Limites na Educação das crianças

A palavra “limite” tem sido utilizada com muita frequência, nos diálogos que envolvem crianças e jovens. É empregada de forma “queixosa”. É comum ouvirmos exclamações do tipo: “- Nossa! essas crianças não têm limites!”. Ou então, com um quê de autoritarismo: “- É preciso impor limites a essas crianças!”. Ou ainda, em tom de crítica: “-Esses pais não colocam limites nessas crianças!”. Enfim, tudo parece estar associado ao “limite”: a obediência, a disciplina, a questão da moral, o respeito aos outros, ao espaço físico e as regras. Nesse caso, a palavra “limite” tem um sentido metafórico. Mas, afinal, qual o verdadeiro sentido dessa palavra tão utilizada nos contextos escolares e familiares?

Pode-se dizer que “Limite”, é um convite para passar para o outro lado. É exatamente isso. O verdadeiro sentido, a explicação morfológica da palavra, remete-nos à idéia de fronteira, de linha que separa territórios ou ainda, um determinado espaço físico. É como se disséssemos: “Esse é o limite da minha casa”. Significa dizer que além dela, há algo que não é mais minha casa. O espaço não mais me pertence. Ultrapassá-lo, seria invadir o espaço do outro. Isso quer dizer que, atingido um determinado limite, há coisas que não posso e, não devo mais fazer. É muito comum quando crianças, ouvirmos dos adultos: “ -Você não tem mais idade para isso, ou ainda: “-Isso é coisa de criançinha!. É quando a criança percebe que há idade para realizar determinadas coisas. É quando a criança percebe que, a sua idade não mais permitirá fazer uma grande quantidade de coisas interessantes!.

Então, amadurecer, pode soar como algo que não é tão bom!. Concluí-se que o lado de lá do limite é negativo. Que com o passar do tempo certas ações não são mais permitidas.

Penso que para as crianças não deve ser tão fácil entender isso. É cobrado delas “coisas” que ainda não conhecem. E muitas vezes o tom não é nada agradável!. Simplesmente, “ “isso não é mais para você!”. “O que você está fazendo?”. Vem, o “Isso pode”. “Isso não pode e, pronto!”. E essa brusca ruptura ocorre exatamente por volta dos 6 a 7 anos. A criança precisa abandonar determinados brinquedos, o colo. Está na hora de ir à Escola. Chorar, nem pensar!. A professora que até então, permitia-se ser chamada de “tia”, agora é “professora tal”. Muitas vezes, nesse momento, na escola, cria-se uma “barreira” entre a “professora” e o “aluno”. Na Educação Infantil, ela tinha horários para brincadeiras e, algumas atitudes eram permitidas. Agora, não tem mais parque; correr, nem pensar... E ainda, alguns reforçam: “- Acabou a “moleza!”. Agora, você vai estudar de verdade!”. A maioria das aulas são expositivas . E o brincar?!. Nem pensar!. A criança é exposta em fileiras, uma carteira atrás da outra e, recebe muitas responsabilidades. Agora, ela será avaliada por “nota”.; Tem a “tal” da “prova”, dos pontos positivos e negativos. E, “o medo” se instala na criança. Concluo que a escola para ela deixa de ser um espaço agradável.

Logo, deixar de ser “criançinha”, parece não ser nada bom. Significa perder uma série de regalias, coisas boas, como: colo, afagos, brincadeiras. Em outras palavras, o que a criança mais escuta é “- agora, você precisa mostrar resultados!”. “Chega de brincadeiras”. “Hora de estudar é hora de estudar...”. E, essa forma de lidar com o novo, pode contribuir para que permaneçam infantis. Afinal, crescer pra quê?.

A passagem do 5o. para a 6o. ano, é uma das passagens mais difíceis da vida escolar da criança, comparado a entrada na adolescência.

A escola cobra da família: “seu filho não tem limites!”. E isso gera uma grande dúvida na cabeça dos pais. “Mas, que limite é esse?. “Onde errei?”. A palavra está sendo empregada dentro de um contexto que já não se sabe o seu significado. “Não ter limites é ser mal-educado?. É ser indisciplinado?!.

Acredito que seja também dessa forma que a criança sentirá a necessidade ou não de conhecer o outro lado; de ultrapassar os limites físicos e aceitar os restritivos. Talvez por isso, há tanta resistência às regras, as leis nos espaços compartilhados.

Nessa passagem, os adultos ficam investidos de muito poder sobre a criança, e imaginam controlar os seus desejos, aquilo que devem fazer. De certo modo passam a acreditar que podem determinar o futuro de seus filhos e alunos por meio do chamado "controle dos estímulos". Ocorrem aí decepções dos pais, dos educadores quando percebem que não têm o domínio sobre "o desejo" do outro, mesmo que esse outro seja seu filho(a).

A mobilização interna é desejo do próprio sujeito e, somente dessa forma o sujeito estará aberto ao novo. E, é nessa trajetória que ele se desenvolve, se humaniza, se reconhece, se mostra ao outro; mostra suas inscrições, aptidões, e, escolhas.

O quadro atual demonstra que os pais das gerações anteriores, agiram por pura incompetência no exercício de educar. E, os pais da geração atual, devido a preocupação de ter de estabelecer “limites” sem ser radical, nem permissivo, acaba também, agindo por pura incompetência, e, têm falhado..

Talvez, o caminho seja encontrar a "justa medida" de que trata Aristóteles, filósofo grego.

Outra crença que a modernidade alimenta é que a criança não pode ser frustrada senão ficará traumatizada. Então devemos satisfazê-las sempre. Esse engano tem traumatizado pais e professores.

