PROFESSOR: SER OU NÃO SER?

No momento, há um fervilhar de ideias e propostas para reorganizar a desorganizada sociedade brasileira. Entre estas ideias e propostas encontramos sugestões democráticas, e outras com sinais ditatoriais. Propor plebiscitos, sob pressão; modificar currículos universitários, sem consulta às academias e aos conselhos profissionais; aumentar as esmolas para o povo, sem enfrentar as verdadeiras causas da dependência econômica da maioria; impor Enens e Enades, elaborados de forma centralizada em Brasília, a todos os estudantes (já em tempos antigos se dizia que “toda a centralização é burra”); atribuir as causas do analfabetismo, da violência e da corrupção a causas equivocadas... não passam de falácias ditatoriais.

Para encobrir a péssima administração da saúde no país, ameaça-se importar médicos estrangeiros. O problema da saúde no Brasil, e a falta de médicos nas periferias e no interior, não é, em primeiro lugar, a falta de médicos, e sim a falta de condições de trabalho e os péssimos salários pagos aos profissionais da saúde. Nem se consegue tapar o sol com peneiras, nem esconder a escuridão com elas.

Tenho a impressão que, daqui a pouco, se fará mais uma proposta ditatorial falaciosa: superar a péssima qualidade da educação no país com a importação de professores!

Em muitos casos, as universidades não conseguem preencher as vagas para os cursos de licenciatura. Por quê? Porque a profissão de professor não é uma profissão digna e atraente? Não. Mas sim, porque os professores são desprestigiados, porque o salário de professor é aviltante: um teto salarial inferior às condições mínimas de uma sobrevivência digna; contratos temporários; escolas sem infraestrutura...

Mesmo desejando ser professor, qual o cidadão que se sente incentivado a fazer uma longa licenciatura para, depois, não conseguir um trabalho que lhe possibilite o sustento digno de sua família?

Todos os anos, no decorrer do calendário escolar, noticiam-se as lutas dos professores intranquilos e justamente insatisfeitos. As pautas de luta, em geral, são: por melhores salários, por melhores condições de trabalho, pela reforma de prédios escolares e salas de aula, por contratação de mais docentes, por administrações mais democráticas.

Mesmo com tais manifestações e greves, o tempo transcorre sem a sensibilização dos políticos, e parcelas da população, para com as exigências de um ensino de qualidade para o nosso tempo, e o nosso país. Entretanto, exige-se muito dos professores, pois sabe-se a importância destes mestres para a vida de cada cidadão.

O professor interage diretamente com as novas gerações. Isto faz com que a profissão professor adquira um significado especial em relação a todas as outras profissões.

Com seus ensinamentos e incentivos aos alunos, os professores preveem, previnem e formam o mundo em construção. O que, em parte, os torna responsáveis pelos bens e pelos males de nossa sociedade. Apesar disto, muitas vezes, se agitam buscando apenas sobreviver, maltratados e desrespeitados.

Exige-se dos professores que vivam ancorados no passado, transmitindo os conhecimentos da humanidade; mergulhados no presente, atualizados em relação aos conhecimentos de nosso tempo; profetizando o futuro, pois as gerações que educam conduzirão a sociedade que vem. A verdade é que muitos pais, e muitos jovens, não têm consciência da importância dos professores, e do esforço que deles se exige.

O professor de hoje sabe que deve ter um pé nos conhecimentos do passado, mas também sabe que a humanidade atual está vivendo num mundo novo, muito diferente do mundo das gerações anteriores. E isto exige do professor que ele não seja apenas um repetidor. Exige-se dele atualização permanente, curiosidade redobrada, leituras e pesquisas.

Em todas as áreas da vida há novidades, que os professores não podem ignorar. A medicina de hoje é capaz de transformar nossos corpos, de prolongar nossas vidas, de programar os nascimentos. Tudo mudou: as relações humanas, a sexualidade, o casamento, a família, a relação entre pais e filhos, a compreensão do bem comum, o cuidado com o meio ambiente. O mundo mudou e com ele as crianças e os jovens. E nas salas de aula encontram-se estas crianças e estes jovens transformados.

Nesta nova realidade, as religiões se ressentem, a justiça se ressente, a política se ressente, a economia se ressente, e a cultura se ressente. E, especialmente, o ensino se ressente diante desta geração envolta pela realidade dum novo mundo.

Triste é quando o ensino se deixa dominar pela economia, e se transforma num negócio.

Neste mundo novo, a profissão professor exige heroísmo. O professor, em seu dia a dia, deve ser capaz de transmitir conhecimentos, de incentivar a busca de saber, mas também de destruir saberes ultrapassados ou adulterados. O que ainda é válido em nossa língua, em nossa cultura, em nossa moral, em nossa religião, em nosso cuidado com o corpo?

Em tempo real, o professor ensina coisas do passado, mas com constante visão ao futuro. Para conseguir isto, todo professor deve ser filósofo, amante da sabedoria, pois é extremamente difícil os adultos de hoje interagirem adequadamente com as gerações portadoras de futuro.

Neste contexto, os professores, com justiça, esperam que a sociedade lhes dê as condições para cumprirem as obrigações de sua profissão.

Inácio Strieder é professor de filosofia – Recife/PE