“Me caiu os butiás do bolso...”
Que vergonha! Vontade de rasgar o diploma! Não. Se eu fizer isso, assino meu atestado de incompetência e não é isso que quero passar. Agora sim. Vontade de mudar de país para ver minha profissão valorizada e exercida por representantes que a dominem, e não a chafurdem na lama do paternalismo e da insuficiência que denotam o estado da Educação Brasileira.
Assisti à reportagem do Fantástico, da Rede Globo, que comentava os erros crassos em redações, cometidos por falsos candidatos ao Exame Nacional do Ensino Médio, no ano passado. Vergonha nacional. Renomados professores e até representante do INEP – de onde sai o Enem e as “novidades” para a educação – consideraram válidas redações com absurdos, como Getúlio Vargas ter morrido em um acidente de carro, a lei seca ser criação do AI-5, na Ditadura, e o automóvel ser da época da Idade Média. Além disso, redações com apenas 5 linhas (somente 5 linhas) de autoria e o restante preenchido por cópia dos textos motivadores ou da prova objetiva, sem nada a ver com o tema, avaliadas com 400 pontos! Detalhe, as normas para a elaboração da redação do Enem são claras, “trechos copiados são desconsiderados e o restante, para ser avaliado, precisa ter no mínimo 7 linhas de texto.” E agora?
Como professora de Língua Portuguesa, procuro, a todo custo, fazer meus alunos lerem e escreverem, produzirem textos coerentes, com informações pertinentes e verdadeiras. Já participei de bancas de correção de redações de vestibular, bem exigentes, diga-se de passagem, onde redações como as citadas receberiam nota “-1”, se isso fosse possível. Assistir a essa reportagem e ouvir opiniões de meus representantes nas Letras e no Ministério da Educação me causou extrema indignação: e o meu trabalho, onde fica? O que vou falar a meus alunos, quando me arguirem sobre meus critérios de correção de redação? Certamente ouvirei: “Professora, por que cobrar tanto, se qualquer bobagem no Enem dá nota?” ou “ler pra quê, se até cópia de texto ganha nota no Enem?” Alguém me ajuda a argumentar?
Observem-se nossos números em Educação. Atente-se para regras desobedecidas e ignoradas em provas. Indague-se sobre a importância da escola no País da Copa. Opa, País da Copa é assunto “imexível” nesse momento, pelo menos até os jogos serem realizados, não é? “Somos todos um só”; “Somos todos macacos” e acrescento “Somos todos analfabetos funcionais...” Que triste, é tanta decepção que me vejo como uma extraterrestre querendo ensinar o que não precisa ser ensinado, porque não é valorizado: escrever bem? Saber ler bem? Pra quê? Pra quem? Perdoem-me, mas não posso fugir do ditado gaúcho que mais me identifica no momento: “Me caiu os butiás do bolso”, que quer dizer “estou de boca-aberta”, “estou espantada”. Barbaridade, vai faltar butiá para tanto bolso furado por aí...