da diversidade cultural, de gênero sexual e étnico-racial tão emergentes no atual contexto escolar. Tentei manter um diálogo com algumas teorias e pesquisadores/as da educação. Reforçando a compreensão de que a formação continuada se faz necessária para a melhoria da qualidade da educação, para as mudanças sociais, bem como para as mudanças dos paradigmas de forma emergencial. Concordo com Louro (2010), quando alerta para o fato de que as práticas docentes podem contribuir para a eliminação, ou para o aumento das desigualdades.

Laraia (2001) destaca que:

[...] qualquer sistema cultural está num contínuo processo de modificação. É normal que, em um determinado momento do seu desenvolvimento, uma sociedade seja levada a abandonar ou a modificar alguma forma tradicional de sua cultura, à medida que esta não responde mais às expectativas e/ou necessidades [...] (LARAIA, 2001, p. 100).

Para tanto, a busca pelo conhecimento deve ser incessante, pois no atual contexto que vivemos é inadmissível professores/as apenas com o magistério como única formação docente, apesar de sua prática; os baixos salários; triplas jornadas e o desprestígio social da profissão. Não se pode mais fingir que não há práticas “do você finge que aprende que eu finjo que ensino ”; reafirmando a todo o momento a segregação e estratificação dos ditos “inferiores” pela sociedade, principalmente dos homossexuais e afrodescendentes. Em outras palavras, insistindo com um ensino que nada, ou muito pouco ensina, já que “persistem” altos índices de analfabetismo funcional e desigualdades sociais.

Guimarães (2004) afirma que “A prática profissional determina os contornos da profissionalidade a ser buscada nos processos de formação inicial e continuada e estes contribuem para a construção de novas práticas” (p. 30). Mostrando-nos a necessidade de que os afazeres pedagógicos precisam ir além da transmissão dos conhecimentos. Ele vai além quando nos mostra que “A docência é compreendida como um ofício pleno de saberes ou ‘feito de saberes’ que são construídos em ação e de maneira pessoal” (p. 30). Sendo ela pessoal cabe então a reflexão de si mesmo.

De acordo com Freire (1996), em Pedagogia da Autonomia: “não há nada mais que inferiorize o homem do que o ato de não saber ensinar”. Para ele a educação é um ato de ação-reflexão permanente que é possível ao homem, pois ele é um ser inacabado e que sabe da sua imperfeição. Freire acredita que ensinar é uma forma de intervenção no mundo, e através da educação é possível que ocorram mudanças em todos os campos da sociedade. Por isso, é importante que o professor seja crítico, e dessa forma a sua preparação científica é necessária, devendo estar sempre em busca de novos conhecimentos o qual denomino aqui de formação continuada, partindo da iniciativa de vir a ser um professor pesquisador.

Segundo Guimarães (2004): “Mediar a aprendizagem é uma atividade emocional, mas que envolve uma dimensão ética que vai desde o profissionalismo de medir as consequência da própria ação para a formação do alun@” (p. 52). Ou seja, refletir sobre sua prática docente e sua visão sobre a diversidade cultural de gênero e étnico-racial no intuito de promover educação com ética, responsabilidade e comprometimento com a qualidade para todos.

1 - AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COMO AÇÕES SEGREGADORAS

Foram pesquisadas duas instituições educacionais ligadas à Secretaria Municipal de Educação-SME de Goiânia, sendo uma de educação infantil e outra ciclada, com ciclos 1 e 2; localizadas, respectivamente, no Jardins do Cerrado I e Bairro Cidade Jardim. Nestas instituições, observei, de maneira geral, diversas formas de exclusão, algumas das quais em nome da inclusão. Muitas práticas docentes, a nosso ver, reafirmam e naturalizam a cultura dominante, em particular no que diz respeito ao tratamento que nossa sociedade dá aos negros, que ainda são tratados ora como coitadinhos, ora como um perigo social. Podemos verificar um exemplo disso no ROP da Unidade Parque Acalanto, no qual a responsável/coordenadora pedagógica faz a seguinte anotação sobre o planejamento da professora I , do agrupamento EI-C com crianças de 3 anos de educação infantil/turma D/ciclo(2):

