Releitura da carta zero de Gervásio no livro “Cartas ao meu umbigo”: dificuldades de William Borges da Silva na universidade em seu ano de calouro.
Adianto que não sou o melhor escritor do mundo e tampouco redijo mal a ponto de me humilhar. Ademais, além de escritor amador, sou uma pessoa comum e incomum, necessitada de transcrever meus dilemas universitários nessas páginas em branco. Antes de irmos ao ponto, uma questão para reflexão dos vestibulandos (as):
“Sabemos da alegria da aprovação em uma universidade pública depois de tantas horas de sono perdidas”. Mas será que estaremos, em todos os sentidos, preparados para o que virá após a “glória da aprovação”?
Após um ano de UNICAMP, esta mesma pergunta que dirigi a vocês continua a me incomodar e se subdividir em várias outras questões, tais como: Psicologicamente, como receberei todas essas coisas novas? Estou preparado para estudar? Psicologicamente, como receberei todas essas coisas novas? Estou preparado para as provas? Enervo-me durante uma avaliação? Será que estarei pronto para as idas e vindas, para os ônibus lotados e deixar coisas triviais para trás? Sei gerir meu dinheiro?
Conseguiram-se respostas? Ora, as respostas variam com o dia e com a situação – As dificuldades são muitas e pelo relato de vida na universidade, terás a percepção multiforme de afirmações para essa pergunta cortante. Nas complicações, das alegrias e das tristezas que a vida nos reserva, nas vezes que me perdi em meio a tantas salas e institutos na Unicamp, entender-se-á que nem tudo na universidade são meras festas, diversões e amizades inesquecíveis, novato...
Psicologicamente, como receberei todas essas coisas novas?
Confesso que não recebi com pompa a notícia que havia sido aprovado na Unicamp. Na verdade fui avisado por uma amiga que tinha passado. Meus pais, no entanto ficaram emocionados, orgulhosos, chorando e se alegrando com o feito, ao passo que eu mergulhava na incerteza de um curso novo, difícil, concorrido, de uma vida nova.
Os primeiros dias de aula foram confusos. Não sabia onde estava. Precisei de uma pessoa – uma amiga que atualmente é como se fosse uma irmã para mim – para me ajudar a situar-me pela universidade. Não conhecia ninguém do meu curso e tinha medo de conhecer, visto que o clima na aula magna, a meu ver, era o pior possível devido a forte concorrência que teríamos pela frente na luta por vagas nos cursos de graduação. Desenvolvi então, semanas após, uma crise depressiva que atrapalhou mais ainda minha adaptação ao novo lar. Se no começo estava desse jeito, imagina quando o curso começar pra valer mesmo, caros leitores. Iria chorar só de pensar na palavra “Aula”. Ou até mesmo “prova”, “estudar”, “pessoas”, “concorrência”, “amigos”, etc.
P.S: quanto às emoções, fiquem sabendo que fui curado da terceira crise. Se estivesse ainda com ela, duvido muito que estaria aqui escrevendo para vocês lerem...
Estou preparado para estudar? Afinal de contas, o que era estudar?
Quando ouvi falar no curso PROFIS pela primeira vez, vi que se tratava de um curso novo e puxado, infinitamente melhor que o ensino que qualquer escola pública desta cidade. Vislumbrei também com o passar das aulas que estudar na véspera de uma prova só com as anotações do caderno e por um tempo consideravelmente baixo faria com que eu obtivesse êxito. Êxito esse que era não tirar notas vermelhas, tirar cinco – essa nota era um dez para mim! – e consequentemente, ser aprovado e me livrar dos professores. Todavia, com a multidisciplinaridade do curso, a complexidade do conteúdo transmitido e a concorrência por posições no CR (coeficiente de rendimento), além do cansaço das viagens de ônibus, somados ao ritmo frenético dos docentes nas aulas, percebi que estava redondamente enganado. Quando eu poderia imaginar que teria de fazer mais de onze listas de exercícios, ao passo que escrevia textos acadêmicos, elaborava um relatório para as aulas práticas semanais de química e lia textos literários? Quem diria que eu teria que procurar livros na universidade se eu quisesse realmente aprender? Organizar-me? Sequer imaginava esta palavra em meu vocabulário...
Tal situação e estas questões cortantes arrancaram lágrimas de meus olhos, aumentou meu cansaço e impulsionou a ira. Fez-me enervar-se contra individuos que não eram culpados pela situação que me encontrava. Levei broncas. Padeci. Apanhei da mãe sem vida: apanhei da universidade, do mundo.
Claro que não aceitei as horrendas dificuldades para estudar e procurei ajuda. Certa vez, alguém que não me lembro do nome disse que as anotações levantadas pelo aluno com base na aula dada pelo professor não eram suficientes para que o conhecimento fosse aproveitado da maneira correta e orientou que os estudantes usassem e abusassem dos livros acadêmicos espalhados pelas mais de 30 bibliotecas espalhadas pela Unicamp. Tinha que ler. Por a mão na massa. Ser independente de simplórias anotações feitas e não estudadas. Incrementar. Facilitar. Focar.