A psicanálise postula que deve haver certa dose de insatisfação, de frustração para que o sujeito adquira uma boa estrutura psíquica -, para que a troca de uma coisa por outra ocorra de forma consistente e espontânea.

Sabe-se que a criação das gerações anteriores foram radicais demais; a seguinte, liberal demais. E, dessa forma, os pais da geração atual, buscam aprender; conhecer o que há sobre as questões do desenvolvimento infantil; as causas e as consequências de uma educação falha.

Hoje há discussões e um consenso entre escola e família de que deve haver a sujeição desse excesso de liberdade na educação dos pequenos. A família deve apresentar desde cedo os limites restritivos à criança para que ela entenda que no meio social compartilhado nem tudo é possível e, que certos comportamentos não são permitidos.

Na maioria das vezes a dificuldade só aparece na iniciação escolar por volta de 6 ou 7 anos. Quando a criança começa a mostrar no meio social as suas “inscrições”, ou seja, a forma como ela se estruturou, - o que a família fez dela.

É preciso saber que as operações mentais não se constroem do nada, se movimenta dentro do que pode e do que não se pode fazer. A criança se apropria da informação, do espaço que lhe foi dado, e a inteligência vai se classificando, organizando as informações e, fazendo as acomodações, conforme Piaget. Neste sentido, a criança se apropria dos objetos, das informações e, os transformam; constrói suas ideias, o conhecimento se estrutura.

É certo que são os pais que devem estabelecer os limites restritivos; mostrar os percalços. Esses limites são um dos pilares para uma boa educação, pois fornecem aquele sentimento de segurança física; aquilo que a criança necessita para aprender as grandes lições de autocontrole e de comportamento ético.

Quanto se trata de “Limites”, muitas vezes a dúvida permeia a cabeça dos pais em relação ao que fazer e como lidar com os comportamentos indesejados apresentados pela criança na escola. Não ter limites é o mesmo que ser indisciplinado?

Disciplina é outra palavra muito utilizada nos contextos escolares e familiares. Empregada também com frequência, em geral de forma queixosa. Então, cabe aqui defini-la. Em sua origem, a palavra disciplina tem a ver com discípulo. Discípulo é uma pessoa que tem alguém como modelo e, se entrega pelo valor que atribui a essa pessoa. Esse é outro tema bastante difundido nas discussões que envolvem crianças e jovens, também usado de forma indiscriminada. Para o especialista em Disciplina, Lino de Macedo (2005), “Disciplina não é questão de boa ou má conduta". Disciplina se aprende, é uma competência escolar que as crianças aprendem como qualquer conteúdo. É uma disciplina interdisciplinar, porque dela dependem de todas as outras”. Lino acredita que “o maior erro da escola é pensar que existe um único tipo de disciplina e que ela só pode ser imposta”. Para Macedo, é possível ensinar disciplina e, pode-se conquistar o aluno para um projeto de disciplina conseguindo por exemplo, a admiração dele. E por outro lado, afirma que “muita disciplina, controle obsessivo, e ordem podem prejudicar a criatividade das crianças”. E ainda, que “convencer é diferente de impor”. De fato, as pessoas costumam ouvir mais e respeitar as pessoas a quem admiram. Então, o caminho é encantar, conquistar as crianças, ganhar a admiração delas!

Quanto à questão da “indisciplina” e do “limite’, sua falta e necessidade, os adultos também carecem delas!. Fala-se muito que as crianças de hoje não têm limites. Mas, os adultos, também não têm. Em uma sociedade capitalista como a nossa, da competitividade, não se tem horários regulares para nada, nem mesmo para as refeições. Logo, os adultos não têm uma rotina regular para organizar a sua vida e nem mesmo a vida de seus filhos. É justificável essa “indisciplina” por parte dos adultos, pois é entendido os motivos dessa irregularidade. Mesmo assim, devemos cobrar e, esperar um comportamento regular por parte das crianças.

É certo de que o adulto precisa estabelecer as regras e os limites e, mostrar o que quer que a criança. E, isso só ocorre por meio dos bons exemplos. Afinal, a criança em formação, segue modelos e, estando em formação, precisa da experiência do adulto para se organizar no meio social.

Sabe-se que é a própria relação entre as pessoas que promove o crescimento e, é por isso que considerando a visão interacionista, acredito que “... O ato de educar é também essencialmente relacional e não individual.”; que a troca de experiência, ideias, pensamentos enriquecem a relação quer seja entre pais x filhos ou professor x aluno. E que, assim como as crianças, os adultos precisam ser argumentativos o suficiente para conseguir delas uma disciplina voluntária, por exemplo.

Vejo que muitas vezes pais e professores “impõem” o que quer que a criança faça, sem justificar, sem convencer de que aquilo é melhor, sem responder aos por quês. Isso sim é traumático e torna qualquer relação desgastada. É certo que algumas crianças atendem e, fazem sem argumentar e outras, veem carregadas de “por quês? Há as que são mais argumentativas e, fazem mais barulho do que outras. E esse "barulho" simplesmente, incomoda -, não é observado, investigado pelos responsáveis por ela. Perde-se a oportunidade de aproveitar o argumento para tornar a regra consistente para todos. Muitos desgastes e contratempos poderiam ser evitados nas relações escolares e familiares se o diálogo fosse praticado com mais frequência.

Por isso, os adultos precisam ser tão argumentativos quanto às crianças para garantir a transmissão de valores, respeito mútuo e, os limites restritivos tão cobrados nos dias de hoje. Leia mais...

Limites: Como lidar com os pequenos?. Maria Teixeira.—1ª. Ed. São Paulo: Edição do Autor, 2014.

https://clubedeautores.com.br/book/170717--Limites

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MariaTeixeira
Enviado por MariaTeixeira em 10/11/2014
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