“Não havia intencionalidades nas atividades dirigidas, e algumas atividades que geram discriminação, preconceito e até mesmo racismo, e outras que não contemplam todas as crianças, pois a maioria ainda não tem o domínio da oralidade.” (ROP – 19/02/2010)

A professora I propôs as seguintes atividades: em rodinha de conversa relatar fatos do cotidiano, cantar e dançar com as músicas “Bate bate colher na panela” e “Dança neguinha”, fazendo desenho de uma imagem de uma negra com vestimentas de cozinheira, colocando em um painel exposto na sala estrelinhas conforme o desenvolvimento das crianças. De acordo com as observações no ROP de 19/02/2010, as atividades poderiam gerar discriminação e preconceito, pois analisando as músicas trabalhadas: uma se trata de uma velha banguela e a outra de uma negra que nada sabia, e como nada sabia teria que apanhar. Tais músicas se trabalhadas sem o devido olhar crítico de desconstrução de estereótipos e preconceitos étnico-raciais e de gênero presentes em nossa sociedade. Atuariam como elementos de naturalização dos mesmos: lugar de mulher é na cozinha e aos/às negros/as cabem as tarefas “inferiores”; ou seja, os trabalhos braçais.

Minha hipótese é que tais aspectos das atividades passaram despercebidos para professora I por falhas na formação anterior, que não a instrumentalizou para tratar os estereótipos e preconceitos étnico-raciais e de gênero presentes em nossa sociedade. Assim, ela não tinha possibilidade de perceber as naturalizações e “pré-conceitos” embutidos nos textos que compõem tais músicas e atividades.

Cabe ressaltar aqui os encaminhamentos adotados pela a responsável pedagógica:

Conversei com a professora mostrando textos que discutem sobre as ações pedagógicas na educação infantil e as diferentes formas de excluir gerando com isso “preconceitos”. (ROP – 19/02/2010)

A situação relatada no ROP nos mostra o papel da formação continuada no cotidiano escolar, pois conforme dito acima a professora não age desta forma conscientemente; mas, sim, por falta de oportunidades anteriores que a instrumentalizasse para discutir tais questões.

Outras formas de exclusão foram observadas também com relação aos homossexuais. A primeira vista, tanto nos planejamentos do Parque Acalanto quanto do Cantinho do Saber, não foi possível identificar nos planos a presença de aparentes discriminações em relação à homossexualidade. Entretanto, o mesmo não pode ser dito da prática pedagógica cotidiana. Em particular, das práticas que dizem respeito à construção hegemônica e heteronormativa das identidades de gênero, tais como a separação por cores: azul para homens e rosa para mulheres. O menino que por ventura pegasse a placa de cor rosa era chamado por todos e todas do grupo, inclusive pela professora, de “mulherzinha”. E se a menina pegasse a azul nada era comentado. Percebe-se, portanto, que o aprendizado de gênero nestes casos reforça determinadas representações de masculinidade e de feminilidade e gera discriminação para com aqueles que apresentam um comportamento diferente do padrão heteronormativo de gênero. Outro exemplo, diz respeito às ações voltadas para os meninos que gostavam de brincar com meninas, estes eram rotulados, na maioria das vezes, de “florzinha”. Se chorasse então! “vira homem tá parecendo mariquinha”. No momento das brincadeiras dirigidas os meninos não podiam brincar com bonecas, pois era coisa de mulher.

Tais ações mostram que os/as professores/as estão reproduzindo as representações e naturalizações de gênero cultural e socialmente construídas.

Culturalmente em nossa sociedade meninas e meninos, sexo feminino e masculino, são educados para assumirem cada um o seu papel; desde pequenos meninas brincam de bonecas, de casinha, enquanto os meninos em suas brincadeiras vão a guerras, lutam brincam de bola e carrinhos com isso incentivando a construção de suas sexualidades. Onde os/as travestis, transexuais, intersex escapam da “normalidade”, “tendendo a serem considerados, como “desvio”, perturbação” e “transtorno”.

Todas estas práticas discriminatórias aparecem atravessadas pelas questões étnico-raciais e de classe.

