COMO LIDAR COM PESSOAS IDOSAS

Ninguém quer envelhecer. Mas, só não envelheceremos se a morte nos alcançar antes. Como ninguém deseja morrer, por uma lei natural, os que não morrerem antes, envelhecerão. Por outro lado, muito pouco aprendemos como lidar com o processo de envelhecimento (nosso e dos outros), especialmente daqueles que vivem em nossa companhia. A sobrevivência da raça humana só foi possível por que há nas fêmeas "componentes e determinantes biológicos" que as tornam mães e defensoras

dos filhotes até a morte, se for o caso. Este instinto de proteção à prole parece ser também natural entre todos animais. Todos parecem ter um cuidado especial com as crias e cuidam delas até que sejam autossuficientes. Mas o que acontece quando os indivíduos envelhecem? Quem cuida deles? Os filhos? Ou será que em geral eles acabam sendo isolados do grupo e morrem solitários? A verdade é que os animais não dispõem de uma estrutura intelectual capaz de enfrentar os problemas de modo adequado. Não podem criar um plano de saúde, nem um asilo para os familiares idosos, nem dispõem de um governo que ofereça condições satisfatórias. Então, não há outra alternativa senão deixar que cada companheiro idoso cumpra sua sina. Não há meios de tratar um companheiro doente.

Os animais não dispõem de medicina. Nascem, crescem, se reproduzem e morrem. A natureza parece não se preocupar muito com esse ciclo e deixa que os seres resolvam como puderem. Os mais fracos morrem e são abandonados pelo grupo. O grupo é que tem de sobreviver. Não existem famílias entre os animais diferentes dos humanos. Existem grupos e eles ditam as regras. O que for bom para o grupo será bom para todos. É desta forma que as espécies garantem a sua perpetuação. E quanto aos humanos? Como agem? O que fazemos com os mais velhos, os que se tornaram incapazes de prover o próprio sustento ou que adoecem? No passado, mesmo nos países mais avançados, os idosos eram segregados e levados para os famosos asilos de idosos. Lá, aqueles que podiam pagar por uma atenção e cuidados envelheciam com dignidade. Mas eram raros. Mesmo os que podiam pagar mas era abandonados pelos familiares (filhos e netos) morriam à míngua uma vez que os tratadores apenas davam o mínimo de apoio ou conforto. Com o passar do tempo essas casas de idosos passaram a sofrer fiscalização dos poderes públicos que tomaram o lugar dos familiares. Por outro lado, os idosos que eram frequentemente visitados e supervisionados pelos familiares recebiam melhores cuidados e morriam com um certo conforto.

A civilização humana precisou criar mecanismos de proteção aos idosos. No Brasil, criou-se o Código do Idoso e leis que dão privilégios aos que já passaram dos 60 anos. Finalmente a sociedade reconhece que é necessário amparar aqueles que já deram suas energias, suas vidas e serviços aos mais jovens. Os planos de saúde particulares beneficiam aos que podem pagar uma boa quantia mensal para ter assistência médica e hospitalar. Mas e quanto aos cuidados diários? Que vai preparar comida, dar banho, pentear o cabelo, levar para tomar sol, cortar as unhas e assistir em outras atividades quando os idosos já não conseguirem mais a autonomia desejada? Os agentes do governo? Os assistentes sociais e de saúde do idoso? Não no Brasil. Talvez na Austrália, Suíça ou Canadá. No Brasil existem poucas opções para os idosos. Se tiverem dinheiro podem pagar para viver em um lar de idosos com conforto e pronto-atendimento. Quando não têm muito dinheiro, mas algum que possa cobrir as despesas de uma pessoa para assistir ao idoso, essa é outra opção. As demais, são mais complicadas e são a maioria dos casos. Para a maioria das famílias com idosos resta a alternativa de mantê-los em casa, alternando cuidados, dando alguma atenção e administrando os conflitos. A última opção é o abandono à própria sorte. Nem sempre por falta de amor ou atenção, mas por contingências das vida, pela falta de condições adequadas. Cuidar de idosos requer mais que paciência, carinho e atenção, requer tempo e algum dinheiro. Quando algumas famílias dispõem de carinho e amor aos idosos, mas não dispõem de tempo pois estão envolvidos em suas vidas atribuladas, o problema se torna grave.

Em todos os casos, mas especialmente naqueles em que os idosos precisam de amparo na casa dos filhos ou netos (ou demais familiares) é fundamental que as pessoas da casa aprendam a lidar com os principais problemas do ancião com quem compartilharão o banheiro, a cozinha, a sala, a TV e demais espaços da casa. Um idoso não é uma criança, é mais difícil se lidar com ela, quando não se tem experiência. Mesmo quando se tem, é necessário desenvolver atitudes especiais que envolvem: capacidade de escutar, bom humor, respeito às limitações do idoso, compreensão, extrema paciência e sobretudo muito amor. Sem esses elementos será quase insuportável cuidar de uma pessoa idosa no ambiente familiar. Idosos ouvem mal, entendem o que não foi dito e não entendem o que parece ser claro para todos, interpretam com dificuldade as coisas, têm dificuldades para aceitar as mudanças, sentem medo do desamparo, tornam-se defensivos, sentem medo de coisas improváveis, se sentem culpados por serem um peso para os familiares e para completar o quadro podem se tornar deprimidos, confusos, teimosos e resistentes a tudo e todos.

Um luxo das crianças que se repete na terceira idade. Assim, cabe aqueles que estão com a responsabilidade de cuidar de idosos, temporária ou permanentemente, se capacitarem por meio de leitura, treinamento, busca de orientação psicológica ou gerontológica e mesmo no autoaperfeiçoamento contínuo das práticas mais eficazes para lidar com pessoas em idade avançada. Longe de ser uma tarefa fácil, se parece com a atividade laboriosa de cuidar de bebês. Mas a visão agora é diferenciada pois aqueles vão crescer e se tornarem autônomos. Estes, já não terão mais essa chance. Caminharão inexoravelmente para a incapacidade cada vez maior até que chegue o dia final de sua partida. É triste, é doloroso, mas é a realidade do que somos: humanos dependentes até o fim da nossa existência, quer queiramos quer não. A filosofia, a religião, a política e a ciência são insuficientes por si sós para lidar com o problema do envelhecimento. Se vamos envelhecer então será bom se pudermos tomar medidas antecipadas para minorar o nosso sofrimento e daqueles que cuidarão de nós. Não vale cobrar amor e cuidado de alguém que não tem tempo ou não está apto para doá-lo. Bom seria se todos os que fossem cuidado pudesse naturalmente cuidar de quem os cuidou, protegeu e amparou quando crianças e jovens. Mas nem sempre será assim. Hodie mihi, cras tibi. Hoje por mim amanhã por ti. Era a máxima latina, hoje mais válida do que nunca.

(*) Mathias Gonzalez é psicólogo e escritor.

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