A principio o foco não existiu. Sempre tive fama de desorganizado devido a minha displicência no objetivo desejado, desviando-se sempre para a direita (leituras de outras coisas) e para a esquerda (a vontade de não fazer nada, a má vontade, o lazer que vinha antes do dever), nunca subindo os degraus. O resultado disso tudo foram notas medianas, algumas notas vermelhas, exames (foram dois ao todo, isso no segundo semestre) e uma colocação baixa na classificação dos CR’s. Não fosse todos estes fatores negativos – e eu como um todo – estaria em situação melhor do que esta (40º colocação). Estarrecedor. Ou eu estudava de fato – punha a mão na massa e nos livros, anotando, questionando, criticando – ou seria apenas mais um que não terminaria o curso em dois anos. Tinha que escolher. Amar a Unicamp ou deixa-la, odiando-a mais ainda. E escolhi amar...
Estarei eu nervoso para as provas?
As provas da Unicamp trazem a mente, querendo ou não, o vestibular. O fiz uma vez em dois mil e onze antes de escolher o PROFIS e não carrego boas lembranças. Primeiramente porque não passei, segundo porque não me preparei o suficiente – alias, sequer estudei – para o vestibular – diga-se de passagem, fui um tolo. Ora, sendo assim, qualquer prova que fosse da Unicamp traria a mente essa lembrança horrenda, traumática e que no fim, não traria benefícios a minha pessoa. É claro que houve exceções, afinal de contas pertenço à área das ciências humanas e me sai muito bem nas matérias relacionadas a ela.
Sempre tive dificuldade para trabalhar com números. Enrolo-me mais do que Bicho-preguiça em seu galho, sabe-se lá o motivo. Creio que terei dificuldades nas matérias que terão números exatamente por isso: sou desorganizado. Percebeu como se liga o fato d’eu não saber estudar devidamente com a árdua tarefa de servir a frieza dos números? Dói ter que confessar isso, mas preciso de ajuda. E urgente.
Resistirei às viagens e ao cansaço? E ao almoço no R.U.?
Desde pequeno minha família caracterizava-me como uma pessoa vagarosa, lenta e às vezes estourada. Ainda bem que a parte do “estourado” usurpou-se de minha personalidade. Contudo permaneço respirando e absorvendo o cansaço. Seja na escola, em casa, nunca fui uma pessoa proativa e sempre amei fazer as pazes com Morfeu* por longas e longas horas quando depois da rotina diária. Ao adentrar na faculdade, todavia, percebi que a labuta se tornaria ainda maior pelo fato d’eu pegar ônibus cedo, trafegar sempre de pé na maior parte dos dias, na ida e volta (raros são os momentos que consigo um trono para sentar “confortavelmente”). Como se não bastasse acordar cedo para ir à escola, ainda teria que conviver com ônibus lotados, lentos, atrasados e mal cuidados, sem contar o mau cheiro, os cigarros que fumava passivamente e outras coisas mais. Como resultado de tudo isso, chegava à faculdade acabado – isso porque as aulas não haviam começado! -, aspirando ao cansaço e o mau humor, similar ao daqueles que fazem aquele trabalho pesado, cansativo e entediante – me referindo aos que fica oito horas a frente de um computador fazendo sempre mais do mesmo. Quando chegava a minha casa, a vontade de estudar havia ficado presa nas barras amarelas do ônibus ou senão nas escadas do mesmo. Pensava nas provas, no amanhã, nos professores, nas listas, na vontade de estudar e na pequeníssima força para executar todas essas tarefas ao mesmo tempo. Sempre chegava tarde, a noite e, penso eu, a noite foi feita para assistirmos televisão ou perdemos tempo com coisas fúteis, lermos um bom livro, ouvirmos uma boa conversa de nossos pais, comermos. Nunca imaginei ter que alterar toda essa rotina devido aos livros e a rotina penosa da universidade. Tive que aprender a vencer o cansaço, os olhos pesados de sono e a tristeza de saber demais sobre muito pouco. Como diz o livro, “A ti muito foi dado, de ti, mais ainda será cobrado”**
A respeito da comida, nunca fui de reclamar muito. Sempre vivi com o lema de que é melhor comer qualquer coisa do que morrer de fome. Claro que temos aquela vontade de comermos algo diferente de vez em quando, contudo isso é raro e caro ao mesmo tempo. Talvez por esse motivo tenhamos que louvar aos céus por termos uma avó ou uma mãe que saibam cozinhar para nós, filhos ingratos. Alimento este que contém sabor, odor agradável e é preparado com amor. No entanto, infelizmente tive que me desvincular dos laços fraternais (e maternais!) culinários e me ajuntei a centenas de alunos e amigos no tal Restaurante Universitário. No começo o meu estomago não se adaptou a comida do local, mas depois de algumas semanas não encontrei resistência para me alimentar na Unicamp. Alguns dizem que tem salitre, outros que a comida não tem gosto algum, enfim. São várias as opiniões. Ao menos neste aspecto não tenho indagações, questionamentos nem nada. Como muito. Amo comer. Como de tudo e em qualquer lugar. Não sou dado a detalhes quanto a isso, tanto que meu lema para a culinária é: “Barriga cheia, coração contente”.***. Não é a toa. Como ficamos contentes ao saborear do alimento que irá revestir os poucos neurônios que nos restam!
Conclusão
Como vocês puderam perceber a vida universitária não é fácil. Hoje em dia circula o lema que “é fácil demais entrar na Unicamp, difícil mesmo é sair!”. Concordo em partes com o tal excerto, visto que você pode superar o seu Eu cansado caso você proceda da melhor forma possível. É isso que tenho buscado e continuarei a perseguir em minha vida acadêmica. Não pensem que tudo é festa – isso porque sequer vou a elas. Se quiserem ir, vão. Mas não se esqueçam de uma coisa: Se bobear, “A Unicamp pune”. ****.