“Dança neguinha”, fazendo “desenho da imagem de uma negra com vestimentas de cozinheira”, e “cantinhos de brinquedos para meninos e menina separadamente”. Brincar com bonecas era, definitivamente, coisa de mulher.

Sendo a escola uma instituição atravessada pelo gênero, onde também se constrói, transmite, e produz situações que podem tanto reduzir quanto produzir diferenças, isto é, nos professores/as podemos com nossas ações cotidianas estar fortalecendo tais diferenças.

Nessas instituições apesar da docência ser exercida, na sua quase totalidade, por mulheres, é possível verificar que predomina a cultura masculina, e sexista determinista. Essas profissionais, infelizmente, não conseguem perceber afirmações tão arraigadas em nossa sociedade, onde negro, gays, lésbicas, mulheres e índios são vistos como seres inferiores ou até mesmo ocultados, para não enredar ao contato com o outro.

Os/as professores/as trabalham dentro de suas concepções adultas de corpo e de gênero, sem levar em conta a percepção das crianças, “adultizando-as”, isso é ainda mais intrigante quando se junta ao preconceito e ao estereotipo étnico-racial e social.

2-CURRÍCULO ESCOLAR E AS QUESTÕES DE GÊNERO E SEXUALIDADE .

A escola, que deveria ser um local por excelência destinado a diminuir as diferenças sociais _pois convivem em seu seio a diversidade cultural, de gênero, religiosa e étnica, acaba por perpetuar a diferença por meio de práticas pedagógicas excludentes, sexistas, racistas e homofóbicas desenvolvidas por muitos/as educadores/as. Professores e professoras caminham na contramão da cidadania acentuando cada vez mais diferenças. Pois, conforme nos ensina Louro (2010) as práticas docentes podem contribuir tanto para a eliminação quanto para o aumento das desigualdades.

Tardif (2007) afirma que:

O professor ideal é alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência cotidiana com os alunos [...](TARDIF, 2007, p.39).

As questões de gênero, sexualidades e orientação sexual nos currículos das instituições observadas são invisíveis, em alguns momentos podemos perceber algumas abordagens sobre doenças sexualmente transmissíveis, mas sempre na perspectiva da confirmação da “heteronormatividade”, seguindo as orientações dos PCNs. Cabe ressaltar que nos Temas transversais do PCNs o livro intitulado Orientação Sexual é centrado na preocupação com a gravidez precoce e com as Doenças Sexualmente Transmissíveis, principalmente a AIDS. A sexualidade e o prazer aparecem, assim, vinculados à ideia da responsabilidade, da saúde pública e da moral sadia. Isto dificulta, na maioria das escolas brasileiras, um trabalho com as temáticas de gênero e sexualidade que rompa com os estereótipos e preconceitos. Como, por exemplo, um trabalho que voltado para a violência no ambiente escolar que considere a diversidade cultural e gênero, e a necessidade de refletir e analisar a realidade, buscando novos caminhos, novas possibilidades com metodologias que atendam a uma educação escolar voltada para a diversidade com um novo olhar para a sexualidade com isso respeitando o/a aluno/a em sua individualidade.

A questão acima, nas instituições observadas, esbarra no fato de que, infelizmente, a maioria dos professores e professoras, não foi preparada para desenvolver metodologias que levem os discentes a refletir e problematizar a respeito de identidade de gênero e sexualidade. Tais docentes, como a maioria dos docentes brasileiros, estão preocupados com os conteúdos formais que lhes são cobrados pela sociedade e organismos estatais aos quais a educação está vinculada.

Neste contexto geral, no qual as instituições escolares estão inseridas, a diversidade é vista, como uma disparidade; ou seja, como o contrário da uniformidade e da homogeneidade. Comportamentos como etnocentrismo, estereótipo, preconceito e discriminação, estão presentes no cotidiano, favorecendo com isso a desigualdade. As sociedades reagem diferentemente frente outras culturas. De acordo com Laraia (2001): "o modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma herança cultural” (p. 70). Ou seja, o resultado da operação de uma determinada cultura, reafirmando com isso as divergências no tocante a diversidade das culturas existentes.

