A demissão da responsabilidade de educar

Maria José Rocha Lima

Ser pai e mãe de verdade não é só ter um filho, não. Isso poderia ser denominado acidente biológico, como ocorre com os demais animais. Transformar este acontecimento em algo significativo exige consciência, compromisso, responsabilidade e amor.

O bebê humano exige cuidados espirituais para se tornar gente. Botar um bebê no mundo é muito diferente de manipular um boneco. Isso envolve, além de muitos cuidados, dar exemplos, conselhos, impor limites e sobretudo estabelecer uma relação , uma conexão real com o seu filho ou filha.

Precisamos alertar os pais sobre as consequências dos filhos órfãos de pais vivos. Ou das crianças e adolescentes à deriva. Eles estão por toda parte e as consequências são trágicas: violência infantil e adolescente; obesidade epidêmica; toxicomania e alcoolismo em idades cada vez mais baixas, notáveis índices de ignorância de crianças e adolescentes contraditoriamente ao relevante volume de informações disponíveis. São crianças e adolescentes que não realizam simples operações aritméticas, que mal saíram das fraldas e já tomam decisões na família como a hora de desligar o aparelho de televisão; a hora de entrar e sair de casa; as compras de supermercado; estabelecem roteiros de passeios ou viagens, invertendo radicalmente as relações de poder e parentesco entre pais e filhos. É a carroça passando à frente dos bois.

Passar o equipamento cultural é transmitir valores e conduzir a vida dos nossos filhos. O ensaísta argentino Guillermo Etcheverry, em um lúcido artigo intitulado “Pasar el equipaje”, recordava a interrogação de Platão sobre a educação das novas gerações. No livro A República, o filósofo perguntava: “Vamos permitir, então, que as crianças ouçam qualquer história, forjada pelo primeiro que se aproxime delas e que dê lugar em seu espírito a ideias geralmente opostas às que acreditamos ser necessário que lhes tenham sido inculcadas quando chegarem a ser adultas?”