3 - A DESIGUALDADE

As práticas discriminatórias no interior das escolas estão presentes em vários contextos, como exemplo uma situação ocorrida no planejamento mensal da unidade Parque acalanto, no dia 18/03/2011, na qual a orientadora pedagógica Y fez a seguinte declaração para um agente educativo: “você deveria procurar uma escola ou outro lugar pra você lotar, pois CMEI não é lugar para homens; e sua cor, poderia causar rejeição pelas crianças”. O rapaz que é consciente e luta pela igualdade de direito respondeu: “Sou concursado e quero ficar aqui, não existe nada que possa me impedir, pois estou garantido por leis tanto na Constituição Federal quanto no Estatuto do Servido Público Municipal”. Este rapaz ficou até o final do ano sofrendo retaliações e preconceito por parte do grupo diretivo, e da professora com quem fazia dupla. A professora inclusive ficou, sem conversar com o educador por semanas consecutivas induzindo as crianças a fazerem pré-julgamento sobre o rapaz. Não suportando mais as pressões se viu forçado a pedir remoção da instituição.

Este episódio mostra como o racismo está presente no nosso cotidiano e como as ações dos/as professores/as podem contribuir para aumentar a discriminação e o preconceito não só no seio das escolas, mas na sociedade como um todo.

Libâneo (1995) aponta que:

(...) tanto os que se dedicam à pesquisa quanto os envolvidos na atividade docente, enfrentam uma realidade educativa emersa em complexidades, crises, incertezas, pressões, sociais e econômicas, relativismo moral, dissoluções de crenças e utopias (LIBANEO, 1995, p. 16).

Penso ser uma das funções do professor, na escola, “medidor do conhecimento”, instigando na contribuição e transformação de cada um para a superação de obstáculos que ao longo dos tempos são objetivados, socialmente. E, assim, nos tornarmos uma nação forte e solidária, com um olhar para a realidade presente, já focalizando um futuro, infinitamente, melhor.

A política de ação afirmativa nos remete ao pensamento do dito popular “se não tem tu, vai tu mesmo”, pois a falta de políticas públicas que favoreçam a igualdade de condições e de direitos, vem acortinada com cota, ação afirmativa e outras asneiras para dizer que, negros, mulheres e pobres são incapazes de pintar de negro a aquarela do Brasil. Guimarães (2004) diz que “políticas como essas devem ser ancoradas em políticas de universalização e de melhoria da educação pública” (p. 172), penso que a educação escolar se universalizada dará, sim, condições de igualdade para todos.

Infelizmente, a mulher “brasileira”, “carapinha do Brasil”, são mulatas assanhadas que passam com graça que enchem os olhos com sua beleza; mas, que só o resto, do resto, é destinado para elas. São só “cama e mesa”: sexo e empregada doméstica submissa aos caprichos dos que pintaram sua pele.

É preciso mais reflexão sobre até que ponto os negros são ocultados em nossa sociedade, pois é tão normal, ou melhor, está tão impregnado em nós o preconceito e os estereótipos que nem se percebe que o negro, o homossexual, o portador de deficiência e a mulher são vistos com subordinação. E são essas visões estereotipadas que, miseravelmente, são repassadas nas escolas.

Somos educados com um apartheid acortinado. Sem perceber estamos segregando, apesar de tantos movimentos de luta para diminuir a segregação étnica. No entanto, a meu ver, a maioria continua a marginalizar e a banalizar, a grandeza e a beleza da cor negra do ser humano, principalmente da mulher, sem perceber que para a nossa cultura, bem como para a nossa produção de bens cultural e material foram essenciais; pois a força do trabalho por eles empregada fortaleceu a economia do país no período colonial.

Nós, educadoras e educadores enquanto formadores de opinião, temos que nos preparar para não contribuirmos cada vez mais com a segregação e a subordinação _não só do negro e mulheres mas também de todos que estão fora dos padrões da elite branca, aumentando com isso as desigualdades culturais e sociais.

Isso nos mostra “novas práticas educativas” mudando as ações sem mudar as posturas do/a educador/a, este/a continua fortemente arraigado/a na cultura determinista onde há dominantes e dominados, sem respeitar a diversidade cultural ali existente. A violência, no ambiente escolar em relação à adversidade cultural e gênero, faz com que seja percebida a necessidade de refletir e de analisar sobre tal realidade. Buscando, assim, novos caminhos, novas possibilidades com metodologias que atendam a uma educação escolar voltada para a diversidade com um novo olhar para a sexualidade; e com isso, respeitando o aluno com sua individualidade.

Reconhecer a diversidade, identidade de gênero, sexualidade, etnias nos vários universos culturais no seio da escola no âmbito de práticas docentes implica não só a conscientização acerca do peso dessas práticas no sucesso ou no fracasso do aluno, mas também na necessidade em se trabalhar no sentido de mobilizar, criar expectativas positivas, afim de promover a aprendizagem de todos, independentemente de raça, classe social, sexo ou padrões culturais.

Para trabalhar a proposta de conscientização da diversidade cultural é necessário que haja formação docente tendo em vista o saber desenvolvido pelo professor em seu cotidiano escolar. De forma que criem iniciativas para romper com a homogeneização cultural e combatendo com isso o preconceito, os estereótipos com relação àqueles cujos padrões culturais não correspondem aos dominantes.

Os estereótipos e preconceitos estão em todos os espaços sociais bem como nos espaços escolares, contudo o que mais preocupa é que são nas salas de aula que são mais acentuados, pois nada é feito para modificar essa realidade onde os “educadores” pensam ser normal apresentarem músicas como “ pula num pé só a velhinha banguela”, “neguinha de avental”.

O raio-X das práticas pedagógicas nas escolas nos mostra ainda que as situações de estranhamentos e violência vêm sendo tratadas de forma arbitrária, fazendo com que se acentue mais a violência.

Mesmo trabalhando com ciclos de formação onde deveria pensar no conhecimento de formação integral e integrada, e sendo o currículo aberto e flexivo, a maioria dos professores ainda percebe as disciplinas desconectadas uma das outras, digo mesmo sendo pedagoga. Mas, estando organizado para trabalhar com os conteúdos de ciências não sentem a necessidade de trabalhar a leitura e a interpretação do mesmo texto, e os espaços entre as outras disciplinas.

Pouco ou nada é feito pelos dirigentes, nem pelos professores para combater o preconceito e os estereótipos, pois não conseguem ver os seus próprios preconceitos: “É mais fácil romper uma molécula do que romper com um preconceito.” (Albert Einstein).

A inclusão escolar vem sendo uma prática muito contestada devido à falta de “conhecimento” do professor em trabalhar com as diferentes situações de aprendizagem percebidas nas escolas. Fazendo com que a inclusão seja mais uma forma de excluir.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através das observações ficou evidente a necessidade de estudos, novos saberes para a construção da equidade, rompendo com as barreiras do preconceito, do etnocentrismo e da visão estereotipada que cerca a Diversidade Cultural, Gênero, sexualidade e étnico-racial, por estarem permeadas de concepções e discussões sobre os saberes docentes e a formação de professores, a qual é conhecida por sua amplitude e complexidade. O conhecimento teórico-metodológico a cerca da Diversidade e do Gênero na escola por parte do professor, pode ser capaz de influenciar no cotidiano a prática reflexiva do professor, constituindo um novo olhar para formação da subjetividade do sujeito educando.

Reconhecer que a sociedade é multicultural significa compreender a diversidade étnica e cultural dos diferentes grupos sociais inseridas neste contexto. Entretanto, significa também constatar as desigualdades no acesso a bens econômicos e culturais por parte dos diferentes grupos, em que determinantes de classe social, raça, gênero e diversidade cultural possam se despontar através de suas atuações.

Desta forma, destacamos a responsabilidade de cada um de nós, em fazer desta sociedade um lugar onde as pessoas possam ter igualdade de direito, acesso à educação de qualidade e viver com dignidade. E é função da escola enquanto “medidora do conhecimento” instigar a contribuição e a transformação de cada um para a superação de obstáculos que ao longo do tempo temos enfrentado; principalmente, os “homossexuais” e as demais diversidades culturais, étnicos- raciais e de gênero.

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Lele de oliveira
Enviado por Lele de oliveira em 04/05/2015
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